Título: Ação para derrubar o Pdot
Autor: Mader, Helena
Fonte: Correio Braziliense, 04/12/2009, Cidades, p. 28

Ministério Público do DF questiona a origem e as emendas apresentadas pelos distritais durante a votação do projeto. Suposto pagamento de propina à base aliada é investigado pelo STJ

A regularização dos condomínios do Grande Colorado ficará inviabilizada, caso a Justiça acate o pedido do Ministério Público e considere inválida a aprovação do Plano Diretor de Ordenamento Territorial

Elio Rizzo/Esp. CB/D.A Press - 28/10/09 Bandarra entrou ontem com a ação direta de inconstitucionalidade

Depois da denúncia de que empresários da cidade foram beneficiados pela aprovação do Plano Diretor de Ordenamento Territorial, o procurador-geral de Justiça do Distrito Federal, Leonardo Bandarra, entrou ontem com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a lei que criou o Pdot. A Adin pede a derrubada de todos os artigos e anexos da Lei Complementar nº 803, sancionada em abril deste ano. Se a Justiça acatar os argumentos do Ministério Público, o governo não poderá mais criar novos setores habitacionais, como o Catetinho. A regularização de condomínios construídos em áreas antes classificadas como rurais também ficará inviabilizada. É o caso de Vicente Pires, onde vivem mais de 60 mil pessoas, e dos parcelamentos do Grande Colorado, em Sobradinho.

De acordo com o inquérito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), parte do dinheiro arrecadado no suposto esquema de propina do GDF seria usado para pagar deputados da base do governo à época da aprovação do Pdot. Em depoimento à PF, o ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa afirmou que o dinheiro teria sido arrecadado por empresas que se beneficiariam com a nova legislação. Ainda segundo Barbosa, o diretor das organizações Paulo Octávio, Marcelo Carvalho, estaria à frente da distribuição da suposta propina aos parlamentares. O advogado do empresário, Antônio Carlos de Almeida Castro, repudiou as acusações e afirmou em nota que os encontros entre Marcelo e Durval tinham ¿a finalidade única e exclusiva de tratar de assuntos de natureza privada e profissional¿.

Revisão O Plano Diretor de Ordenamento Territorial é o principal instrumento para o planejamento urbano e para a organização da cidade. Ele definiu os novos eixos de crescimento do Distrito Federal e determinou os bairros(1) que serão criados nos próximos anos. A revisão do Pdot transformou áreas antes classificadas como rurais em zonas urbanas, o que poderia abrir novas possibilidades de investimento para empresários de vários setores.

O assessor de Controle de Constitucionalidade do Ministério Público do DF, Roberto Carlos Silva, afirma, no entanto, que a apresentação da Adin à Justiça não tem relações diretas com o inquérito da Polícia Federal. ¿As denúncias são apenas mais um elemento que colocam a lisura do processo sob suspeita. Mas a ação já estava sendo elaborada há algum tempo e foi motivada, principalmente, por uma série de ilegalidades que constam no projeto aprovado¿, afirma Silva.

O promotor explica que, apesar de a lei ter sido sancionada em abril deste ano, o processo de tramitação da legislação só foi concluído no fim de outubro. Isso porque, ao sancionar o texto, o governador José Roberto Arruda vetou alguns dispositivos, o assunto voltou para a Câmara Legislativa e, ao final, os distritais derrubaram parte dos vetos do Executivo. ¿Todo esse trâmite só acabou há pouco mais de um mês. Foi o tempo de nossos promotores analisarem a documentação completa para a preparação da Adin¿, justifica o assessor de Controle de Constitucionalidade do MP.

Origem O primeiro questionamento do MP é a origem do projeto. Qualquer proposta que trate sobre o uso de terras, como é o caso do Pdot, deve ser obrigatoriamente elaborada pelo poder Executivo. O GDF preparou o texto do Plano Diretor, mas o que saiu aprovado da Câmara Legislativa foi um substitutivo elaborado pelos deputados distritais Eurides Brito, Benício Tavares e Batista das Cooperativas ¿ relatores do Pdot. ¿Da simples leitura do projeto original, que continha apenas 285 artigos, e da redação final da lei impugnada, que contém 330 artigos, é possível concluir que o projeto original foi integralmente desvirtuado, tendo sido alterada a sua essência¿, cita um dos trechos da Adin.

A ação destaca que várias dessas modificações propostas pelos deputados foram feitas isoladamente, sem nenhuma conexão com estudos urbanísticos globais. Nas palavras de Leonardo Bandarra e Roberto Carlos Silva, o novo Pdot faz da Lei Orgânica uma ¿tábula rasa¿. Na ação apresentada à Justiça, eles citam o artigo 52 da lei que diz que a administração dos bens do Distrito Federal cabe exclusivamente ao Poder Executivo.

