Título: Dúvida no BC
Autor: Nunes, Vicente; Pires, Luciano
Fonte: Correio Braziliense, 20/11/2009, Economia, p. 12

No sábado, ápice do terremoto provocado por revelações sobre a atuação do Banco Central na crise, Meirelles fez contatos políticos em Goiânia. Pesquisas para governador o apontam como candidato ideal para dar um choque de gestão no estado

O presidente do Banco do Central, Henrique Meirelles, vem difundindo ¿a grande probabilidade¿ de continuar à frente da instituição até o fim do governo Lula. Mas a sua proximidade com a política está cada vez maior. No último sábado, apesar de todo o terremoto causado pelo diretor-demitido de Política Monetária, Mário Torós, que revelou ao jornal Valor Econômico detalhes sigilosos sobre a atuação do BC no auge da crise mundial, Meirelles não se furtou de ir a Goiânia para encontros com aliados políticos. E, claro, destacar toda a sua preocupação com questões sociais.

A agenda do presidente do BC começou cedo. Acompanhado do arcebispo metropolitano, Dom Washington Cruz, visitou as instalações da UCG TV, canal de televisão vinculado à Pontifícia Universidade Católica (PUC). Seguindo a tradição dos políticos, parou o carro ¿ cercado por seguranças ¿ uma rua antes da entrada principal da universidade e, no trajeto, cumprimentou populares. De lá, seguiu para a Santa Casa local, onde almoçou, em companhia do arcebispo, do deputado estadual Thiago Peixoto e do presidente da Câmara de Vereadores, Francisco Valle Júnior, ambos do PMDB, partido ao qual se filiou em setembro. Por meio de sua assessoria, o presidente do BC disse que o motivo da visita não foi político. Ele apenas teria atendido a um pedido do arcebispo, amigo da família.

Mas, ainda na cartilha dos políticos, Meirelles se comprometeu a empenhar-se junto ao governo federal para a liberação de emendas ao Orçamento da União feitas pela bancada goiana do Congresso Nacional. Os recursos seriam destinados à Santa Casa para tocar projetos de reforma, compra de equipamentos e investimentos na ampliação do hospital. Ele também prometeu ajudar no saneamento financeiro da instituição, atolada em cerca de R$ 20 milhões de dívidas com o sistema bancário. Confiante, o vereador Francisco Júnior ressaltou, logo depois da visita, que o apoio do presidente do BC à Santa Casa é vital. ¿Existem várias ações em que o Henrique Meirelles pode ajudar¿, afirmou.

Quem conversou com Meirelles nesse dia teve a certeza de que ele continua mais firme do que nunca no seu propósito de disputar o governo de Goiás em 2010. ¿Por mais que ele diga que recebeu apelos do presidente Lula para ficar no BC até o fim do ano que vem, está articulando pesado para garantir o apoio do PMDB à sua candidatura ao governo goiano¿, disse ao Correio um dos mais próximos aliados do presidente do BC. ¿Ele, inclusive, tem falado constantemente com o prefeito de Goiânia, Íris Rezende, outro potencial candidato ao governo. Nunca os dois estiveram tão próximos¿, acrescentou.

No sábado anterior ao périplo de Meirelles por Goiânia, em 7 de novembro, durante um encontro regional do PMDB, Íris disse que esteve pessoalmente com o presidente do BC e lhe deu um ultimato: que decida se será ou não candidato ao governo do estado até o fim de dezembro. Segundo o prefeito, se Meirelles não cumprir esse prazo, o partido lançará outro nome, muito provavelmente, o dele. ¿Sou homem de decisões rápidas¿, frisou Íris. Meirelles preferiu, no entanto, não transformar o ultimato em polêmica. Durante a visita à Santa Casa de Goiânia, ressaltou que ¿conversa frequentemente com Íris e cada decisão ou declaração é feita em comum acordo¿.

