Título: Quebra de decoro contra oito deputados distritais
Autor: Tahan, Lilian; Lima, Daniela
Fonte: Correio Braziliense, 01/12/2009, Cidades, p. 29

Câmara abre processo contra parlamentares citados nas denúncias de pagamento de propina. Presidente da Casa reconhece caixa dois

Leonardo Prudente tenta se explicar: segundo ele, dinheiro escondido no paletó e na meia era doação de campanha não contabilizada

Folha.com.br/Reprodução de internet-29/11/09 Leonardo Prudente

Numa tentativa desesperada de reagir diante da avalanche de denúncias que recaem sobre os deputados distritais, a Mesa Diretora da Câmara Legislativa decidiu abrir processo para apurar a quebra de decoro parlamentar. Os oito deputados citados, incluindo o próprio presidente da casa, Leonardo Prudente (DEM), e outros dois suplentes vão ser alvo de representação que pode levar à perda de mandato. Todos serão notificados hoje e terão 15 dias para apresentar defesa à Comissão de Ética, presidida pelo deputado Bispo Renato (PR), que até agora não é alvo de denúncias.

Apesar de pressionado por colegas a se afastar da presidência, Prudente afirmou ontem que não deixará o cargo. O que torna a atuação da Mesa Diretora, na qual faz parte, no mínimo amarrada. O vice-presidente da Câmara, deputado Cabo Patrício (PT), no entanto, garante que Prudente ficará fora das decisões sobre o assunto. Foi decidido que estará vedada a presença dele nas reuniões que tratarão da quebra de decoro.

Ficará a cargo de Cabo Patrício (PT) conduzir o processo. ¿As representações já estão ficando prontas para que o mais rápido possível os deputados envolvidos sejam notificados¿, disse Patrício. ¿Vamos distribuir hoje cópias do inquérito aos 24 deputados distritais¿, completou. O vice-presidente da Câmara defende que o recesso de fim de ano seja suspenso, para não interromper o processo de apuração. ¿Minha proposta é que a Lei Orçamentária Anual seja votada apenas no dia 2 de fevereiro. Assim, não vamos interromper o trabalho até lá¿, sustenta.

Durante uma hora e quarenta minutos de reunião, os cinco membros de mesa diretora tentaram convencer Prudente a se afastar da presidência. Estratégia que foi rejeitada pelo próprio e também por seus assessores. Prudente aguardava ainda a posição do governador Arruda. A maior preocupação do DEM era deixar a vaga para um petista. Na avaliação de assessores, com o afastamento de Prudente, Cabo Patrício assumiria a presidência e poderia abrir CPIs contra o governo.

Chantagem Prudente, que aparece em vídeo gravado por Durval Barbosa recebendo maços de dinheiro e os escondendo até nas meias, só conseguiu permanecer por cinco minutos na entrevista coletiva que ele mesmo convocou, na tarde de ontem. Alvejado por perguntas, foi breve. Sem conseguir disfarçar a tensão, admitiu ter recebido o dinheiro de Durval, a fonte das denúncias. As cenas foram gravadas durante a campanha eleitoral de 2006. ¿Estou afirmando que recebi. Quero informar que eu fui vítima de chantagem. Me foi oferecida ajuda financeira em dinheiro para a campanha política em 2006. Coloquei o dinheiro nas minhas vestimentas em função da minha segurança. Eu não uso pasta¿, disse, não revelando o nome da pessoa que o estaria chantageando.

O deputado não soube dizer quanto dinheiro foi entregue a ele. ¿Essa doação não foi contabilizada¿, declarou. Indagado sobre o crime eleitoral que supostamente teria cometido à época por aceitar doação em dinheiro vivo, o distrital afirmou que caberá à Justiça decidir o que é crime ou não. E negou a possibilidade de deixar o cargo. ¿A gestão da Casa não esta sendo questionada. Não há motivo para afastamento¿, sustentou. Prudente disse ainda que concordou com a decisão da Mesa Diretora, a qual participou, de abrir processo contra os deputados envolvidos, incluindo ele próprio.

Entre os membros da mesa diretora que participaram da reunião estava o deputado Milton Barbosa (PSDB), irmão do autor das denúncias. Ex-secretário de assuntos institucionais do governador Arruda, Durval gravou a partilha de dinheiro. Milton evitou a imprensa. Para os colegas deputados, afirmou que não sabia de nada e que há dias não falava com o irmão.

Amanhã, às 14h, a liderança do PT promete protocolar na mesa diretora o pedido de abertura de processo por crime de responsabilidade contra o governador José Roberto Arruda devido às denúncias de que ele teria recebido e orientado o repasse de dinheiro recolhido irregularmente de empresas.

Outros caminhos Deputados distritais do DEM que não aparecem nas acusações estão apreensivos sobre que caminho tomar. O secretário de Habitação, Paulo Roriz, aguarda a posição oficial do partido para decidir se voltará à Câmara Legislativa. Chegou ontem a redigir a carta de exoneração do presidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional (Codhab), José Naves, que aparece entre os acusados. Mas não levou adiante a medida por depender de posição do governador Arruda.

