Título: Alves cede ao apelo de não produtores
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 27/11/2009, Política, p. 3

Sob pressão, relator do projeto de partilha da extração de petróleo muda discurso e mira a fatia de recursos prevista para a União. Ideia é arrefecer ânimos dos estados distantes das reservas do pré-sal

Depois de passar duas semanas insistindo que não mexeria na distribuição dos royalties das áreas já licitadas do pré-sal, o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), cedeu aos apelos dos estados não produtores de petróleo. ¿Sou parlamentar e tenho que fazer o que a maioria da Casa deseja¿, afirmou o líder, responsável pelo relatório do projeto que institui o sistema de partilha da produção de petróleo para áreas não licitadas e fixa a redistribuição dos royalties para estados e municípios.

A intenção do líder é tirar um naco da participação especial e dos royalties a que a União tem direito e, com esses recursos, atender os estados. ¿As pessoas não vivem na União. Vivem nos estados e municípios. Antonio Palocci (PT-SP) pegou esses recursos e jogou no fundo social. Não sou Palocci, mas tenho que atender os estados¿, completou, dando a senha de um novo embate, desta vez, envolvendo o PT.

Há duas semanas, Hernique Alves tinha dito ao governador de Pernambuco, Eduardo Campos, e ao do Ceará, Cid Gomes, que não iria mexer na área já licitada porque o sistema de exploração é diferente. Esses blocos já distribuídos serão explorados pelo sistema de concessão ¿ aquele em que a empresa paga bônus de assinatura, royalties, participação especial e impostos e fica com todo o petróleo que conseguir extrair.

Em 2008, a participação especial da produção de petróleo (tributo cobrado sobre a renda líquida de um campo) foi de R$ 11, 7 bilhões. Desse valor, a União fica com 50%. O estado produtor, ou confrontante com a área marítima onde o petróleo é explorado, recebe 40% e os municípios, 10%.

Os royalties das áreas já licitadas serão distribuídos em sua maioria para a União e municípios produtores. No ano passado, foram R$ 10,9 bilhões. Do total, 64% ficam com os estados e municípios produtores. A União leva 28% e o restante é distribuídos entre estados e municípios não produtores de petróleo.

Bolo

Palocci é relator do projeto que cria o fundo social, a ser abastecido com os recursos arrecadados da venda do petróleo do pré-sal. Ele destinou todos os recursos que a União deve arrecadar das áreas já licitadas a esse fundo, que irá para educação, saúde, cultura, ciência e tecnologia. Agora, Henrique quer pegar uma parcela desse bolo e repartir entre os estados. ¿O sistema de partilha será votado primeiro, depois vamos discutir o fundo. Insisto: as pessoas não moram na União¿, diz.

Henrique Alves pretende deixar intacto o valor arrecadado pelo Rio de Janeiro. ¿Não vou mexer no Rio de Janeiro. A Casa quer distribuir os recursos e não fazer o Rio ficar sem receita¿, adianta. Como líder do PMDB, o relator não pretende provocar a ira de dois governadores importantes do seu partido ¿ Sérgio Cabral, do Rio, e Paulo Hartung, do Espírito Santo. Cabral, desde agosto de 2007, quando Henrique Alves anunciou que iria redistribuir os royalties das áreas não licitadas do pré-sal para atender todos os estados, repete que mexer nessa distribuição seria ¿assaltar¿ ou ¿roubar¿ o Rio.

Da primeira vez, quando tratava da distribuição das áreas não licitadas do pré-sal, o governador perdeu a batalha. Agora, sua vitória dependerá da engenharia do relator, que pretende usar a próxima semana para buscar essa fórmula de agradar a todos para votar o sistema de partilha em 9 de dezembro. A palavra final, no entanto, dependerá do presidente Lula.

A disposição de Henrique Alves ainda não arrefeceu o clima de disputa entre produtores e não produtores. O problema é que os demais estados não se mostram dispostos a deixar intacta a arrecadação dos estados produtores. ¿Isso é injusto. O pré-sal está a 300 quilômetros da costa. Não está no Rio de Janeiro e nem no Espírito Santo¿, alega o líder do PSB na Câmara, Rodrigo Rollemberg (DF).

E EU COM ISSO? A briga dos estados pelos recursos das áreas já licitadas do pré-sal faz sentido e pode repercutir em investimentos para o cidadão em curto prazo. Primeiro, o sistema é de concessão, ou seja, a União não precisa se preocupar em vender esse petróleo. É apenas arrecadar os recursos decorrentes dos impostos devidos e da participação especial. O petróleo das áreas não licitadas, diferentemente, será dividido entre as companhias e a União, no chamado sistema de partilha. Só deve incrementar os cofres públicos daqui a oito ou 10 anos. Para as áreas já licitadas, começam a pingar royalties e participação especial em 2010/2011. Por isso, estados produtores e não produtores brigam tanto por essa fatia do bolo.

O número R$ 10,9 bilhões Quanto renderam os royalties das áreas já licitadas no ano passado