Título: À espera do Supremo
Autor: Doca, Geralda; Brígido, Carolina; Corrêa, Marcello
Fonte: O Globo, 16/03/2013, Economia, p. 29

Um dia após a promulgação da lei que mudou a distribuição dos royalties do petróleo, os governos de Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo, além da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), entraram com ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra as novas regras, que prejudicam os estados produtores e afetam contratos em andamento e áreas já licitadas. Os autores pedem a concessão de liminar para a suspensão imediata da aplicação da nova legislação até o julgamento do mérito das ações. A ministra Cármem Lucia foi escolhida, por sorteio, relatora dos quatro processos.

Nas ações, os autores alegam que a nova lei fere a Constituição, que assegurou aos estados produtores uma compensação pelos problemas decorrentes da exploração do petróleo. Alegam, ainda, ofensa ao pacto federativo, ao princípio de que as leis não podem retroagir para prejudicar entes e à isonomia entre estes, diante das perdas para estados e municípios produtores.

O ministro do STF Luiz Fux afirmou que as Adins podem ser julgadas em conjunto. Fux disse que, caso o Supremo entenda que a nova lei é um perigo para o pacto federativo, pode agilizar o processo. Ele admitiu que, em tese, é possível que uma liminar seja concedida em até 24 horas, como já ocorreu outras vezes. Mas evitou precisar prazos para uma possível decisão de urgência.

- Nesse caso específico, se nós verificarmos que é um problema que gera um abalo institucional muito grande no pacto federativo, é dever de ofício do ministro tomar as providências. Onde há perigo, o juiz tem que agir imediatamente - disse Fux.

O governador do Rio, Sérgio Cabral, alega, na ação elaborada pelo procurador Luís Roberto Barroso, que o estado terá prejuízo imediato de R$ 1,6 bilhão com a nova divisão dos royalties, podendo chegar a R$ 27 bilhões em 2020, comprometendo obras de Copa e Olimpíadas. Outra alegação é que a lei fere o acordo entre os entes da federação, firmado na Constituição de 1988, que prevê a cobrança de ICMS do petróleo no destino.

- Com isso, os estados produtores abriam mão dessa receita tributária em troca dos royalties. O ICMS cobrado no destino é uma forma de garantir aos estados não produtores uma situação mais favorável - disse Barroso.

O Rio alega ainda que o contrato de refinanciamento de sua dívida com a União prevê o uso de royalties para o pagamento. E, agora, não terá condições de cumprir o contrato.

O impacto para os municípios será "dramático", diz Cabral na ação: das 92 cidades do estado, 87 recebem recursos dos royalties. A perda em 2013 seria de R$ 2,470 bilhões (49% da receita prevista) e, para o período 2014/2020, de R$ 32,599 bilhões; 1.100 milhão de habitantes podem ser prejudicados.

Em nota, Cabral disse confiar no STF como a instância capaz de solucionar o conflito federativo criado pela nova lei. Segundo ele, a nova lei é "a maior violência já cometida contra um estado brasileiro desde a Constituição de 1988".

"Eu confio no Supremo para reparar essa violência que foi feita contra um estado da Federação. Tirar direitos constitucionais de estados e municípios em função de uma expectativa de distribuição de recursos não resolve o problema de nenhum estado brasileiro, mas leva à falência os municípios do Rio e impossibilita o nosso governo de avançar com investimentos fundamentais. São receitas que já fazem parte do nosso orçamento há muitos anos. Perdê-las significa uma grave crise orçamentária. E a população é a maior vítima".

Campos critica "litigância" no Judiciário

O governo do Espírito Santo utilizou como argumento na Adin um entendimento do próprio STF, em julgamentos anteriores, de que receitas originárias da exploração de recursos naturais são uma forma de compensar e indenizar os estados pelos prejuízos decorrentes da atividade.

- O STF decidiu compensar os impactos e as consequências na vida da população onde ocorre a exploração. Os royalties são receitas originárias dos estados impactados. A natureza dessa receita é compensatória - disse o procurador Rodrigo Marques de Abreu Judice, ressaltando que o estado terá dificuldades para executar o orçamento de 2013.

Outra queixa é que as novas regras entregam aos não produtores mais de 50% das receitas decorrentes do petróleo. Casagrande lamentou a posição do Congresso sobre o assunto, mas salientou que continua aberto ao diálogo:

- A tudo o que se discutiu nos últimos quatro anos o Congresso foi insensível. O Congresso foi surdo a essas argumentações, não respeitou o pacto federativo, o direito constitucional de nossas receitas. Estamos confiantes que o Supremo fará uma análise técnica dessa questão.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, argumenta na Adin que "a Constituição atribui ampla proteção às fontes de receitas dos entes federativos, de forma a assegurar a autonomia de todos". Ele se disse confiante numa liminar e defendeu a manutenção das regras, acrescentando que São Paulo deve perder R$ 4 bilhões até 2020:

- O nosso argumento junto à Adin é o fato de que as áreas já licitadas, os contratos já licitados devem manter a regra da época.

O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), afirmou que as ações são "um direito legítimo, da democracia".

Já o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) -que, apesar de ter defendido a derrubada dos vetos de Dilma à nova lei, propôs um acordo esta semana - disse que teria sido melhor chegar a um entendimento a ter-se criado uma "litigância" no Poder Judiciário.

- Melhor que uma disputa ou litigância no Poder Judiciário, teria sido mais favorável ter encontrado um entendimento na mesa de discussão. Respeito a opinião de quem quer ir disputar no tudo ou nada no Poder Judiciário.