Título: Só falta saber quem fica com o dinheiro
Autor: Foreque, Flávia
Fonte: Correio Braziliense, 17/10/2009, Brasil, p. 12

Governadores definem proposta que será levada a conferência de mudanças climáticas em Copenhague. Projeto que trata da venda de crédito de carbono tem apoio do governo, mas destino dos recursos é uma incógnita

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, e os governadores da Amazônia Legal em reunião em Macapá: a manutenção das árvores também é importante para o equilíbrio ambiental

Macapá ¿ Os governadores da Amazônia Legal definiram a proposta final para a Conferência de Mudanças Climáticas, que será realizada em dezembro na cidade de Copenhague, Dinamarca. O evento vai reunir os 189 países-membros da ONU e pretende debater um novo marco no combate às mudanças climáticas. O Protocolo de Kyoto, que estabelece metas para redução de emissões de gases de efeito estufa, expira em 2012.

O principal eixo do documento elaborado pelos governadores amazônicos, intitulado Carta de Macapá, define o posicionamento brasileiro sobre o mercado de crédito de carbono. Esse mecanismo tem como princípio fundamental a maior valorização da floresta em pé do que derrubada. O sexto Fórum de Governadores da Amazônia Legal, realizado na capital do Amapá, contou com a presença de sete dos nove governadores da região. Os governadores de Rondônia e Maranhão enviaram representantes ao evento.

A carta ainda será entregue ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas já conta com o apoio do governo federal. Segundo o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, presente no encontro, o documento será o carro-chefe da apresentação brasileira em Copenhague. ¿Hoje, estamos unidos, e quando estamos unidos somos ouvidos. Quando estamos juntos passamos a ter uma força e uma representação muito grande¿, avaliou o governador do Amazonas, Eduardo Braga (PMDB).

Meta nacional

O mercado de crédito de carbono remunera a preservação florestal com base na quantidade de CO2 não emitido para a atmosfera devido à manutenção da flora. O mecanismo, denominado Redução por Emissões de Desmatamento e Degradação (Redd), pode movimentar bilhões de dólares em todo o país. ¿Quase todos os estados da Amazônia já estão preparando projetos de acesso ao mercado de carbono. Mas na hora que acontecer (a conferência) em Copenhague, é lógico que as coisas ficam mais claras¿, disse o governador do Amapá, Waldez Góes (PDT). A Carta de Macapá também vai encaminhar demandas da região ao presidente Lula.

O Ministério do Meio Ambiente ainda pretende levar à conferência em Copenhague uma meta nacional de congelamento das emissões de CO2 aos níveis de 2005, quando o Brasil emitiu 2,2 bilhões de toneladas de dióxido de carbono. A estimativa considerou um crescimento médio nacional de 4% ao ano. Para atingir o alvo é preciso uma redução de 40% nas emissões de gases de efeito estufa no país.

Lucros

O documento elaborado pelos governadores da Amazônia Legal reforça o consenso entre os políticos da região de que a compensação financeira não deve recompensar apenas o reflorestamento de áreas degradadas. A manutenção da floresta em pé, afirmam, também é importante para o equilíbrio ambiental. Apesar do consenso, ainda não há uma definição sobre quem terá direito aos recursos obtidos com a venda de créditos de carbono. A ideia é beneficiar projetos de valorização e preservação do meio ambiente, ainda não oficializados ¿ daí a expectativa para a conferência em Copenhague.

O governador do Mato Grosso, Blairo Maggi, defende, por exemplo, a participação do setor privado. Para ele, um proprietário de uma área do bioma amazônico pode negociar o não desmatamento de parte de sua propriedade para venda de carbono. De acordo com a legislação atual, propriedades privadas localizadas na região podem devastar até 20% da área. ¿Aquilo que já é preservado (os 80% restantes) por lei não vale no mercado. Se o cidadão pode desmatar 20%, ele pode ir ao mercado, dizer que tem a licença para desmatar e usar o Redd para manter a floresta em pé¿, afirma. De acordo com cálculos do governo local, o estado pode obter cerca de U$ 11 bilhões com a venda de créditos de carbono.

Para saber mais Entre Japão e Dinamarca

Danielle Santos

A Conferência das Partes da Convenção do Clima é organizada pela Organização das Nações Unidas (ONU) e ocorre a cada dois anos. Em 2009, a 15ª edição, que será em dezembro, em Copenhague (Dinamarca), terá a missão de evitar o fracasso do Protocolo de Kyoto, realizado em 1997 com objetivo de selar um acordo entre países desenvolvidos e em desenvolvimento para o enfrentamento das mudanças climáticas, mas que teve pouca adesão dos países mais industrializados. O motivo é simples: sairão da COP 15 as políticas para 2012 que substituirão as decisões tomadas em Kyoto.

O Brasil tem planos ambiciosos para contribuir com o freio nas mudanças climáticas, mas que ainda estão em discussão. Entre eles, a redução do desmatamento da Amazônia em 80% até 2020 e a manutenção da emissão de dióxido de carbônico, o principal gás do efeito estufa, no patamar registrado em 2005, que é de 2,2 bilhões de toneladas. Hoje, o país emite o equivalente a 2,4 bilhões e, com falta de políticas de contenção, pode chegar a 2,8 bilhões em 11 anos.

Mas para alcançar esse índice o governo precisa resolver alguns entraves internos antes de ¿vender¿ a ideia da política viável, como pressionar o Congresso Nacional para aprovação de uma lei que cria mil cargos para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade e para o Ibama e a trabalhar pela aprovação do Plano Nacional de Mudanças Climáticas. O texto foi encaminhado no ano passado pelo Executivo, mas ainda sofre resistência dos parlamentares.