Título: Governo de SP publica na internet fichas da ditadura
Autor: Herdy, Thiago
Fonte: O Globo, 02/04/2013, País, p. 6
Entre os documentos, prontuário da prisão da presidente Dilma
Quase um milhão de imagens de fichas, prontuários e dossiês produzidos pela Delegacia Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo estão desde ontem disponíveis no portal Memória Política e Resistência, lançado pelo Arquivo Público de São Paulo. O site reúne cerca de 10% do acervo do órgão, que abrange o período entre 1923 e 1983, quando ele era identificado como Deops-SP, e entre 1983 e 1999, quando passou a se chamar Departamento de Comunicação Social.
Entre os documentos para consulta está a ficha 76.346, sobre a presidente Dilma Rousseff (PT). Foi produzida em janeiro de 1970, quando ela foi presa, aos 22 anos. O registro traz impressões digitais da presidente, faz menção ao Volkswagen cinza ano 1966 apreendido com ela durante a prisão "com base na Lei de Segurança Nacional", e menciona declaração da ex-guerrilheira, que disse "não ter religião".
O critério de digitalização foi cronológico: os documentos publicados na internet se referem principalmente à atuação do órgão nas décadas de 20 e 30. Documentos de outros períodos, solicitados anteriormente por jornalistas e pesquisadores, e que já estavam digitalizados, também estão no portal. O mesmo ocorre com as fichas do Deops de Santos, descobertas em 2010.
Serra: repressão "inventava coisas"
O acervo da polícia política de São Paulo foi disponibilizado pela primeira vez para consulta a familiares de presos e desaparecidos políticos em 1991. Em 1994, foi posto à disposição para consulta pública.
- Ao disponibilizar os documentos na internet, facilitamos o acesso de pesquisadores do mundo inteiro. Não há previsão de digitalização do acervo restante, mas estamos em busca de parceiros e patrocínio para darmos prosseguimento a esse trabalho - disse o coordenador do Arquivo Público de São Paulo, Carlos Barcellar.
Presente ao evento, o ex-governador José Serra (PSDB) lembrou que os dados do acervo devem ser vistos com ressalvas, em função de eventuais erros cometidos pelos agentes da repressão, que, segundo ele, "inventavam coisas".
- Já tive a oportunidade de ver a minha ficha, em outro momento. Lembro-me de uma referência à visita do (Yuri) Gagarin a São Paulo, deve ter tido um jantar. Diz a ficha que eu fui ao jantar e chorei quando se falou da União Soviética. Eu nem era do fã-clube da União Soviética, e menos ainda a ponto de chorar - lembrou o político tucano, que, ao fim do evento, não quis falar sobre a sucessão interna no PSDB.
Umas das fichas disponíveis no portal é a do teatrólogo Plínio Marcos, morto em 1999. Os pesquisadores do acervo do Deops-SP frisaram a inclusão de recorte de jornal com notícia de 2000 sobre ele, sinal de que, mesmo após a morte de Marcos, informações continuavam sendo coletadas e armazenadas. Há prontuários de artistas como Patrícia Galvão, mais conhecida como Pagu, do escritor Monteiro Lobato e do sociólogo Florestan Fernandes.
Presente no evento de lançamento do portal, o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Paulo Sérgio Pinheiro, disse que, até o segundo semestre deste ano, o Arquivo Nacional terá digitalizado 16 milhões de imagens de arquivos de órgãos federais, trabalho que ainda está no início. Lembrou da importância da digitalização dos dados para a comissão, mas destacou que eles devem ser tratados apenas como parte de um trabalho muito mais complexo.
- Esses documentos são vestígios arqueológicos do passado político brasileiro. É maravilhoso isso que foi feito hoje, mas é evidente que só o acesso não resolve. Os familiares bem sabem, estão pesquisando isso há décadas. É como quando você tem um muro, e alguns ladrilhos, apenas. A gente tem que achar os ladrilhos que estão faltando - disse Pinheiro.
COMISSÃO DA VERDADE
COORDENADOR REAGE A CRÍTICAS DE FAMILIARES
SÃO PAULO - O coordenador da Comissão Nacional da Verdade (CNV), Paulo Sérgio Pinheiro, reagiu às críticas aos métodos de trabalho da comissão, feitas por parte de familiares de vítimas da ditadura e pela presidente Dilma Rousseff, conforme mostrou O GLOBO. O motivo da reclamação é o caráter reservado do trabalho, que tem priorizado a realização de sessões a portas fechadas com militares e sobreviventes da repressão, no lugar de sessões públicas. — Só temos recebido apoio e mensagens positivas da presidente. Ela é informada de todos os nossos passos, como deve ser. Agora, talvez outras pessoas estejam psicografando outras mensagens que dizem o contrário, eu não sei, ou telepatia. Isso não posso controlar — disse, em tom irônico. Pinheiro afirmou que será mantida a estratégia de realizar algumas sessões reservadas. Lembrou que audiências públicas vêm sendo promovidas pela CNV em parceria com comissões estaduais.
Umas das fichas disponíveis no portal é a do teatrólogo Plínio Marcos, morto em 1999. Os pesquisadores do acervo do Deops-SP frisaram a inclusão de recorte de jornal com notícia de 2000 sobre ele, sinal de que, mesmo após a morte de Marcos, informações continuavam sendo coletadas e armazenadas. Há prontuários de artistas como Patrícia Galvão, mais conhecida como Pagu, do escritor Monteiro Lobato e do sociólogo Florestan Fernandes. Presente no evento de lançamento do portal, o coordenador da Comissão Nacional da Verdade, Paulo Sérgio Pinheiro, disse que, até o segundo semestre deste ano, o Arquivo Nacional terá digitalizado 16 milhões de imagens de arquivos de órgãos federais, trabalho que ainda está no início. Lembrou da importância da digitalização dos dados para a comissão, mas destacou que eles devem ser tratados apenas como parte de um trabalho muito mais complexo. — Esses documentos são vestígios arqueológicos do passado político brasileiro. É maravilhoso isso que foi feito hoje, mas é evidente que só o acesso não resolve. Os familiares bem sabem, estão pesquisando isso há décadas. É como quando você tem um muro, e alguns ladrilhos, apenas. A gente tem que achar os ladrilhos que estão faltando — disse Pinheiro.