Outro ponto questionado pelo Ministério Público do Distrito Federal é a criação de novos setores sem a devida previsão de despesas. Segundo o MP, o surgimento de um novo bairro requer altíssimos investimentos em infraestrutura e esses gastos não foram previstos nem sequer estimados pelo governo antes do envio do projeto à Câmara Legislativa.

Destinação Entre as emendas apresentadas pelos deputados distritais e aprovadas em plenário estão também alguns assuntos que não deveriam constar no Plano Diretor de Ordenamento Territorial, como definições relativas à destinação dos terrenos. De acordo com o MP, todos esses detalhes deveriam ser tratados posteriormente na Lei de Uso e Ocupação do Solo ¿ que está sendo elaborada atualmente pelo governo.

A Assessoria de Imprensa da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, responsável pela elaboração do Plano Diretor de Ordenamento Territorial, afirmou que a pasta ainda não foi notificada oficialmente sobre a Adin. Afirmou ainda que o caso será analisado com a Procuradoria Geral do DF, e que os técnicos prestarão todas as informações necessárias.

A sanção do Plano Diretor de Ordenamento Territorial, em abril, chegou a ser ameaçada por uma decisão judicial. Na véspera da data marcada para a cerimônia na qual Arruda sancionaria o texto, o Tribunal de Justiça do DF concedeu uma liminar, a pedido do MP, em que determinou a volta do processo à Câmara Legislativa. Mas o governador recorreu até ao Supremo Tribunal Federal e o ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, liberou a sanção da lei.

1 - Moradia O Plano Diretor de Ordenamento Territorial prevê a criação de 29 novas áreas habitacionais no Distrito Federal, com capacidade de abrigar até 500 mil pessoas. Entre elas estão o Setor Meireles, em Santa Maria, o Mangueiral, em São Sebastião, o Setor Catetinho e a QE 48 do Guará.

As denúncias são apenas mais um elemento que colocam a lisura do processo sob suspeita¿

Roberto Carlos Silva, assessor de Controle de Constitucionalidade do Ministério Público do DF

Adin contra o passe livre

Além de questionar o Pdot, o Ministério Público do DF também entrou ontem com uma Adin contra a chamada Lei do Passe Livre. A proposta, que garante o direito de os estudantes utilizarem os transportes públicos gratuitamente, foi aprovada pela Câmara Legislativa em junho deste ano. A lei não chegou a ser regulamentada e, por isso, a medida ainda não entrou em vigor.

A ação, assinada pelo procurador-geral de Justiça, Leonardo Bandarra, aponta vício de iniciativa. O argumento do Ministério Público é que o projeto foi ¿completamente desvirtuado¿ pelas emendas apresentadas pelos deputados distritais durante a tramitação. Os parlamentares aprovaram a ampliação do benefício(1), o que aumentou as despesas previstas inicialmente. ¿A Lei Orgânica do Distrito Federal, no artigo 72, proíbe qualquer aumento de despesa nos projetos de iniciativa exclusiva do Governador do Distrito Federal¿, diz a Adin.

O assessor de Controle de Constitucionalidade do MP, promotor Roberto Carlos Silva, explica que os artigos incluídos pelos parlamentares tornaram o texto inconstitucional. ¿O GDF mandou um projeto de lei com quatro artigos e a versão final aprovada tinha 11 artigos. Os deputados invadiram a competência do Executivo¿, explica.

Assim como o Pdot, a Lei do Passe Livre também é alvo de denúncias. Na última segunda-feira, o empresário Valmir Amaral invadiu a sala destinada à coletiva do então presidente da Câmara Legislativa, Leonardo Prudente, para denunciar um suposto esquema de corrupção. Segundo ele, empresários do setor de ônibus teriam pago propina a distritais para que eles ampliassem o benefício do passe livre. Assim, o subsídio pago às empresas subiria de R$ 4 milhões para R$ 8 milhões. (HM)

1 - Extensão Os distritais, interessados em ganhar politicamente diante dos eleitores jovens, aprovaram a extensão do direito ao passe livre para estudantes de todos os níveis: estagiários, alunos de pós-graduação e de pré-vestibulares. Os distritais também autorizaram a utilização dos sistemas de metrô, micro-ônibus e, futuramente, do VLT.

O que mudou

Algumas das inclusões feitas indevidamente pelos distritais no Pdot

Manutenção dos invasores do Parque Ezechias Heringer, no Guará;

Criação de um setor de oficinas no Setor Mangueiral;

Mudança da densidade demográfica da região às margens do Córrego Cana do Reino;

Fixação de uma área doPolo JK como zona urbana;

Criação de área para um aeródromo ao sul do DF;

Delimitação de áreas urbanas com imprecisão, sem indicações de perímetros;

Destinação de áreas na Fazenda Sucupira para cooperativas de produção;

Transformação do lote onde hoje funciona a sede da Novacap, às margens da Epia, em uma área passível de ocupação residencial, com prédios de até 26m.