A deputada Eliana Pedrosa (DEM), também secretária de governo, não se manifestou. O deputado distrital Rogério Ulysses, vice-presidente regional do PSB, é citado em conversas, mas não aparece em vídeos. Ele defendeu que seu partido apure o caso, mas garantiu não temer denúncias. Ontem, o PSB abriu processo de expulsão contra ele. Joe Valle, presidente da Emater, que também é do PSB, está deixando o cargo no GDF hoje.

Estou afirmando que recebi. Me foi oferecida ajuda financeira em dinheiro para a campanha política em 2006. Coloquei o dinheiro nas minhas vestimentas em função da minha segurança. Eu não uso pasta¿

Leonardo Prudente (DEM), presidente da Câmara Legislativa

O número 15 dias Prazo que os deputados processados por quebra de decoro terão para apresentar sua defesa à Comissão de Ética da Câmara Legislativa

Os investigados

A Câmara Legislativa é representada por 24 deputados. Destes, oito estão sendo investigados. Dois suplentes também são suspeitos de participar do susposto esquema de corrupção. Confira quem são:

Deputados Leonardo Prudente (DEM), presidente da Câmara Legislativa Rogério Ulysses (PSB), vice-presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Legislativa Benício Tavares (PMDB), ex-presidente da Câmara Legislativa Benedito Domingos (PP), ouvidor da Câmara Legislativa Júnior Brunelli (PSC), corregedor da Câmara Legislativa Eurides Brito (PMDB), presidente da Comissão de Constituição e Justiça e vice-presidente da Comissão de Desenvolvimento Econômico Sustentável, Ciência, Tecnologia, Turismo e Meio Ambiente Rôney Nemer (PMDB), integrante das Comissões de Constituição e Justiça e de Meio Ambiente e Turismo

Licenciados Aylton Gomes (PMN), atual administrador de Planaltina

Suplentes Pedro do Ovo (PRP), suplente de Ayton Gomes Berinaldo Pontes (PP), suplente de Benedito Domingos

Empresário denuncia outro suposto esquema

Luísa Medeiros

Evandro Matheus/Esp. CB/D.A Press Valmir Amaral: ¿Tem corrupção forte dentro da Câmara¿

Enquanto os jornalistas aguardavam o início da entrevista coletiva do presidente da Câmara Legislativa, Leonardo Prudente, o ex-senador e empresário do ramo de transporte Valmir Amaral denunciou à imprensa mais um suposto esquema de corrupção envolvendo parlamentares distritais. Ele acusou os deputados da Casa ¿ citando os nomes de Eurides Brito e Leonardo Prudente ¿ de receberem R$ 1 milhão para alterar o texto da Lei nº 1.245/09, a lei do Passe Livre. Com isso, o subsídio mensal pago pelo governo às empresas de ônibus passaria de R$ 4 milhões para R$ 8 milhões. O ex-senador afirmou ainda que os políticos receberam mais R$ 600 mil para derrubar os vetos do governador José Roberto Arruda às emendas parlamentares. A lei foi aprovada em 30 de junho deste ano.

Aparentemente transtornado, Amaral dizia aos berros na sala de reuniões da presidência, ocupada apenas por jornalistas, que existe um esquema de corrupção dentro da Câmara Legislativa. ¿Tem corrupção forte dentro da Câmara. Eu sou homem para falar na cara e vim aqui para fazer isso. É por isso que ele (Leonardo Prudente) ainda não apareceu até agora¿, gritou, referindo-se ao fato de a coletiva do presidente ter começado com atraso de 1h40min.

Ele afirmou que empresários do setor, como Wagner Canhedo Filho e Victor Foresti, e um presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Público do DF, que não revelou o nome, teriam repassado o dinheiro aos distritais, no semestre passado, em troca de emendas que ampliariam a aplicação do benefício da gratuidade no transporte público. Além de atender os estudantes da rede pública de ensino, os portadores de necessidades especiais também seriam contemplados com a alteração.

De acordo com o ex-senador, representantes do sindicato da categoria foram à Câmara conversar com os deputados sobre as mudanças que deveriam ser feitas no texto da lei. ¿Foi pedido R$ 1 milhão para incluir no texto o transporte dos paraplégicos¿, afirmou. Ele disse que sua empresa de ônibus, que faz parte do Grupo Amaral, foi escalada para pagar R$ 170 mil aos políticos. ¿Eu não dei o dinheiro. Minha parte era R$ 170 mil e eu não dei.¿ Segundo Amaral, um presidente do sindicato entregou o dinheiro para Eurides Brito e Leonardo Prudente, entre outros políticos que não identificou.

Apesar do pronunciamento enfático Valmir Amaral não apresentou provas que confirmassem as denúncias feitas por ele. O Correio tentou entrar em contato com a assessoria de imprensa do Sindicato das Empresas de Transporte, mas não teve retorno até o fechamento da edição.