Título: Pastor resiste à pressão
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 21/03/2013, País, p. 3

Presidente da Câmara faz apelo por renúncia a comando da Comissão de Direitos Humanos

É cada vez mais delicada a situação de Marco Feliciano (PSC-SP) à frente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara, que agora também enfrenta a pressão do presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). O presidente passou o dia ontem tentando convencer Feliciano - e o próprio PSC - a renunciar ao cargo, mas o parlamentar resiste. A pressão de Alves saiu dos bastidores. Ele chegou a puxar o líder do partido, André Moura (SE), pelo braço e o arrastou para uma conversa num canto do cafezinho da Câmara, na frente dos jornalistas.

Henrique Alves queria uma definição ontem mesmo, o que não ocorreu. Após reunião com lideranças do PSC, no início da noite, Alves anunciou apenas que o partido prometeu uma solução futura sobre o caso. Feliciano não apareceu para o encontro. Também participou dessa negociação o vice-presidente do PSC, pastor Everaldo Pereira, considerado o homem forte do partido.

- Tive uma conversa, fiz um pedido ao líder do PSC (sobre o destino de Feliciano) em razão das dificuldades que estão ocorrendo na Comissão de Direitos Humanos e que o Brasil inteiro acompanha. Foi uma conversa muito séria, e obtive do PSC (o compromisso) que será apresentada nos próximos dias uma solução respeitosa para todos. Nesse assunto tem que haver maturidade, acredito no entendimento e vamos respeitar o tempo - disse Henrique Eduardo Alves.

Ontem, a ministra da Secretaria Especial de Direitos Humanos, Maria do Rosário, aderiu à pressão e foi à Câmara para pedir ajuda de Henrique Alves com o objetivo de convencer o PSC a retirar Feliciano da presidência da comissão.

- Eu continuo e sou presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados - afirmou Feliciano ao "G1" e à TV Globo, ao deixar o gabinete da liderança do partido.

Indagado se poderia renunciar, ele disse: - Eu não quero falar sobre isso.

Feliciano passou a tarde sentado no plenário e era abordado por outros parlamentares. Seu chefe de gabinete, Talma Bauer, garantia que ele não renunciaria:

- Claro que não vai renunciar. Por causa de 18 baderneiros que vão fazer barulho lá na comissão?! Ele tem muito apoio e foi escolhido de forma legítima.

Alves não tem poder para retirá-lo

Marco Feliciano só deixa a presidência da comissão se quiser renunciar. Nem o presidente da Câmara tem poderes para destituí-lo do cargo uma vez que o parlamentar foi indicado pelo partido para o posto e eleito presidente da comissão. Essa é a razão de tantos apelos. A maioria da bancada de seu partido está contra sua permanência. E a pressão na Casa aumenta. A oposição ao pastor já inclui quase todos os partidos, como ficou demonstrado num ato ontem contra sua manutenção no cargo.

O descontentamento de Henrique Eduardo Alves aumentou nos últimos dias, em especial após o surgimento do vídeo, elaborado por seguidores de Feliciano, onde deputados contrários a ele aparecem em cenas montadas. Feliciano negou a autoria do vídeo, mas o postou na sua rede social.

- O presidente da Câmara conversou comigo e disse que achou o vídeo altamente ofensivo. E que o deputado Feliciano não atendeu a seu pedido de moderação. E disse que se empenharia em uma solução - disse Chico Alencar, sobre diálogo no dia anterior.

Após encontro do presidente da Câmara, ontem à noite, André Moura informou apenas que a bancada iria voltar a se reunir para discutir o assunto, mas sem data prevista. Eduardo Alves espera uma solução até a próxima terça-feira.

Enquanto esteve no plenário, Feliciano foi abordado pelo líder do PR, Anthony Garotinho (RJ), que lhe deu conselhos. Primeiro, Garotinho sugeriu que criasse um gabinete de crise e que ouvisse seus aliados. No final da conversa, o líder já sugeria a renúncia na comissão e disse que o episódio teria sido benéfico politicamente para o pastor.

Ontem, mais uma vez, Feliciano não conseguiu conduzir a reunião da comissão. O deputado enfrentou novos protestos de manifestantes de entidades LGBT, que ocuparam parte do plenário da reunião e, com palavras de ordem e faixas, impossibilitaram a realização de uma audiência pública sobre transtornos mentais. Ele apenas abriu a reunião e a deixou imediatamente. Ainda assim, os protestos continuaram até que a sessão fosse suspensa.

intimação em caso de estelionato

Antes da suspensão, ocorreu uma situação inusitada. Convidado como expositor sobre transtorno mental, Aldo Zaiden, assessor de Saúde Mental do Ministério da Saúde, fez um discurso se referindo à polêmica gerada desde Feliciano assumiu a comissão.

- Os direitos humanos vivem um retrocesso - disse Zaiden, que foi interrompido pela confusão em plenário.

Quando retomaria a palavra, ele foi ameaçado por Jair Bolsonaro (PP-RJ).

- O senhor se restrinja ao tema da audiência pública. Não faça discurso - disse Bolsonaro ao assessor, que reagiu: - Fui proibido de falar pelo deputado Bolsonaro. Não tenho o que fazer aqui - disse Zaiden, que foi embora.

Ontem, o Supremo Tribunal Federal (STF) intimou o deputado Marco Feliciano a prestar depoimento no processo que responde pelo crime de estelionato. A decisão foi do ministro Ricardo Lewandowski, que marcou o depoimento para 5 de abril. A ação penal em curso no STF apura a suposta prática de estelionato e o recebimento indevido de R$ 13,3 mil. O pastor - antes de ser eleito deputado - foi contratado para um evento evangélico em São Gabriel (RS) em 2009, recebeu o dinheiro e não compareceu, conforme a denúncia que resultou na ação penal.