Título: Falta de sol, cálcio e vitamina D
Autor: Neri, Márcia
Fonte: Correio Braziliense, 04/11/2009, Saúde, p. 19

À medida que a expectativa de vida dos brasileiros aumenta, crescem os casos de osteoporose. Embora atinja mais mulheres, a doença metabólica mais comum no mundo não é exclusivamente feminina

Francisca (e) levou um susto com o diagnóstico. Odete fraturou a coluna, os pés e as costelas

O aumento da expectativa de vida do brasileiro tem sido acompanhado por uma epidemia silenciosa, que pode ganhar maiores proporções nas próximas décadas. A vilã, conhecida como osteoporose, compromete a qualidade de vida de uma em cada três mulheres acima de 50 anos e contabiliza, atualmente, pelo menos 10 milhões de vítimas em todo o Brasil. Especialistas alertam que a pouca ingestão de cálcio e os baixos níveis de vitamina D (1)no sangue da população infantil indicam que as crianças de hoje são fortes candidatas a sofrerem do mal em um futuro próximo.

A osteoporose é a doença metabólica mais comum em todo o mundo. Ela afeta os ossos, deixando-os mais fracos e propensos a sofrerem fraturas. Não existem estudos epidemiológicos que comprovem o aumento da incidência no país, mas a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) não tem dúvidas: o número de vítimas do mal já configura um problema de saúde pública. A doença não é letal, mas as fraturas decorrentes do enfraquecimento ósseo podem levar o paciente à morte. As mais comuns são as de quadril, vértebras e fêmur (osso da coxa). Estudos sugerem que a primeira ruptura ocorre um ano depois do aparecimento da patologia, que é praticamente assintomática. Cerca de 200 mil pessoas morrem por ano no Brasil em decorrência dessas fraturas. ¿Menos de 10% das pessoas que quebram o fêmur, osso mais resistente do corpo humano, recebem diagnóstico e tratamento para a doença¿, revela a presidente do Departamento de Metabolismo Ósseo e Mineral da SBEM, Victória Borba.

Idade avançada, histórico familiar, alimentação pobre em cálcio, sedentarismo, tabagismo, alcoolismo e baixo índice de massa corporal são fatores de risco. A menopausa também está entre as causas mais comuns, pois a falta de estrogênio reduz a composição óssea. A reumatologista Ana Patrícia de Paula explica que o esqueleto, além de promover sustentação ao corpo, é fonte de cálcio para funções importantes, como batimentos cardíacos e força muscular. ¿É uma estrutura viva, que está em constante renovação. Sua destruição e reconstrução ocorre simultaneamente em diferentes partes do esqueleto¿, assegura.

Homens

A osteoporose é o desequilíbrio desse processo. A remodelação óssea não consegue acompanhar a absorção do cálcio pelo organismo, caso o elemento não tenha sido armazenado ao longo da vida. A médica ressalta que, apesar de mais comum entre as mulheres, a doença não é exclusivamente feminina. Os homens sofrem com o problema, mas em idade mais avançada e com um agravante: o mal geralmente vem acompanhado de outras patologias comuns em idosos. ¿As fraturas são mais graves entre os homens, o que faz com que a taxa de mortalidade decorrente dessas rupturas seja maior entre eles¿, observa Ana Patrícia.

As mulheres também são mais cuidadosas. Depois que descobrem a doença, passam a monitorá-la atentamente. É o caso da dona de casa Odete Chinchilla, 78 anos. Três décadas depois de ter recebido o diagnóstico pelas mãos de uma ginecologista, ela confessa ter sofrido várias fraturas. No entanto, conseguiu se recuperar de todas e faz questão de curtir a terceira idade ativamente, seguindo a dieta recomendada e exercitando-se dentro do possível. ¿Tinha pouco mais de 50 anos quando a osteoporose chegou em minha vida. A médica se assustou com a perda óssea avançada para a minha idade. A menopausa agravou a doença¿, conta. De lá para cá, Odete fraturou a coluna virando na cama, quebrou o joelho, os pés, as costelas e sofreu com as dores decorrentes dos acidentes. ¿Tive infância saudável, mas sou muito clarinha e baixinha, e isso é um fator de risco, sem contar que sempre tomei muito refrigerante, o que também colaborou¿, confessa.

Para Francisca Maria da Silva, 57 anos, a osteoporose foi uma surpresa. Voluntária do Centro do Idoso do Hospital Universitário de Brasília (HUB), ela nem chegou a desconfiar da doença. ¿Uma médica suspeitou da minha postura curvada e pediu um exame, que não deixou dúvidas. Desde então, tomo medicamentos para repor o cálcio e tenho mais cuidado com a alimentação. Bebo muito leite, como queijo e folhas verdes e tento prevenir as quedas. Tem dado certo. Graças a Deus, não tive nenhuma fratura ainda¿, comemora.

Prevenção

A osteoporose é comprovada por meio da densitometria óssea, exame de imagem que faz uma varredura na coluna e no fêmur do paciente. Abaixo dos 40 anos, a doença é rara e quando ocorre é preciso investigar causas secundárias do enfraquecimento ósseo. Indivíduos asmáticos, com doença celíaca, usuários crônicos de corticosteroides estão mais expostos ao mal. As drogas disponíveis não curam, mas previnem as fraturas. O próprio cálcio, vitamina D, medicamentos formadores de massa óssea ou antirreabsortivos, que não deixam o osso se desgastar e promovem a absorção de cálcio, fazem parte do arsenal.

A prevenção, porém, é a melhor arma. Ela é possível com boa alimentação, composta de leite e seus derivados, e exposição solar saudável. ¿As crianças de hoje não comem bem, não brincam, não recebem os benefícios dos raios solares. Em Curitiba, uma pesquisa detectou que 40% delas em idade escolar têm insuficiência de vitamina D, o que nos leva a acreditar que a epidemia de osteoporose pode ganhar força nas próximas décadas¿, lamenta a representante da SBEN, Victória Borba.

1 - Necessidade de sol A vitamina D promove a absorção de cálcio, essencial para o desenvolvimento de ossos e dentes, e para coração, cérebro e pâncreas. A substância não é encontrada pronta na maioria dos alimentos, mas sintetizada a partir de uma proteína existente no organismo ¿ o calciferol ¿, com ajuda da exposição solar. Funciona assim: ao ingerirmos a pró-vitamina D dos alimentos, precisamos da radiação ultravioleta para transformá-la em vitamina D. Por isso, pessoas com restrições de exposição solar precisam reforçar as fontes dessa vitamina no cardápio.