Título: Zelaya articula saída do país
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 11/12/2009, Mundo, p. 20

Presidente deposto aceita deixar a embaixada brasileira, mas recusa status de asilado político

A poucas semanas de seu mandato expirar, o presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, começa a arquitetar uma maneira ¿digna¿ de deixar a embaixada do Brasil em Tegucigalpa. Uma tentativa de abrigar-se no México foi frustrada na madrugada de ontem pelo presidente de fato, Roberto Micheletti. ¿Acordei pensando que Zelaya estava no México, mas a questão se deteve por exigências absurdas do governo golpista¿, criticou o chanceler brasileiro, Celso Amorim, no programa de rádio Bom dia, ministro, da Empresa Brasileira de Comunicação.

O chanceler do governo interino, Carlos López Contreras, alegou problemas na formalização do pedido para justificar a negativa de salvo-conduto a Zelaya. ¿Se o México quiser dar asilo político, estaremos encantados de concedê-lo, mas esse pedido tem que se ajustar à Convenção de Caracas. O México apenas pede salvo-conduto, mas não detalha como vai receber o Zelaya, nem em que qualidade¿.

O presidente deposto queria instalar-se no México na condição de ¿hóspede ilustre¿, mas o governo de fato hondurenho condicionou sua saída ao status de ¿asilado político¿. ¿Em resumo, eles tiveram outro fracasso ao querer fazer com que eu renunciasse a meu cargo¿, disse Zelaya. Os aviões oferecidos pelo México para levar o presidente deposto e família tiveram de aterrissar em El Salvador.

Uma fonte da chancelaria hondurenha revelou ao Correio que não interessa ao governo de Micheletti que Zelaya deixe o país com a imunidade de presidente da República. O fracasso na negociação para a saída do presidente afastado também desiludiu os funcionários hondurenhos. ¿Foi como um bolo que se desfez: estava no forno, crescendo, e de repente encruou¿, comparou a fonte diplomática.

Lições Para o chanceler brasileiro, a tentativa de fazer com que Zelaya assinasse um documento pedindo asilo político foi uma ¿forma de humilhação¿. ¿É uma intransigência. Não é assim que se faz diplomacia e política, mas querer ensinar diplomacia e política a golpistas é muito difícil¿, desabafou. Segundo Amorim, o governo brasileiro acreditou que houvesse uma negociação em andamento entre o governo interino de Honduras e as autoridades mexicanas. ¿O próprio México deve ter ficado surpreso. Um governo que não tem legitimidade age sempre de maneira ilegítima¿, criticou, referindo-se uma vez mais a Micheletti.

Enquanto isso, Zelaya continuará na embaixada do Brasil, onde se abriga desde 21 de setembro. ¿Vamos ver o que acontece, mas não vamos ficar enxotando o presidente Zelaya da nossa embaixada. Demos proteção a ele, proteção que foi reconhecida pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e pelo Conselho de Segurança da ONU¿, afirmou Amorim. Zelaya, por sua vez, reagiu com bom humor à possibilidade de permanecer mais tempo na representação diplomática. ¿Posso ficar aqui 10 anos, pois tenho meu violão¿, declarou, exibindo o instrumento.

O presidente deposto admitiu que busca um local neutro onde possa reunir-se com o presidente eleito, Porfirio Lobo, e ¿encontrar uma solução pacífica para a situação no país¿. No entanto, Zelaya quer uma solução que permita que ele continue suas atividades políticas no exterior. ¿Eu não vou aceitar qualquer asilo político¿, completou.

FHC critica

Na contramão do governo Lula, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso afirmou que os Estados Unidos e a América Latina têm de ¿se acomodar¿ à situação em Honduras. ¿Se os hondurenhos acreditam que seu governo é legítimo e essa crença não veio das Forças Armadas, mas do voto, temos que nos acomodar a essa situação¿, afirmou FHC durante uma palestra no centro de debate Diálogo Interamericano, em Washington. ¿Se insistirmos em negar os resultados das eleições, qual é a solução? Enviar um exército?¿, questionou. A posição do ex-presidente coincide com a de Washington, que condenou o golpe contra Zelaya e defendeu seu retorno ao poder, mas agora reconhece como legítima a eleição de Porfírio Lobo ¿ ao contrário do governo brasileiro.