Título: Não adiantou nada
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 10/11/2009, Economia, p. 11

Após três semanas da criação da taxa de 2% sobre a entrada de moeda estrangeira no Brasil, dólar volta a valer R$ 1,70

O efeito do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), de 2%, incidente sobre o fluxo de capitais estrangeiros para o Brasil durou apenas três semanas. Depois de reagir negativamente à punição baixada pelo Ministério da Fazenda e subir, o dólar registrou ontem mais um dia de perdas ante o real e voltou ao patamar vigente antes do anúncio do tributo, em 19 de outubro. A moeda americana encerrou a segunda-feira cotada a R$ 1,700 para venda, com baixa de 1,05% no dia e de 27,15% no ano. Na avaliação dos especialistas, a tendência de queda é visível. Diante do volume de dinheiro que está entrando no país, nada impede que o dólar desabe para R$ 1,55 nas próximas semanas.

Todas as justificativas para o expressivo tombo do dólar vieram do exterior. A primeira delas foi a decisão do Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos Estados Unidos, de manter, por um tempo prolongado, a taxa básica de juros local próxima de zero. A segunda foi o anúncio do G-20, o grupo das 20 nações mais ricas do mundo, de que os incentivos fiscais e monetários (juros em baixa), dados aos países depois da crise para estimular a retomada da atividade, serão preservados até que a economia global dê sinais concretos de reativação.

Juntos, esses comunicados deram um novo gás aos investidores. Eles têm tomando dinheiro emprestado nos EUA a taxas nulas e direcionado os recursos para a compra de ativos em economias emergentes ¿ em especial, o Brasil ¿, que vem registrando crescimento econômico acelerado. Tecnicamente, essas operações são conhecidas como carry-trade. Ao comprarem ações, por exemplo, eles ganham duas vezes: com a diferença entre a alta dos papéis nas bolsas de valores e as taxas de juros americanas e com a queda do dólar frente às moedas dos países nos quais investiram.

¿É essa combinação, de taxa de juros zero e expansão do crédito, que leva à desvalorização do dólar, a mãe de todos os carry-trades¿, vem dizendo o economista Nouriel Roubini, um dos primeiros a prever o estouro da bolha imobiliária americana.

Recorde

Pelas contas do economista Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central, com as últimas quedas do dólar, a valorização do real (descontada a inflação do período) em relação à moeda americana já é a maior desde a adoção do regime de câmbio flutuante, em janeiro de 1999. Em artigo enviado a seus clientes, Pastore ressaltou que a decisão do governo de cobrar IOF dos investimentos estrangeiros em bolsa de valores e em renda fixa foi ineficaz. Para ele, melhor seria o governo reduzir os gastos públicos. Dessa forma, ajudaria a eliminar o excesso de crescimento da economia e a segurar a inflação para que o Banco Central (BC) não seja obrigado a elevar as taxas de juros, o que atrairia mais capitais para o país. Pastore também recomenda a ampliação das reservas internacionais brasileiras.

Na avaliação do economista Clodoir Vieira, da Corretora Souza Barros, a perspectiva era de que, em um ambiente sem o fluxo excessivo de capitais para o Brasil, o dólar chegasse ao fim do ano em R$ 1,70. ¿Mas o processo foi antecipado. Por isso, as apostas de novas baixas para a moeda. Já há empresas trabalhando com o dólar a R$ 1,55 nas próximas semanas¿, afirmou.

Para Mário Paiva, analista da Corretora BGC Liquidez, mesmo com fluxos menores de dólares para o país, a moeda americana continuará fraca aqui e em todo o mundo. ¿É grande a expectativa de que o governo baixará outras medidas para conter a forte valorização do real, que afeta as exportações. Não descartamos novo aumento do IOF¿, disse. Ainda ontem, comentava-se no mercado que o BC poderia exigir mais capital dos bancos que operam com dólares.

O lado bom da queda do dólar, lembrou Paiva, é que a inflação está em baixa. ¿Os preços em dólar das commodities (mercadorias com cotação internacional) estão em alta, mas, quando convertidos em reais, registram baixa¿, assinalou. Essa foi a razão de o Índice Geral de Preços ¿ Disponibilidade Interna (IGP-DI) de outubro ter registrado queda de 0,04%, ante expectativa do mercado de alta de 0,11%. Em compensação, complementou Clodoir Vieira, o aumento das importações, facilitadas pelo dólar barato, poderá levar o Brasil a registrar deficit comercial em 2010 ou um número muito próximo de zero.

E EU COM ISSO Para quem pretende viajar ao exterior neste fim de ano, a queda na cotação do dólar sinaliza férias sem problemas cambiais. Somente uma nova decisão do governo para tentar conter a valorização do real traria preocupação aos turistas. A queda do dólar, entretanto, preocupa os brasileiros que trabalham nas empresas exportadoras instaladas no Brasil. Com o real mais caro, os produtos fabricados aqui têm um mercado menor no exterior e, por isso, os empregos delas correm risco.

É grande a expectativa de que o governo baixará outras medidas para conter a forte valorização do real, que afeta as exportações. Não descartamos novo aumento do IOF¿

Mário Paiva, analista da Corretora BGC Liquidez

Bovespa e Nova York sobem 2%

O principal índice do mercado acionário brasileiro fechou em alta ontem, no maior nível em três semanas, ajudado pelo quadro externo favorável com avanço de ações nas maiores praças financeiras e valorização de commodities. O Ibovespa subiu 2,71 por cento, a 66.214 pontos, o maior patamar desde o último 19 de outubro. O volume financeiro da bolsa somou 6,2 bilhões de reais. Em Wall Street, o índice Dow Jones teve alta de 2,03%, o que descontraiu o ambiente na Bolsa de Nova York.

Em uma sessão fraca de indicadores, investidores repercutiram a promessa do G-20, após discussões na cidade escocesa de St. Andrews durante o fim de semana, de que os estímulos à economia serão mantidos até que a retomada econômica esteja consolidada. Mesmo antecipada por participantes do encontro, a decisão do grupo reavivou o apetite por risco no ambiente global, o que respingou na bolsa brasileira, tanto pelo impacto via commodities (preços mais altos para o minério da Vale e o petróleo da Petrobras, por exemplo), como pela perspectiva otimista para a economia doméstica, o que torna os papéis de empresas locais atrativos.

O petróleo avançou mais de 2% no mercado norte-americano, o que amparou uma alta de 2,86% nas ações preferenciais da Petrobras, que fecharam a R$ 37,08. No mesmo sentido, ganhos em metais ajudaram na elevação de 3,34% das preferenciais da Vale.

As blue chips (ações mais negociadas) responderam pela maior participação no ganho do Ibovespa, mas o desempenho do setor siderúrgico também deu suporte ao índice. Entre as siderúrgicas, a Gerdau registrou alta de 3,05%, a Usiminas elevou-se 3,31%,e a CSN teve acréscimo de 0,5%. O motivo foi a produção de veículos ¿ fabricados com aço ¿ em outubro (leia mais na página 13). No noticiário corporativo, a Braskem anunciou que se associou ao grupo mexicano Idesa para a construção de um polo petroquímico no México. O investimento previsto é de US$ 2,5 bilhões ao longo de cinco anos. A ação da petroquímica subiu 1,28%.