Título: Contra o diabetes,educação
Autor: Pacheco, Silvia
Fonte: Correio Braziliense, 14/11/2009, Saúde, p. 35

Pior do que o desconhecimento sobre uma doença são os mitos ou as falsas crenças sobre ela, que, muitas vezes, impedem a adesão ao tratamento correto e até a aceitação do problema. É o caso do diabetes, que, numa visão errônea, assombra as pessoas com o manto da incapacitação e da redução da expectativa de vida. O erro nisso tudo, segundo especialistas, está na falta de esclarecimento e de educação sobre como conviver com a doença. Isso leva tanto os pacientes quanto as pessoas sadias a uma falsa ideia de uma doença muito difícil de conviver. Diversas entidades médicas e governamentais buscam a educação como ferramenta no esclarecimento do diabetes e, principalmente, na sua prevenção. Para isso, desde 1991, 14 de novembro foi intitulado como o Dia Mundial do Diabetes, criado com o desafio de conscientizar pacientes, familiares, médicos, governos e sociedade civil sobre a doença e a melhor foma de enfrentá-la. Estatísticas da Federação Internacional do Diabetes (IDF, sigla em inglês) indica que há 250 milhões de diabéticos no mundo ¿ 12 milhões só no Brasil ¿, e que esse número pode chegar a 380 milhões nos próximos 15 anos, se nenhuma atitude eficiente for tomada. Além disso, estima-se que a metade das pessoas com a doença desconheça a própria condição. ¿O melhor que podemos fazer é disseminar conhecimentos básicos para que as pessoas possam identificar e evitar o aparecimento da doença¿, afirma Reginaldo Albuquerque, endocrinologista e membro da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). O diabetes é um distúrbio metabólico decorrente da falta de insulina e/ou da incapacidade dela de agir adequadamente. Os casos mais comuns são os dos tipos 1 e 2 (leia quadro). ¿Se o diabetes não for tratado adequadamente, leva à perda de visão e da função renal e causa duas vezes mais infartos, além de provocar amputação de membros¿, informa Albuquerque. Considerada uma doença silenciosa, ela precisa de atenção, tanto na prevenção quanto no tratamento. ¿Há casos em que o paciente não tem o conhecimento que desenvolveu a moléstia. E, em muitas situações, mesmo quando é informado, não tem o tratamento médico adequado e as orientações necessárias¿, destaca o endocrinologista Antônio Roberto Chacra, presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM-SP). Convivência Jane Dullius, doutora em educação em diabetes e coordenadora do Programa Doce Desafio, conhecido como Proafidi, que promove a educação em diabetes no Distrito Federal, trabalha com 120 diabéticos, e acredita que a doença seja estigmatizada como algo muito ruim já no consultório médico. Segundo ela, alguns diabéticos que fazem parte do programa relataram que os próprios médicos os amedrontam para que sigam o tratamento à risca. ¿Antigamente, o diabetes era uma doença que precisava ser temida, porque eram poucos os recursos para evitar ou minimizar as complicações. As coisas, porém, mudaram, e não podemos mais aceitar esse tipo de profissional que amedronta o paciente¿, sentencia. Hoje, o que diferencia uma boa aceitação e convivência com o diabetes de uma ruim são, além da evolução da medicina e da tecnologia, decisões e atitudes tomadas pelos pacientes relacionadas ao tratamento da doença. ¿Sem a educação em diabetes, os pacientes estão menos preparados para tomar decisões baseadas em informações e para fazer mudanças de comportamento destinadas a lidar com os aspectos psicossociais da doença. Viver com o diabetes não é o fim do mundo, é aprender a se cuidar e se adaptar às mudanças de forma positiva¿, defende Dullius, que convive com o diabetes há 38 anos. O músico e guitarrista da banda brasiliense Legião Urbana Dado Villa-Lobos, 44, descobriu que era diabético tipo 1 com 11 anos. Ele relata que, no começo, foi difícil aceitar a doença por não ter conhecimento de suas consequências nem do que ela significava. A reviravolta no estilo de vida veio de uma vez, e ele precisou do apoio da família para que conseguisse estabelecer as mudanças necessárias. ¿É uma responsabilidade muito grande para uma criança se adaptar a um outro ritmo de vida, com injeções e alimentação restrita. Minha família foi essencial para que eu me adaptasse àquela nova realidade¿, conta o músico. Disciplina Dado relata que a disciplina é fundamental para quem convive com o diabetes, e garante que, por conta dela, pode levar a vida com maior normalidade. ¿O diabetes fez com que eu me conhecesse melhor e ficasse mais atento às coisas que aconteciam comigo. A disciplina imposta acaba sendo saudável não só para se conviver com a doença como para levar uma vida com mais qualidade.¿ O tratamento de Dado acabou refletindo na família. Segundo ele, o fato de comer melhor e na quantidade certa, além da adoção da prática de exercícios, fez com que sua família adotasse o mesmo estilo. ¿Tenho um filho de 21 anos que se alimenta de forma equilibrada e saudável por conta da minha condição.¿ O músico ressalta a importância do diabético se informar sobre a doença, principalmente os adolescentes, que, em sua maioria, sentem vergonha em dizer que têm o problema. ¿Isso não pode ser escondido em momento algum. É importante dizer ao grupo com o qual a pessoa convive sua condição, para que saibam como agir caso você tenha uma complicação.¿ A paulistana Luciana Oncken, 35, convive com o diabetes tipo 2 há seis anos e não é diferente da maioria: revoltou-se quando descobriu que tinha a doença, e acreditou que não poderia levar uma vida normal. Com o tratamento e o acompanhamento médico, Luciana garante que hoje vive melhor que antes. Há quatro meses, ela deu à luz uma menina, depois de uma gravidez tranquila. ¿Com planejamento e disciplina, se consegue levar bem a gravidez, diferentemente do que muitas mulheres imaginam¿, afirma. Luciana também criou um blog, em que as pessoas trocam experiências e informações sobre a doença. ¿Tem muita gente angustiada por ter diabetes. O blog é uma ferramenta para compartilhar essa angústia¿, relata. A moça ressalta a importância de encarar a doença positivamente: ¿Por conta do diabetes, penso no que hoje pode afetar no futuro. Coisa que todos deveriam pensar, mas não dão o devido valor¿.