Título: Ameaças e chantagem atrasam decisão na Comissão de Ética
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 27/03/2013, País, p. 4

O Conselho de Ética da Câmara virou espaço público de manobra política, chantagens e ameaças na segunda tentativa de eleger o novo presidente do colegiado, ontem. A sessão não terminou, e a eleição foi marcada para a próxima terça-feira. O impasse se deu porque não vingou o acordo entre o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e o PDT para eleger presidente do conselho o novato e desconhecido deputado Marcos Rogério (PDT-RO), já que o deputado Ricardo Izar Júnior (PSD-SP) lançou sua candidatura avulsa e era considerado favorito na disputa.

Telefonema de Alves

Henrique Alves interveio diretamente no andamento dos trabalhos. Assim que começou a reunião do conselho, ele ligou para o atual presidente, José Carlos Araújo (PSD-BA), que transmitiu o apelo de Alves a Izar para renunciar.

- Não retiro. Mantenho - respondeu Izar.

Entrou em campo, então, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), que foi até a comissão e tentou de todas as maneiras dissuadir Izar Júnior de manter a sua candidatura, alegando que havia um acordo político entre os partidos, que deveria ser mantido. Diante da resistência do deputado paulista, Cunha fez ameaças diretas ao PSD e disse que, se Izar fosse eleito, o partido iria ser prejudicado na votação do projeto que cria cargos de confiança para a legenda e que também perderia a corregedoria.

- Vim aqui não só para fazer um apelo, mas um chamamento político. É preciso respeitar a força dos acordos. Não existe isso de que é solto, de que é livre. Os acordos estão interligados. Não existe processo político pela metade. Se faz de um lado, e de outro. Não aceito acordo descumprido na minha cara - disse Eduardo Cunha, ameaçando: - Se o acordo não for cumprido, não permitirei que se vote mais nada. Nem a corregedoria nem os cargos do PSD.

Vários deputados reagiram na sequência.

- O que que é isso?! Não podemos ter medo de disputa. Essa é uma visão autoritária. Tem os que mandam e os que obedecem?! Não é assim, não. Cadê a ética? Esta não é uma comissão qualquer - reagiu Antônio Roberto (PV-MG).

Depois, o líder do PDT, André Figueiredo (CE), em defesa de seu indicado, disse que seu partido não se apega a cargos, mas que o acordo teria que ser respeitado:

- Nos constrange o que está ocorrendo aqui. Não condicionamos nada, mas acordo é para ser cumprido. Não pode ter candidatura avulsa, aqui prevalecem os indicados pelos partidos.

Izar Júnior, que saiu como candidato avulso na vaga cedida pelo PR, já que seu partido nem o indicou para o colegiado, refutou essa tese, dizendo que no conselho nunca houve orientação de lideranças e acordos:

- Estou sofrendo uma pressão muito grande, e ameaçam o meu partido. Isso é antiético.

Plenário com 10 presentes

O PT, que não tinha participado do acordo, decidiu ontem apoiar o candidato oficial Marcos Rogério. Mas a reação dos defensores do acordo deixou claro que Izar Júnior poderia mesmo ser eleito se houvesse eleição. Ele acredita que teria 14 dos 21 votos no conselho.

Mas, quando José Carlos Araújo deu a discussão por encerrada e se iniciaria a votação, acendeu-se a luz do início da ordem do dia no plenário da Câmara, o que interrompe automaticamente as sessões das comissões. Alves iniciou a sessão no plenário com a presença de 202 deputados registrada no painel, e menos de dez fisicamente no local. É prerrogativa do presidente iniciá-la com qualquer quorum, mas ontem sua atitude foi considerada mais uma manobra, uma vez que, geralmente, só se abre a sessão quando o número de presenças é de 257, metade mais um do total de deputados.