Título: Rio é estado do país onde presidiários menos trabalham
Autor: Castro, Juliana
Fonte: O Globo, 17/03/2013, País, p. 4

Somente dois a cada cem presos do do Rio trabalham, dentro ou fora da unidade prisional. São apenas 676 exercendo atividades laborais num universo de 31.642. Levantamento feito pelo GLOBO com base em números do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) de junho de 2012 e divulgados no fim do ano passado mostra que este é o pior índice entre todos os estados brasileiros.

O GLOBO conversou com presos e a reclamação era uníssona: faltam oportunidades de trabalho nos presídios e, quando elas existem, não ajudam a ganhar experiência para um emprego fora dos muros da penitenciária.

As poucas ofertas de trabalho no sistema penitenciário fluminense foram destacadas no relatório de 2012 do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura.

No Rio, a responsabilidade pelo trabalho e estudo dos presos fica a cargo da Fundação Santa Cabrini, vinculada à Secretaria de Administração Penitenciária. O presidente do órgão, Jaime Melo de Sá, contestou os dados do Depen, que, segundo ele, ignoram uma parcela de 1.568 detentos que trabalham na faxina dentro do sistema prisional, com os quais o estado gasta R$ 5 milhões por ano em salário. Isso elevaria o índice do Rio para 7% dos presos trabalhando.

- Faltam recursos para profissionalizá-los, para qualificá-los? Lógico que falta, como falta aqui fora. Mas dentro do sistema é pior porque entre você colocar (recursos) aqui fora ou no sistema, provavelmente, por uma decisão política, a escolha é por menos dentro do sistema - disse Jaime, prometendo que, até o fim deste ano, 10% dos presos do estado estarão trabalhando.

SC tem melhor índice no país

No extremo oposto do Rio está Santa Catarina, onde 43% dos presos no sistema penitenciário trabalham. Lá, existem experiências como a Estampa Livre, da Pastoral Carcerária, no presídio de Florianópolis, que ajudam a deixar o estado com o melhor índice.

- Nos orgulha bastante dizer que dos 120 apenados que passaram por aqui, em sete anos do projeto, apenas um voltou a cometer crime - enfatiza o coordenador da Estampa, Newton de Almeida, que foi aluno da oficina no período em que cumpria pena de pouco mais de três anos por tráfico internacional.

No presídio masculino, a Estampa Livre tem uma sala adaptada, com os equipamentos, onde trabalha Maikon Zulmar Vieira, de 30 anos, e outros presos. Há sete anos, ele deixou para trás a mulher grávida e a liberdade:

- Achava que ter horário para trabalhar era chato. Mas vi que não tem problema acordar às 7h e trabalhar durante oito horas. Aprender serigrafia me deu confiança de saber que posso - disse Maikon, condenado a pena de 20 anos por assalto e homicídio.

Samuel Gonçalves tem 48 anos e já contabiliza 26 deles no cárcere, entre idas e vindas, por tráfico de drogas. Sem família, sem uma profissão certa, sem casa e com sete filhos (desconhece o paradeiro de seis deles), está a um ano e dois meses de deixar a unidade:

- Gostei de aprender a costurar. É muito mais leve do que dobrar ferros, que era o que fazia antes. Acho que terei mais chances nas confecções

Já no ranking com o percentual de presos que estudam, Tocantins aparece na pior colocação. É a unidade da federação em que, proporcionalmente, menos pessoas do sistema penitenciário exercem atividades educacionais: apenas 1,7%. São apenas 36 presos estudando, num universo de 2.114 pessoas.

Tocantins contesta dados

A Secretaria de Justiça e Cidadania, responsável pelos presídios no estado, afirmou que os dados estão errados e enviou um ofício ao Depen em outubro de 2012 para pedir a correção dos dados.

- A resposta foi que em janeiro de 2013 a correção seria feita. São 2.445 presos no sistema e 190 alunos da alfabetização ao ensino superior. Temos um preso do regime semiaberto na faculdade de odontologia - disse o superintendente do Sistema Penitenciário Prisional no estado, Walderi Francisco de Oliveira.

Ainda que o cálculo fosse feito com os dados da secretaria, menos de 10% dos presos do estado estariam estudando. Para o superintendente, os dados no Tocantins foram prejudicados por outro fator: o único presídio de segurança máxima do estado, o Barra da Grota, em Araguaína, a 400 quilômetros da capital, foi destruído após uma rebelião em 2011 e estava em reforma em 2012. A unidade prisional conta com sala de aula com capacidade de atender 216 presos.

Segundo a Secretaria de Justiça, sete cidades têm presos em sala de aula, mas, de acordo com a Corregedoria de Justiça, em apenas dois presídios existem espaços para presos de regime fechado estudarem.

- Onde tem estrutura não tem gente para fazer a segurança. Faltam agentes penitenciários, afinal de contas, para levar o preso para a sala de aula, existe uma logística que os presídios, na maioria das vezes, não tem - explicou a juíza auxiliar da Corregedoria, Flávia Afini Bovo.

Em posição oposta ao Tocantins, Pernambuco é o estado em que, percentualmente, mais presidiários estão em atividade educacional: 25% dos 27.193 no sistema penitenciário estudam. A maioria (5.401) cursa o ensino fundamental. Outros 850 estão na alfabetização e 509, no ensino médio. Nenhum cursa ensino superior ou técnico.