Título: Trovoada de desculpas
Autor: Pereira, Daniel; Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 12/11/2009, Política, p. 2

Governo nega falta de investimentos e atribui blecaute a efeitos de raios, chuvas e ventos fortes na região de Itaberá, em São Paulo

Imagem ampliada dos sinais de descargas elétricas na rede de distribuição em Itaberá no interior de SP

Os fenômenos atmosféricos foram os grandes vilões apontados pelo governo como responsáveis pelo apagão que ocorreu na noite da última terça-feira e que deixou 18 estados brasileiros no escuro. Quase 24 horas depois da ocorrência do blecaute e das várias reuniões durante todo o dia, que ocuparam a agenda do Ministério de Minas e Energia, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), do Operador Nacional do Sistema (ONS) e de executivos de Furnas e Itaipu, a versão apresentada foi exatamente a mesma da primeira declaração do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, sobre o assunto. A diferença foi o maior detalhamento das causas, que foram acertadas após a reunião do Comitê de Monitoramento do Sistema Elétrico (CMSE).

¿O que aconteceu foram descargas atmosféricas, ventos e chuvas muito fortes na região de Itaberá, em São Paulo. Houve uma concentração destes fenômenos atmosféricos ali, o que provocou curto-circuito nos três circuitos que levam (energia) a Itaberá, que vem de Itaipu (destinada a outras regiões)¿, afirmou Edison Lobão. O sistema de proteção, explicou o ministro, atuou abrindo os circuitos, ou seja, desligando as linhas de transmissão, para que não houvesse um acidente ainda maior. ¿Foi isso o que aconteceu. O próprio IMP, o Instituto de Meteorologia, nos deu conta de que, de fato, houve uma concentração muito grande desses fenômenos ali na região¿, garantiu. Lobão salientou que o Brasil tem a maior incidência desses fenômenos atmosféricos em âmbito mundial e que a região onde aconteceu o incidente é a mais afetada por descargas elétricas no país. ¿Então, o que aconteceu, segundo todas essas avaliações, e de exames no próprio local, foi exatamente isso.¿

Questionado se não houve falha no Sistema Interligado Nacional (SIN), o ministro fez questão de esclarecer que o que houve foi um acidente. Lobão ressaltou que o sistema elétrico brasileiro é bom e um dos mais modernos em termos mundiais. Tanto que opera com três circuitos para, em caso de problema em um ou dois, haver outro para segurar a rede. Porém, as descargas elétricas no local teriam sido tão fortes que nem o circuito triplo teria capacidade. ¿O sistema suporta mais impacto do que no passado recente. Em 1999, saiu 70% (de energia) do sistema; em 2002, 60% da carga também caiu. Não há nada mais avançado no mundo do que fizemos no Brasil. Tanto que os Estados Unidos estão desejosos de fazer interligação (no país) nos moldes do Brasil¿, observou. E acrescentou que o problema foi resolvido rapidamente.

Lobão citou exemplos de ocorrências em outros países, como a pane em 2003 nos Estados Unidos e no leste do Canadá, quando 50 milhões de pessoas ficaram sem energia elétrica durante quatro dias. No mesmo ano, a Itália ficou no escuro por 24 horas e, em 1987, a região metropolitana de Tóquio só conseguiu reverter o quadro de fornecimento de energia três horas e meia depois. Questionado se a falha não seria consequência da falta de investimentos no setor, o ministro afirmou que, desde 2003, os investimentos em linhas de transmissão aumentaram 30%, somando R$ 22 bilhões e outros R$ 8 bilhões em transformadores. As construções das usinas do Rio Madeira, Belo Monte, São Luiz e Estreito fortalecerão o sistema e reduzirão os riscos de novos apagões, ponderou o ministro.

Não há nada mais avançado no mundo do que fizemos no Brasil. Tanto que os Estados Unidos estão desejosos de fazer a interligação (no país) nos moldes do Brasil¿

Edison Lobão, ministro de Minas e Energia

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Perdas com pane serão ressarcidas

O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, garantiu que todo consumidor brasileiro que tem contrato com concessionárias de energia terá direito a indenização em caso de prejuízos, como queima de equipamentos eletrônicos em decorrência do apagão. A Resolução nº 373 da Aneel, atualizada recentemente, fixou normas mais rígidas para o tratamento das reclamações dos consumidores que chegam às empresas.

A declaração de Hubner ocorreu exatamente uma semana depois de o diretor descartar qualquer possibilidade de obrigar as concessionárias de energia elétrica a devolver os valores que foram cobrados indevidamente nos reajustes das contas de luz nos últimos anos, estimados em R$ 10 bilhões. O argumento usado pelas empresas como empecilho para restituir as pessoas é de que o montante teria sido alocado para investimentos no setor. Porém, percebe-se que o sistema operante não resguarda o consumidor totalmente.

Se o sistema interligado não tivesse atuado de forma preventiva, os danos provocados poderiam ser maiores. É o que garantiu Eduardo Barata, gerente de operações do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). ¿Não houve erro. Os sistemas que foram montados atuaram corretamente. Separaram o sistema Sul, Norte e Nordeste, evitando que houvesse uma propagação desse defeito para o restante do país¿, ressaltou. (KM)