Título: MP vence até agora
Autor: Souto, Isabella
Fonte: Correio Braziliense, 01/11/2009, Política, p. 8

Ao julgar três habeas corpus, STF reconhece competência de promotores para investigar

Na briga judicial entre policiais e integrantes do Ministério Público pelo poder de presidir investigações, o segundo grupo tem levado a melhor. Ao julgar na terça-feira três habeas corpus em que os autores questionaram o fato de terem sido investigados por promotores, os três ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram que o ato é legal. A decisão contraria as alegações das polícias Federal e Civil, para quem a tarefa é exclusiva, por determinação da Constituição de 1988.

Pelo menos parte dos integrantes do STF demonstraram não ter o mesmo entendimento dos policiais. Segundo o relator das ações, Celso de Mello, o MP tem legitimidade para investigações criminais atuando concorrentemente e subsidiariamente às polícias, especialmente em ¿hipóteses delicadas, nas quais pode se tornar questionável a atuação da polícia, notadamente em crimes praticados por policiais, como a prática de tortura, por exemplo¿. A única ressalva é que cabe ao MP respeitar todas as garantias constitucionais previstas para qualquer investigado. O voto do relator foi seguido pelos colegas Eros Grau e Joaquim Barbosa.

Em maio, a ministra Ellen Gracie já havia votado de forma semelhante. Relatora de outro habeas corpus que questionou a coleta pelo MP de provas de um crime, a ministra deu sinal verde para a instituição. ¿Essa conclusão não significa retirar da polícia judiciária as atribuições previstas constitucionalmente¿, afirmou em sua decisão. Ou seja, pelo menos quatro dos 11 ministros do STF entendem que o MP tem poder também para investigar. E eles farão parte do grupo que ainda vai julgar duas ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) ajuizadas por associações nacionais de delegados de polícia que questionam a atuação do MP.

Confiança

Quem é contrário à tese diz que o artigo 144 (1)da Constituição prevê que cabe à Polícia Federal exercer ¿com exclusividade as funções da polícia judiciária da União¿. O presidente da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol), Carlos Eduardo Benito Jorge, está confiante na vitória da ação ajuizada pela instituição. ¿Os habeas corpus tratam de um caso específico, a Adin não. O voto pode ser diferente quando as Adins chegarem ao plenário¿, afirmou. Ainda não há previsão de julgamento.

Pelo menos um voto de ministro STF deve pertencer ao grupo que é contra a investigação pelos promotores do Ministério Público. Recém-empossado no tribunal na vaga aberta com a morte de Carlos Alberto Menezes Direito, José Antônio Dias Toffoli manifestou-se sobre o assunto quando era advogado-geral da União ao fazer um parecer sobre uma das Adins que tramitam no STF. Ele foi categórico ao afirmar que a tarefa é exclusiva das polícias judiciárias.

Em um dos três habeas corpus julgados pelo STF nesta semana, dois policiais militares, acusados de tráfico de drogas, peculato (obter bem da administração pública), concussão (quando o funcionário público exige para si ou outro vantagens indevidas), prevaricação (não realizar conduta obrigatória) e falsidade ideológica tentaram anular o trabalho do MP. Em outra ação, um delegado de polícia e um grupo de policiais civis foram denunciados e condenados por tortura. A última ação envolve peculato. Mas eles foram derrotados em todas as ações.

1 - Legislação O artigo que trata da segurança pública é o principal argumento contrário às investigações do Ministério Público. Segundo a Constituição, é dever do Estado garantir a preservação da ordem pública, do patrimônio e o bem-estar das pessoas. O texto diz que esse poder deve ser exercido pelas polícias Federal, Rodoviária, Ferroviária, Civil, Militar e pelos Bombeiros. Para o MP, o artigo não assegura às polícias qualquer exclusividade na investigação criminal.

Para saber mais Decisão na mão de relator

Uma ação direta de inconstitucionalidade da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol) questionando a fiscalização das investigações policiais por promotores e procuradores deve entrar na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF). O processo, que chegou à Corte em julho deste ano, está nas mãos do relator, ministro Ricardo Lewandowski. Segundo a Adepol, a Constituição concedeu ao Ministério Público o poder de requisitar diligências investigatórias e instauração de inquérito policial, porém não contempla a possibilidade de realizar e presidir inquéritos policiais.

Na semana passada, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) e a Associação Nacional dos Procuradores da República (Anpr) ingressaram no Supremo com pedido de amicus curiae. A expressão significa ¿amigo da Corte¿ e serve para identificar alguém que entra em um processo do qual não é parte, mas cujo resultado pode influenciar sua vida. As duas entidades alegam que trabalham diretamente com assuntos de interesse dos integrantes do Ministério Público federal e dos estados.