Título: Nova enchente em Petrópolis traz à tona velhos erros
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Fonte: O Globo, 20/03/2013, Opinião, p. 20

Desastres climáticos, naturais ou ambientais costumam ser expressão do imponderável. Apesar dos avanços nos sistemas de previsão, nem sempre se pode determinar com precisão quando uma determinada região será atingida por um desses fenômenos que alimentam tragédias e prejuízos. Mas, mesmo quando a população é surpreendida pela natureza, principalmente nas manifestações sazonais, a adoção de políticas públicas eficazes de prevenção é crucial para reduzir danos e aumentar as barreiras de proteção dos moradores. Não é o caso de Petrópolis.

Vítima de nova enchente, pouco mais de dois anos após a tragédia que matou quase mil pessoas na Região Serrana do Rio, inclusive nesse município, a cidade voltou a sepultar mortos pela precipitação de chuvas fortes. Repetiu-se a fórmula que contribuiu para agravar as consequências do temporal do início de 2011 - burocracia na aprovação de obras e na liberação de verbas para intervenções de infraestrutura, leniência das autoridades com a ocupação de áreas de risco para moradia, inoperância em ações de remoção de casas etc.

Esse conjunto de fatores não é exclusividade de Petrópolis. Especialistas que acompanham o drama do município observam que, mais uma vez, se seguiu a bula da acomodação, um fenômeno que contamina o poder público em todo o país: os planos de obras só costumam aparecer quando o mal está feito, quando as vítimas começam a ser contadas. As intervenções remendam, quando deveriam cuidar da prevenção. No caso específico do município serrano, um plano de contenção de encostas no valor de R$ 60 milhões, aprovado ano passado no orçamento do PAC, pouco ou nada avançou - uma significativa amostra do pouco apreço das autoridades pela segurança dos moradores que seriam beneficiados pelas obras.

Conclui-se que a tragédia de 2011, na qual desapareceram famílias inteiras em deslizamentos de terra, não deixou ensinamentos. Apesar de ser um instrumento de política urbana ligado à segurança das pessoas, a remoção ainda é um tabu para o poder público em geral, e seu complemento, o reassentamento, uma ficção. A declaração da presidente Dilma, de que "as pessoas não querem sair", é uma meia verdade: de fato o risco existe, mas como abandonar a residência sem ter para onde ir?

Neste dilema, já houve casos, no Rio, de pessoas desalojadas por enchentes que voltaram a ocupar áreas de risco pagando, com o chamado aluguel social da prefeitura, para morar em casas condenadas pelo próprio município. Bizarro.

Não se pode impedir que chova, mas é inaceitável que suas consequências sejam enfrentadas com programas tíbios de prevenção e redução de danos. É preciso que o poder público faça, enfim, o dever de casa. Caso contrário, novos temporais voltarão a trazer à tona os mesmos relatos da leniência que alimenta tragédias.