Título: CSN divide Congonhas
Autor: Almeida, Daniela
Fonte: Correio Braziliense, 01/11/2009, Brasil, p. 12

Investimento de R$ 9,5 bilhões da siderúrgica em município mineiro deixa moradores apreensivos: 13% da área serão desapropriados

O município de Congonhas, famoso pelo Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, onde estão os 12 Profetas do Aleijadinho, obra declarada Patrimônio da Humanidade, vive um verdadeiro impasse. Na mesma semana em que a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) anunciou R$ 9,5 bilhões de investimentos na região, a cidade se divide entre o desenvolvimento proporcionado pelos dividendos da mineração e os problemas causados pela desapropriação de 13% de toda a sua área territorial para a construção de um complexo industrial, que incluirá uma barragem de rejeito de minérios e uma usina para a pelotização do minério de ferro. O maior problema, segundo moradores e vereadores entrevistados, é a falta de informação sobre o projeto. A CSN acredita que as questões levantadas são uma consequência natural da implantação do projeto. Para a siderúrgica, o processo só terá início a partir da obtenção das licenças ambientais, quando será possível efetivar o investimento na região.

Os parlamentares reclamam que o Legislativo não pôde participar do processo desde o início, já que o protocolo de intenções foi assinado entre a prefeitura, o governo e a CSN sem que a Câmara Municipal fosse comunicada. ¿Eu acho que o prefeito imaginou que era um negócio tão bom que toparíamos tudo, até derrubar a igreja da matriz e os profetas (de Aleijadinho) se preciso fosse¿, diz o vereador Anivaldo Coelho (PPS). A pressão agora, de acordo com os vereadores ouvidos, é para que seja alterado o plano diretor da cidade, que deve reverter uma área rural de 32 quilômetros quadrados em área urbana.

Apesar de o Executivo ter apoio da maioria no Legislativo ¿ são cinco vereadores da base governista contra quatro ¿, a alteração da lei orgânica pode apresentar dificuldades para ser aprovada. Dos sete vereadores entrevistados, só três afirmaram que votam pela aprovação da alteração no plano diretor. O restante adiantou que, apesar de serem a favor do investimento, só votam a favor caso haja garantias de contrapartida para o município e a população.

Embate

O argumento dos vereadores da base que querem a aprovação imediata do projeto na Câmara é o de que sem a modificação no plano diretor é impossível qualquer passo que permita a implantação do complexo industrial. ¿O que o governo do estado disse em uma reunião com os vereadores é que sem a licença prévia (que vem depois da mudança no plano diretor) não tem desapropriação e sem a desapropriação não tem empreendimento. Então, enquanto não for obtida a licença, nada é válido¿, defende o líder do governo na Câmara, Adeir dos Santos (PT).

Mesmo parlamentares que costumam votar com o Executivo afirmam ter receio de que o município saia perdendo. As principais questões levantadas são a preservação do patrimônio cultural de Congonhas, a justa indenização aos sitiantes e a falta de infraestrutura na cidade, já que um estudo do Instituto de Desenvolvimento Municipal encomendado pela prefeitura à CSN prevê que a população passe de 50 mil habitantes para mais de 100 mil em 10 anos.

O vereador governista Edilon Ferreira (PSDB) é um exemplo. ¿O que compete à Câmara é votar o plano diretor. Depois disso votado, só vamos participar da licença prévia com comentários, mas não com o direito de voto. Logo, a sociedade só terá essa chance¿, avalia. ¿Não sou contra o distrito industrial, mas temos que negociar. Qual vai ser a contrapartida da CSN e do Estado, por exemplo?.¿

Incerteza na produção

Plantações abandonadas, construções interrompidas, entulhos de casas que foram desocupadas. Desde que começou a correr na cidade o boato de que parte da área rural de Congonhas seria desapropriada, os sitiantes pararam de investir. ¿Disseram que iam desapropriar, aí o pessoal ficou com medo de plantar e perder tudo. Ninguém informa nada pra gente¿, conta Edson Catarino de Paula, 52 anos, desempregado.

Segundo a Associação Comunitária dos Amigos de Congonhas, um estudo da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais aponta que cerca de 450 pessoas serão desapropriadas da área de 32 quilômetros quadrados dedicada ao complexo industrial. A associação, contudo, afirma que esse número pode chegar a mil pessoas.

Ninguém sabe ao certo, ninguém conhece o projeto e ninguém tem o conhecimento legal do que está acontecendo. Nem o prefeito nem as autoridades competentes fornecem dados¿

Luiz Tio Panga, presidente da Associação Comunitária dos Amigos de Congonhas

O número 100 mil Número de habitantes previstos para Contagem daqui a 10 anos. Hoje, são cerca de 50 mil

Promessa de transparência

Jayme Nicolato, diretor de mineração da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), afirma que os problemas apontados pela população e pelos vereadores, como a falta de informação quanto às desapropriações e a demora na transposição dos habitantes, são inevitáveis. As questões, de acordo com o executivo, são consequências naturais do processo de implantação do futuro complexo industrial. Segundo Nicolato, desde a assinatura do protocolo de intenções, em 2007, a CSN, o governo estadual e a prefeitura têm trabalhado nos estudos para as primeiras etapas. O primeiro levantamento necessário foi o dos proprietários do terreno. A fase seguinte tinha como prioridade o levantamento ambiental para que fossem viabilizadas as licenças. Por último, a CSN, por recomendação da prefeitura, contratou o Instituto de Desenvolvimento Municipal (IDM) para que fossem projetadas as expectativas de crescimento da população e estabelecidos os limites do novo plano diretor. ¿Esses trabalhos terminaram agora. Entramos no processo de esclarecimento para a população¿, diz Nicolato.

Tem dois anos que estamos com isso aqui perdido, sem plantação. Disseram que iam desapropriar, aí o pessoal ficou com medo plantar e depois perder¿