Título: Redação com hino tira 500 no Enem
Autor: Neto, Lauro; Vieira, Leonardo
Fonte: O Globo, 20/03/2013, País, p. 11

Além de receitas de Miojo, como a incluída por um candidato que teve 560 pontos na redação, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) registrou também uma nota 500 (num total de 1000) de um candidato que incluiu no meio de seu texto o hino do Palmeiras, dedicando dois dos quatro parágrafos à canção. O aluno até aborda o tema "Movimentos imigratórios para o Brasil no século XXI", mas, nos parágrafos de desenvolvimento, dedica-se ao seu time.

No segundo e no terceiro parágrafos, após a frase introdutória "As capitais, praia e as maiores cidades são os alvos mais frequentes dos imigrantes", ele começa a escrever parte do hino: "porque quando surge o alviverde imponente no gramado onde a luta o aguarda, (...)". Após fazer referências indiretas ao tema, o estudante finaliza com um erro de grafia no hino "Porque quem sabe ser brasileiro, hostenta (sic) a sua fibra" (veja mais na arte acima).

Em nota, o Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anisio Teixeira (Inep) esclarece que os avaliadores identificaram a impertinência do texto inserido, o que trouxe para a redação palavras e expressões sem sentido e em estilo inadequado ao tipo textual exigido na prova.

Segundo o Inep, a redação obteve nota 500, tendo nota baixa especialmente nas competências I e II. De acordo com a nota "desconsiderada a inserção inadequada, o texto tratou do tema sugerido e apresentou ideias e argumentos compatíveis. O texto indica compreensão da proposta da redação, não fugiu ao tema por completo e não feriu os direitos humanos".

O autor do texto é o paulista Fernando Maioto, que já havia sido aprovado em Medicina na Faculdade Faceres, em São José do Rio Preto. Ele conta que a intenção foi a de testar a banca do Enem.

- Sempre escutei histórias de pessoas que fizeram a redação e colocaram receitas de bolo. O grande intuito mesmo era mostrar que os corretores não leem completamente a redação - diz Fernando.

Para o professor de Letras e vice-reitor da Universidade Estácio de Sá, Deonísio da Silva, mesmo que candidato tenha comentado parcialmente o tema, sua prova deveria ser desconsiderada e sua nota, zerada.

- Ele usou o hino do Palmeiras no meio da frase para disfarçar. Penso que é deboche, mas mesmo se não for, ainda sim ele quebrou com a lógica argumentativa. Eu daria zero - opina.

Já Lucília Garcez, doutora em linguística aplicada defende a nota 500, dizendo que a orientação aos corretores é aproveitar o que for possível no texto.

- Se você observar bem a redação, excluindo a brincadeira de colocar o hino do Palmeiras, o participante escreve bem, não comete muitos erros de língua portuguesa, articula bem as ideias. E não fugiu totalmente do tema, chegou a desenvolvê-lo bem. Talvez, se ele não tivesse feito essa brincadeira, poderia até tirar nota máxima. Ele foi apenado por inserir um trecho fora do tema - diz Lucília.

Desde segunda-feira, O GLOBO mostra exemplos de redação que apresentam notas contraditórias em relação ao conteúdo. Textos que atingiram a pontuação máxima continham graves erros como "trousse", "enchergar" e "rasoavel". Ontem, o jornal publicou a redação do estudante de engenharia civil da Unilavras Carlos Custódio Ferreira, que escreveu uma receita de Miojo em um dos parágrafos. Apesar de ter tirado 560, ele acha que merecia zero.

-Fiquei surpreso quando vi o resultado. Era para eu zerar, pois fugi do tema. Confirmei o que desconfiava, que não corrigiam todas as redações direito - diz o universitário, de 19 anos.