Título: Só um acordão salva orçamento
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 09/12/2009, Política, p. 3

Prazos da comissão mista para votar relatórios estouram e base do governo já sinaliza conclusão do texto em 2010

Magela: ¿Se os relatórios forem votados até sexta-feira, entrego o meu parecer em três dias¿

Com R$ 32 bilhões em créditos orçamentários que podem ser empenhados ainda este ano e inscritos em restos a pagar para o ano que vem, a base do governo começa a fazer ¿corpo mole¿ para votar o Orçamento da União para 2010. Os prazos previstos pela Comissão Mista de Orçamento estouraram. Dos 10 relatórios setoriais que deveriam ser votados até hoje, apenas três foram apresentados. Isso significa que só mesmo um grande acordo entre os lideres partidários para aprovar o texto até 22 de dezembro, último dia de funcionamento do Congresso Nacional este ano.

A falta de aprovação do Orçamento não é tão ruim assim para o Poder Executivo. A atual legislação permite que o poder público utilize por mês 1/12 do valor global (descontados os investimentos) para financiamento dos programas em curso. E, assim, pode ir executando os chamados restos a pagar, sem problemas, onde estão grande parte das emendas de deputados e senadores ao orçamento de 2009 que ainda não foram liberadas.

Esta semana, por exemplo, os deputados e senadores se mobilizam para votar em tempo recorde, em sessões noturnas conjuntas das duas Casas, parte dos 58 créditos orçamentários que tramitam no Parlamento, em especial aqueles apelidados de ¿jumbão¿ ¿ são projetos que, como os aviões, levam muitos recursos para diversos lugares, no caso ministérios.

Um desses jumbos prevê R$ 1,6 bilhão distribuído pelos ministérios das Cidades, do Turismo, dos Esportes e Fundo Nacional de Saúde, áreas de interesse das emendas parlamentares. Nos bastidores, há quem diga que o governo, se conseguir aprovar todos os créditos, dispensará o Orçamento, que ficará para ser votado apenas em fevereiro. Nessa hipótese, avaliam os políticos e técnicos em conversas reservadas, o governo liberará em 2010 apenas os recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e desconhecerá as emendas dos deputados e senadores, com a desculpa de que não haverá tempo hábil para liberação antes do período eleitoral.

Em Brasília O relator-geral da proposta orçamentária de 2010, deputado Geraldo Magela (PT-DF), no entanto, garante que irá trabalhar para que isso não aconteça. ¿Por mim, se os relatórios setoriais forem votados até sexta-feira, entrego o meu parecer em três dias para votarmos no plenário do Congresso na semana que vem¿, promete. Ocorre que, para isso, os integrantes da Comissão Mista de Orçamento terão que ficar em Brasília nos próximos finais de semana. E, até ontem, ninguém se mostrava disposto a isso, dados os compromissos assumidos nas bases eleitorais. ¿Orçamento é por acordo, nem precisa quorum¿, completa o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN).

A não aprovação do Orçamento representará R$ 44 bilhões que o governo terá inscrito sem poder gastar. Esse é o valor total dos investimentos previstos com recursos da União. Mas deixar de liberar esse total não é inédito na República. Uma análise histórica das liberações de investimentos desde 2006 indica que a liberação dos restos a pagar vem crescendo enquanto o Orçamento anual fica represado. Em 2006, foram executados R$ 6,5 bilhões de investimentos da lei anual e R$ 8,5 bilhões de restos a pagar. Em 2008, foram liberados R$ 8,9 bilhões dos R$ 29,7 bilhões previstos de investimentos e R$ 17, 1 bilhões em restos a pagar. Este ano, já saíram R$ 12 bilhões em restos a pagar. E, pelo visto, os R$ 37 bilhões em investimentos previstos para este ano terão o mesmo destino de ficar para 2010.

Análise da notícia Votação a toque de caixa

Essa não é a primeira vez em que o Orçamento da União corre o risco de ficar para o ano seguinte e nem a estreia dos deputados e senadores em tentar votar o projeto a toque de caixa. Esse comportamento é recorrente. E, quanto mais os congressistas votam o orçamento de forma atabalhoada e apressada, mais reforçam o argumento do Poder Executivo contra o Orçamento impositivo, ou seja, uma lei que deve ser cumprida à risca, do jeito que sai do Congresso.

Nos Estados Unidos, o Orçamento é considerado a lei mais importante. Fica meses em discussão. No Brasil, os congressistas fingem que são os responsáveis pela destinação dos recursos e os ministros fazem de conta que liberaram o que foi solicitado. Na verdade, o grosso do Orçamento fica mesmo nas mãos do Executivo, que sempre privilegia a base política. Por isso, votar agora ou em 2010, para muitos, tanto faz. Basta ver que, para votar o texto, ficam poucos em Brasília. Quem estiver por aqui no Natal e no Ano Novo verá que esse sistema não mudou. (DR)