Título: Não às sinecuras. Queremos trabalho
Autor: Aguiar, Rui; Gomes, André
Fonte: Correio Braziliense, 28/10/2009, Opinião, p. 17

Suplente de vereador em Mesquita (RJ), pelo PV

Suplente de vereador em Miracema (TO), pelo PMDB

Esta é uma semana decisiva para a vida de 2.201 municípios brasileiros. Amanhã, o Supremo Tribunal Federal decidirá se 7.343 vereadores eleitos em 2008 podem, enfim, assumir os mandatos. Nós, autores da proposta, estamos entre eles e trazemos conosco a ansiedade pelo veredicto do STF. Antes que você, leitor, pense que só defendemos nossas posições porque corremos atrás daquilo que alguns, inapropriadamente, consideram um emprego público fácil, escute-nos. Fácil é ser do contra sem analisar a fundo o que se passa.

Entre todos os cargos existentes nos sistemas de democracia representativa, o de vereador é o mais próximo do eleitor. Seja em metrópoles como São Paulo, com 11 milhões de eleitores, onde o vereador é o único político que faz rondas nas administrações regionais e se dispõe a brigar contra a majoração de talões de Zona Azul ou a favor do disciplinamento de feiras públicas, ou em Borá, cidadezinha do interior paulista, a menor do Brasil, com apenas 892 habitantes, onde há quorum para reuniões da Câmara de Vereadores até mesmo nos plácidos fins de tarde da Praça da Matriz. É o vereador que está sempre disponível para escutar ao pé do ouvido os pedidos, as reclamações e as críticas dos cidadãos. E para encaminhá-los, para lhes dar sequência e fiscalizar a implantação de políticas públicas.

É errado considerar nosso mandato emprego público. Somos delegados da vontade popular. Não lutamos por sinecuras. Queremos trabalhar, sabemos que há muito por fazer em cada beco, esquina ou encruzilhada dos municípios que representamos. Levanta-se contra nós o argumento de que a posse dos 7.343 eleitos em 2008, que estão com mandatos interditados pela decisão liminar do STF que será enfim julgada pelo plenário da Corte Maior esta semana, significará uma farra com dinheiro público. Dizem que as despesas aumentarão para fazer face aos salários dos novos vereadores, injustamente deixados de fora dos plenários de suas câmaras. Nada mais falso.

A Emenda Constitucional nº 58, promulgada há um mês, não apenas redistribuiu as vagas de vereadores. Ela tornou a proporcionalidade do voto popular mais próxima da realidade e reduziu os percentuais das receitas municipais que podem ser gastos no custeio das câmaras de vereadores. Ao contrário de ampliação de gastos, o que vai ocorrer é uma economia anual de cerca de R$ 1,5 bilhão no financiamento do conjunto de câmaras de todo o país, ou de R$ 6 bilhões no fim do mandato para o qual fomos eleitos. Esse é aspecto relevante do debate, infelizmente esquecido pelas vozes que se levantam contra nós.

Analisemos dois casos que dizem muito sobre representatividade: Carapebus, no Rio de Janeiro, e Poá, em São Paulo. São duas cidades que parecem perdidas nos mapas de seus estados, porém simbólicas quanto àquilo que precisa ser dito. Distrito emancipado de Macaé, Carapebus possui 8 mil habitantes e nove vereadores. Outrora cidade-sede do distrito de Carapebus, a rica Macaé tem 200 mil habitantes e um colegiado de escassos 12 vereadores. É injustiça flagrante. Macaé, com população 20 vezes maior do que o antigo distrito, não precisa de 20 vezes mais vereadores. Mas é lógico que uma proporcionalidade mais equânime é mais democrática.

Irracionalidade similar encontra-se em Poá, cidade de 104 mil habitantes do interior de São Paulo, que tem 11 vereadores. A minúscula Borá, próxima de Poá, tem nove vereadores para 892 habitantes. É justo? E que não se defenda o fim da vereança, pois seria o mesmo que defender o Estado de Direito sem o necessário exercício da política. Não há democracia sem Estado de Direito, e este não pode prescindir dos políticos que o sustentam.

A proposta de emenda constitucional (PEC) que redistribuiu as vagas de vereadores no país tramitou na Câmara e no Senado de 2004 a 2008. Quando os eleitores das 2.201 cidades que sofrerão alterações no número de vereadores foram às urnas, no ano passado, a PEC estava aprovada na Câmara dos Deputados e estabelecia a recomposição das vagas de vereadores. O entendimento pacífico de legisladores e juristas é o de que o novo número de vagas valerá de forma líquida e certa em 2012. Entendemos que vale desde já. Afinal, os eleitores de Poá, Macaé e dos demais 2.199 municípios que têm defasagem no número de vereadores não podem seguir sub-representados. Isso é o direito, isso é a justiça.