Na ocasião, Meirelles voltou a insistir no discurso de que tem um compromisso com o presidente Lula para ficar no BC até o início de abril de 2010. Só lá definirá seu futuro político. ¿Cuido para que a minha credibilidade não seja afetada¿ declarou, lembrando que, antes de se filiar ao PMDB, deixou claro o seu papel à frente do banco. ¿Ainda que ele mantenha esse discurso, não esconde o entusiasmo com a possibilidade de governar Goiás¿, assinalou um dos caciques peemedebistas goianos.

Termômetro

Esse entusiasmo, por sinal, cresceu diante de pesquisas qualitativas que os aliados encaminharam a Meirelles. Os números mostram que a maioria dos goianos querem no comando do estado ¿uma pessoa com capacidade para dar um choque de gestão na administração pública¿. Os levantamentos apontam que a melhor pessoa para conduzir esse processo é o presidente do BC. ¿Esses dados deixaram Meirelles ainda mais assanhado para entrar na disputa¿, enfatizou um amigo dele. ¿Também há pesquisas de intenções de votos que mostram Meirelles com forte potencial de crescimento na preferência do eleitorado¿, completou esse amigo. A pesquisa mais recente indica que, enfrentando Íris e o senador Marconi Perillo, do PSDB, ambos empatados com 35% das intenções de votos, o presidente do BC tem 9%. Sem Íris, ele sobe para 20%.

O PMDB goiano comemora os números. ¿Temos dois dos melhores artilheiros do momento¿, resumiu Adib Elias, presidente do partido em Goiás, referindo-se a Íris e Meirelles. Segundo Elias, a legenda vê com entusiasmo o crescimento de Meirelles na preferência do eleitorado(1). ¿Se as pesquisas demonstrarem que a candidatura de Meirelles tem sustentação, não será colocado nenhum obstáculo por parte do partido¿, observou Elias.

A decisão de adiar ao máximo o anúncio da candidatura decorre da necessidade de Meirelles de ter a certeza da vitória. Para isso, ele precisa de um apoio muito maior que o da dupla PMDB-PT. Mas não será fácil, pois o PP, partido do atual governador, Alcides Rodrigues, que havia oferecido ao presidente do BC a candidatura ao governo goiano, rebelou-se. Seus líderes locais estão se articulando com o PR, o DEM e o PSB para lançar um candidato de terceira via(2). O xadrez político intriga até os políticos mais experientes do estado. ¿Pesquisa é pesquisa, só que em Goiás quem sai na frente sempre perde. Pelo menos foi assim nos últimos anos. Meirelles está correndo por fora e correndo bastante¿, explicou um observador com bom trânsito no PMDB.

1 - Cenário indefinido Os estrategistas que apoiam o presidente do BC na corrida pelo governo goiano apostam no elevado índice de indecisos para fazer decolar a candidatura de Meirelles. Em Goiás, 70% dos eleitores ainda não definiram em quem votar. Os partidos começam a se movimentar para gastar com campanhas publicitárias. O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, no entanto, já avisou que não vai ¿despejar nenhum caminhão de dinheiro¿ em sua campanha.

2 - Jogo embaralhado A chapa alternativa será encabeçada pelo deputado Sandro Mabel (PR) ou pelo deputado Ronaldo Caiado (DEM). Os adversários do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, acreditam que esse movimento prejudica os planos dele de se tornar governador. Seria por esse motivo que Meirelles passou a alardear que o presidente Lula o quer no BC até o fim de 2010. Se não emplacar em Goiás, ao menos fica com a fama de ser imprescindível à estabilidade econômica.

SONDAGENS AQUECIDAS A corrida eleitoral em Goiás fez movimentar como nunca o mercado de pesquisas de opinião. Os institutos mais requisitados no estado fazem levantamentos quase que semanalmente. Os dados têm sido encomendados por partidos, jornais e organizações que representam setores importantes da economia local. A guerra de informação acabou antecipando a disputa pelo governo do estado, o que incomoda uma parte dos marqueteiros políticos, que não conseguem traduzir todos os cenários revelados pelas pesquisas e ficam impedidos de traçar metas de curto prazo para as campanhas. (VN e LP)