Título: Arquivos não digitalizados prejudicam Comissão da Verdade
Autor: Dal Piva, Juliana
Fonte: O Globo, 21/03/2013, País, p. 6

Consulta do acervo do SNI será limitada devido à falta de infraestrutura

A falta de digitalização do acervo do Serviço Nacional de Informações (SNI) pertencente ao Arquivo Nacional tem atrapalhado o trabalho da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Em evento no Rio ontem, Rosa Cardoso, integrante da CNV, disse que o grupo já admite que terá que escrever o relatório final sem ter acesso à totalidade dos documentos.

- Temos muita clareza de que nós vamos poder utilizar somente uma parte da documentação - afirmou Rosa.

Liberados para consulta no ano passado, os documentos proporcionaram algumas descobertas para pesquisadores e jornalistas e estão baseando as investigações e trabalhos dos integrantes e assessores da CNV. Rosa disse que a comissão solicitou à presidente Dilma Rousseff e ao Ministério da Justiça novos recursos para ampliar o trabalho de digitalização do acervo do SNI.

- Nós estamos até solicitando e pedimos a presidenta recursos para que seja digitalizado um material muito mais amplo do que o que nós podemos usar - disse Rosa, sem precisar o valor pedido.

Procurado, o Arquivo Nacional não informou o montante requisitado nem a quantidade de arquivos não digitalizados.

Rosa Cardoso também apresentou ontem uma nova linha de trabalho do grupo gerada pelo caso Panair, a companhia aérea brasileira que perdeu a licença para voar em 10 de fevereiro de 1965 e foi extinta pelo regime. Ao lado estava Rodolfo da Rocha Miranda, filho de Celso da Rocha Miranda, sócio da companhia na época e já falecido. Além dele, a empresa pertencia ao empresário Mário Wallace Simonsen.

Miranda explicou que a empresa com cinco mil funcionários teve as linhas cassadas sem aviso prévio por um processo administrativo sumário. Em seguida, de acordo com ele, todas as linhas passaram a ser operadas pela Varig. O motivo do boicote, de acordo com ele, seriam as relações de seu pai com o ex-presidente Juscelino Kubitschek. Logo após o golpe militar, o herdeiro disse que a família foi constantemente perseguida.

- A partir de 1964, a minha casa passou a ser vigiada, o telefone passou a ser bloqueado por agentes. A casa do meu pai foi invadida e os armários foram vasculhados - contou, revelando que, com medo, a família deixou o país por seis meses.

dono da panair investigado

O empresário disse que o Arquivo Nacional localizou documentos produzidos pelo Centro de Informações de Segurança da Aeronáutica (Cisa) acionando funcionários do Ministério da Fazenda para promover investigações nas empresas da família. A justificativa utilizada para a suspensão das linhas foi a má situação financeira da empresa.

O herdeiro admitiu que a empresa enfrentava dificuldades, mas seria a principal opção do setor naquele tempo. Ele contou ainda que só conseguiu levantar a falência da empresa em 1995, quando foi descoberto cerca de R$ 20 milhões nos caixas da empresa.

Atualmente, a família possui na Justiça ações de indenização pelo uso de três aeroportos que eram propriedade da Panair e foram tomados pelo governo. São eles, o Aeroporto Internacional de Belém, o Aeroporto dos Guararapes, em Recife, e o Aeroporto de Pici, em Fortaleza.