Título: BC esboça aumento da Selic
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 10/12/2009, Política, p. 7

Embora o Copom tenha mantido a taxa de juros em 8,75%, texto do comunicado é visto como sinal de mudança a partir de abril

Meirelles possivelmente sairá do BC para concorrer a um cargo pelo PMDB

O Banco Central deu ontem os primeiros sinais de que pode ser obrigado a aumentar a taxa básica de juros (Selic) em 2010, ano de eleições presidenciais, para manter a inflação dentro das metas fixadas pelo governo (4,5%, podendo oscilar dois pontos para cima ou para baixo). O recado veio por meio de mudanças sutis no comunicado emitido logo depois da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), na qual a Selic foi mantida em 8,75% ao ano. A expectativa da maioria dos analistas é de que os juros subirão a partir de abril, provavelmente com Henrique Meirelles fora da presidência do BC, caso ele decida concorrer a um cargo público pelo PMDB goiano. A elevação deve ficar entre 1,5 e dois pontos percentuais (10,25% e 10,75%).

Com a palavra ¿remanescente¿, o BC indicou que há riscos de pressões inflacionárias com o esgotamento da ociosidade no parque industrial e no mercado de trabalho. Já a expressão ¿neste momento¿ apontou que, como as expectativas de inflação ainda estão abaixo do centro da meta, não há por que aumentar a Selic agora ou mesmo em janeiro e março. A partir do segundo trimestre de 2010, no entanto, quando se terá um quadro mais claro da atividade econômica, talvez seja preciso ajustar a taxa básica para manter as projeções inflacionárias sob controle.

¿Ainda não há motivos para o BC elevar os juros, mas quanto antes a Selic subir, menor será a necessidade de aumento. Se deixar para o segundo semestre, a alta poderá ser de até quatro pontos¿, disse Otávio Vaz, gestor de Renda Fixa da Global Equity. No seu entender, o fator determinante para o provável aumento da inflação ¿ e dos juros ¿ será a gastança promovida pelo governo para incrementar a economia no ano que vem, quando o presidente Lula espera fazer da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, a sua sucessora no Palácio do Planalto.

Segundo o economista-chefe da SLW Asset Management, Carlos Thadeu Filho, logo pela manhã, antes do início da reunião do Copom, os analistas que preveem o aumento da Selic em 2010 tiveram motivos para reforçar as apostas. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de novembro, de 0,41%, mostrou impactos do forte crescimento econômico sobre a inflação. ¿Vimos isso nos bens duráveis (móveis, mais precisamente) e na alimentação fora de casa¿, destacou. Para ele, porém, é preciso esperar mais para avaliar o IPCA, pois a taxa pode estar contaminada por fatores pontuais, comuns ao aquecimento do consumo no fim de ano.

Ruídos Na opinião de Flávio Serrano, economista do Banco BES Investimento, tudo indica que o IPCA ficará em torno de 0,4% ao mês entre dezembro e fevereiro, índice que, anualizado, indica inflação de 5%. ¿Teremos um período poluído, no qual haverá muito ruído¿, assinalou. ¿Por isso, pode ser que o BC antecipe o aumento dos juros para não perder o controle das expectativas inflacionárias¿, frisou. Ele destacou ainda que, agora, as atenções se voltarão para a ata da reunião de ontem, que será liberada na quinta-feira da próxima semana.

Para Elson Teles, nada indica que o ritmo acelerado de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, que será divulgado hoje ¿ as estimativas apontam para taxa entre 1,9% e 2,1% ante os três meses anteriores ¿, se manterá ao longo de 2010. Sendo assim, o BC terá tempo para avaliar até que ponto será necessário antecipar o processo de aumento dos juros. O comunicado pós-Copom de ontem deixou as portas abertas. ¿Levando em conta, por um lado, a flexibilização da política monetária implementada desde janeiro, e, por outro, a margem de ociosidade remanescente dos fatores produtivos, entre outros fatores, o Comitê avalia, neste momento, que esse patamar de taxa básica de juros (8,75% ao ano) é consistente com um cenário inflacionário benigno, contribuindo para assegurar a manutenção da inflação na trajetória de metas ao longo do horizonte relevante e para a recuperação não inflacionária da atividade econômica.¿

Queixas de empresários

Com a decisão do Copom de manter, pela terceira vez consecutiva, a taxa básica (Selic) em 8,75% ao ano, o Brasil voltou para a vice-liderança do ranking dos maiores juros reais (que descontam a inflação) do mundo. Pelas contas do economista Jason Vieira, da Consultoria UPtrend, o país passou a ostentar juros reais de 4,2%, atrás somente da China, com 5,8%. Na média dos 40 países analisados pela empresa, a taxa média está em 0,7%.

Esse foi um dos principais motivos para a queixa do empresariado em relação ao BC. Para o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Armando Monteiro Neto, a manutenção da Selic foi inadequada. ¿A inflação sob controle e a restrição do crédito bancário justificam juros mais reduzidos¿, afirmou. Segundo o presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, com as expectativas de inflação abaixo do centro da meta até a primeira metade de 2011, há espaço para novas quedas da Selic. ¿É um absurdo o Brasil voltar a ocupar a segunda colocação no ranking das maiores taxas de juros reais do mundo¿, disse.

No comércio, a decepção também foi grande. ¿O ano termina com a Selic em 8,75%. Ou seja, nada muda na política conservadora do BC¿, frisou o presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP), Abram Szajman. Para o presidente da Força Sindical, deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), a estabilidade da Selic foi ¿um erro estratégico¿, pois asfixiará a produção, inibindo a abertura de novos postos de trabalho. (VN)