Título: Impasse dá vida longa aos altos salários
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 22/11/2009, Política, p. 2

Enquanto o TCU aponta Planejamento como responsável por Ecriação de banco de dados, ministério diz que não pode interferir nos outros poderes

Marsico, do Ministério Público no TCU, defende criação de banco de dados nos três poderes

O Ministério Público do Tribunal de Contas da União (TCU) sustenta que a criação de um sistema integrado de dados com o registros da remuneração de todos os servidores públicos, além da regulamentação da aplicação do teto constitucional, são tarefas do Planejamento. Mas não há consenso sobre essa responsabilidade. O Ministério do Planejamento afirmou ao Correio que não tem acesso à folha salarial dos demais poderes da União ou das outras esferas de poder. Diante do impasse, fica a evidência de que os marajás do serviço público terão vida longa.

O Planejamento afirma que a sua competência estaria limitada aos servidores civis (ativos, aposentados e pensionistas) do Poder Executivo, que recebem salário a partir do Sistema Integrado de Administração de Pessoal (Siape). ¿Com relação a esses servidores, é aplicada a lei do abate-teto (Lei 8852/94). Entretanto, por força de decisões judiciais, cerca de 100 servidores do Executivo ainda recebem acima do teto do Supremo Tribunal Federal¿, diz nota do ministério.

A Constituição federal, em seu artigo 37, inciso XI, determina que ninguém no serviço público pode receber mais do que os ministros do STF. O Ministério Público do TCU considera que essa norma deve ser aplicada de imediato. Lembra, ainda, que a Lei 10.887/2004 determina a criação de um sistema integrado de dados relativos às remunerações dos servidores ativos e inativos da União, de estados e de municípios. ¿De fato, já que a quantidade de servidores e de empregados públicos no Brasil atinge a casa dos milhões, o custo de verificar e restringir remuneração indevida sem o referido sistema seria sobremodo elevado, embora factível¿, argumenta o procurador do Ministério Público Marinus Marsico.

Eficácia limitada O procurador lembra que o TCU decidiu, recentemente, que, quando a acumulação de cargos, funções e empregos públicos ocorrer em diferentes esferas de governo, poderes ou fontes remuneratórias, o artigo 37 da Constituição federal ¿tem eficácia limitada¿. A aplicação do teto remuneratório dependeria de normatização infraconstitucional. Marsico acrescenta que o regimento interno do Ministério do Planejamento ¿não deixa dúvida¿ quanto ao dever desse órgão de implementar a criação do sistema de dados integrado previsto na Lei 10.887, além de normatizar o que for necessário para que a aplicação da norma constitucional.

O artigo 34 do regimento interno do Planejamento diz que compete à Secretaria de Recursos Humanos, entre outras tarefas, propor e implementar ações de relacionamento com órgãos e entidades da administração federal, de outros poderes e esferas de governo, e com os servidores, nas questões relativas à administração de recursos humanos.

O Ministério do Planejamento diz que não é competência exclusiva sua encaminhar proposta de projeto de lei sobre o teto salarial em outros poderes ou em outras esferas de poder, para evitar que servidores acumulem vencimentos de várias fontes e assim firam o teto. ¿Tal regulamentação, se se julgar necessária, para atingir os demais poderes, deverá ser feita por projeto de lei por iniciativa de qualquer poder ou instituição.¿

Mas o governo federal acrescenta que, por iniciativa própria, por meio da Secretaria de Gestão do Ministério do Planejamento, em um trabalho conjunto com o Conselho Estadual dos Secretários de Administração, vem trabalhando para fazer o cruzamento de dados das folhas de pessoal entre governo federal e estadual para evitar o acúmulo de salário de servidores como duplicidade de vínculo e recebimento de aposentadoria por invalidez com outro vínculo empregatício .

O primeiro governo estadual a assinar com o Ministério do Planejamento foi o Rio de Janeiro. Hoje, 13 estados já aderiram ao programa e os demais deverão assinar em breve. ¿Este é o primeiro passo para formar o cadastro único de recursos humanos da administração pública brasileira, que deverá estar finalizado até julho de 2010¿, diz a nota.

Memória Decisão polêmica

Decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) tomada no fim de setembro mantém o teto constitucional como regra geral, mas diz que a sua implementação, no caso de servidores de esferas de governo ou poderes distintos, depende da regulamentação da Constituição e da implantação de um sistema nacional de dados sobre remunerações de ativos e inativos, com informações da União, dos estados e dos municípios. A decisão causou polêmica porque permite o acúmulo de aposentadorias do serviço público com salários de parlamentares além do limite do teto constitucional definido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ¿ R$ 25,7 mil. Poderão ser beneficiados pela medida os presidentes da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), e do Senado, José Sarney (PMDB-MA).

Temer é aposentado como procurador do Estado de São Paulo, enquanto Sarney tem dupla aposentadoria: como ex-governador e funcionário do Tribunal de Justiça do Maranhão. O presidente do TCU, Ubiratan Aguiar, e o relator do processo que define a aplicação do teto constitucional, Augusto Nardes, são aposentados como ex-parlamentares, mas já sofrem o abate dos vencimentos a partir do limite de R$ 25,7 mil, porque as duas fontes pagadores (Câmara e TCU) integram o mesmo Poder e estão na mesma esfera de governo.

A decisão foi tomada pelo tribunal em resposta a uma consulta feita pela Câmara. O TCU havia decidido, inicialmente, que deveria ser respeitado como limite para remuneração, em caso de acúmulo com aposentadoria, o salário dos ministros do STF. O diretor-geral da Câmara, Sérgio Sampaio, e o presidente da Comissão de Turismo, Afonso Hamm (PP-RS), apresentaram um recurso em julho deste ano contestando a decisão. O ministro Augusto Nardes emitiu um parecer, aprovado pelo plenário, que cria a regra transitória.