Título: Sobram nós por desatar
Autor: Rothenurg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 11/11/2009, Política, p. 6

Reunião de Lula com governadores melhora clima na comissão que cria o sistema de partilha, mas não amansa plenário

Então, as empresas vão receber em petróleo, além dos custos da produção, todos os royalties? Isso não está certo¿ Miro Teixeira (PDT-RJ)

A boa vontade dos políticos em torno do acordo do presidente Lula com os governadores do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e do Espírito Santo, Paulo Hartung, em benefício dos estados produtores de petróleo, ajuda a melhorar o clima na comissão especial. Mas não acaba com os problemas para aprovar sem sobressaltos o sistema de partilha da produção do pré-sal. Na própria base, há insatisfações com o texto. O deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), por exemplo, não concorda com o fato de as empresas contratadas para explorar o pré-sal receberem petróleo para compensar os royalties (1)que devem pagar à União, estados e municípios. ¿Quero saber se o cidadão comum, quando paga uma série de impostos, pode receber esse mesmo valor em compras no supermercado. Se não vale para os cidadãos, por que tem que valer para as petroleiras?¿, pergunta o pedetista.

Miro se refere à emenda número 8, incluída pelo deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), relator do projeto que institui o sistema de partilha da produção. A emenda diz que as empresas contratadas para explorar o pré-sal serão compensadas em petróleo pelo valor que tiverem de desembolsar no pagamento de royalties. Hoje, pelo sistema de concessão, as empresas arcam com os custos dos royalties, mas, em compensação, ficam com todo o petróleo para vender. Pelo sistema de partilha, a produção é dividida com a União.

A justificativa para essa emenda, conforme explicou o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é a de que o governo havia se esquecido de definir com ficariam os pagamentos dos royalties dentro de um sistema em que a produção não fica toda para as empresas. Miro não se convenceu. ¿Então, as empresas vão receber em petróleo, além dos custos da produção, todos os royalties? Isso não está certo¿, diz ele, pronto para a briga hoje, quando o texto estiver em votação na comissão especial.

O presidente Lula sabe que o projeto é polêmico. Por isso, aceitou ceder aos estados produtores, que dominam a comissão especial e não aceitam perder receitas. O governador Sérgio Cabral, por exemplo, chegou a Brasília pedindo 35% dos royalties, como forma de compensar os recursos decorrentes de participação especial, que deixam de ser pagos com a instituição do sistema de partilha.

Negociação

O governo chegou a avisar os líderes no início da tarde que a ideia era dar aos estados o que estava previsto no relatório de Henrique Eduardo Alves: 22,5% aos estados produtores. Depois, no entanto, o Executivo topou fechar o percentual em 25%. Ao longo da negociação, pediu que fosse reduzido para 18%, de forma a garantir os 3% que iriam para o fundo de mudanças climáticas e não tirar tanto nem da Marinha e nem do Ministério da Ciência e Tecnologia. A Marinha, por exemplo, exerce papel-chave no sentido de garantir os interesses do Brasil na área de exploração do pré-sal.

Se o presidente da Comissão Especial, Arlindo Chinaglia, conseguir concluir a votação ainda hoje, a proposta segue para o plenário da Câmara, onde os estados não produtores farão nova investida para mudar o projeto de Henrique Alves. Eles pretendem conquistar parte dos recursos que os estados produtores estão recebendo da área já licitada do pré-sal. O presidente Lula, no entanto fará um apelo à base para que vote tudo como está e não haja mais mudanças na proposta do relator. O governo quer guardar fôlego para a briga do Senado, onde a maioria governista não é tão folgada quanto na Câmara.

1 - Alta rentabilidade Segundo os dados disponíveis no site da Agência Nacional de Petróleo e Gás Natural (ANP), o Rio de Janeiro recebeu no ano passado uma receita de participação especial que representa o dobro do valor arrecadado com os royalties. Foram R$ 4,4 bilhões a título de participação especial. A receita de royalties foi de R$ 2,2 bilhões.

Oposição abandona comissão

Ricardo Brito

Em protesto contra a blindagem da base aliada, a oposição abandonou ontem a CPI da Petrobras, criada há quatro meses para investigar suspeitas de irregularidades na estatal. A decisão ocorreu momentos antes do depoimento do presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli, à comissão parlamentar. Os governistas não se intimidaram com a reação dos oposicionistas. Logo depois, o relator da CPI e líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), anunciou que vai apresentar ainda este mês um relatório final de conclusão dos trabalhos sem ouvir novos depoimentos.

¿Dentro de, no máximo, dez dias vou apresentar esse relatório a ser submetido aos membros da CPI¿, afirmou Gabrielli. Jucá rebateu as críticas da oposição que, ao anunciar a debandada da CPI, disse que os governistas impediram a aprovação de requerimentos essenciais às investigações. ¿Todos os pontos pedidos no requerimento de criação da CPI foram tocados exaustivamente¿, disse.

A oposição apresenta hoje ao Ministério Público Federal uma série de 18 representações sobre irregularidades na estatal que, na avaliação deles, não foram investigadas pela comissão. ¿Não vamos compactuar com essa farsa¿, afirmou o senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

O número 18 Quantidade de representações não investigadas, segundo a oposição

Entenda o que muda

COMO É HOJE

O contrato é de concessão. A empresa que arremata um bloco para exploração de petróleo paga royalties, bônus de assinatura dos contratos (o valor, pago à União, varia de contrato para contrato e houve casos de R$ 2 bilhões só em bônus) e participação especial (sobre o lucro). Todo o petróleo extraído é da empresa exploradora. A alíquota do royalty é igual a 10% da produção, distribuída da seguinte forma:

22,5% aos estados produtores 22,5% aos municípios produtores 7,5% aos municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo e gás 7,5% para constituição de fundo especial a ser distribuído entre estados e municípios 15% para o Ministério da Marinha 25% para o Ministério da Ciência e Tecnologia, para financiar programas de amparo à pesquisa científica aplicados à indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis

COMO FICA

Para a exploração do pré-sal, o governo deseja instituir o sistema de partilha. O petróleo extraído passa a ser dividido entre a União e a empresa exploradora. A Petrobras terá participação de, no mínimo, 30% em todos os campos. A empresa interessada calcula seus custos, fica com uma parte do petróleo para cobrir as despesas e divide o restante da produção, ou seja, o lucro, com a União. Acaba a participação especial, uma vez que o petróleo é dividido entre a exploradora e o poder público. O bônus de assinatura e os roylaites são mantidos, mas de forma diferente.

O bônus de assinatura dos contratos que as empresas pagam à União deve ter valor fixado pelo governo. Desse total, 10% irão para estados e municípios. Os royalties que as empresas têm que pagar em dinheiro sobem de 10% para 15% da produção. As empresas vão receber em petróleo o que desembolsarem para pagar os royalties, que, antes da reunião de Lula com os governadores, estavam distribuídos da seguinte forma:

18% aos estados produtores (Na reunião com Lula, governadores conseguiram subir para 25%, tirando da parte da União) 6% aos municípios produtores 2% aos municípios afetados pelas operações de embarque e desembarque de petróleo e gás natural 22% para o fundo especial a ser distribuído entre estados e DF 22% para o fundo especial a ser distribuído entre os municípios 12% para o Ministério da Marinha 15% para o Ministério da Ciência e Tecnologia para financiar programas de amparo à pesquisa científica aplicado à indústria do petróleo, do gás natural e dos biocombustíveis 3% para a constituição de fundo especial a ser criado por lei, para o desenvolvimento de ações e programas para a mitigação e adaptação às mudanças climáticas