Título: Dia de novas manifestações
Autor: Medeiros, Luísa; Calcagno, Luiz
Fonte: Correio Braziliense, 11/12/2009, Cidades, p. 27

Duas centenas de pessoas caminharam até o Congresso para pedir a saída do governador. Dessa vez, não houve confronto com a polícia

Um contigente de 150 policiais foi utilizado durante a movimentação de ontem: os militares observaram estudantes e trabalhadores de longe

Breno Fortes/CB/D.A Press Os manifestantes também passaram pela na Rodoviária do Plano Piloto

Em vez de confrontos, golpes de cassetete e gente ferida, um protesto sem incidentes. Um dia após a manifestação que terminou em batalha na Praça do Buriti, cerca de 200 pessoas fizeram ontem uma passeata do Conic até o gramado do Congresso Nacional gritando palavras de ordem contra a corrupção no Distrito Federal e a favor do impeachment do governador José Roberto Arruda. Em sua maioria vestidos de branco, eles estenderam uma imensa faixa da mesma cor em frente ao prédio do Legislativo, simbolizando a limpeza da cidade dos maus políticos, e se coordenaram para escrever ¿ com os próprios corpos ¿ a palavra ¿fora¿.

Os manifestantes saíram da Praça Zumbi dos Palmares, no Conic (Setor de Diversões Sul), por volta de 13h30, e seguiram até a Rodoviária do Plano Piloto. A professora Linda Paternostre, 38, esperava o ônibus para casa, mas resolveu aderir ao grupo e levou o filho Andrei, 15. ¿Quis trazê-lo para que ele entenda que somos nós que temos que fazer as coisas funcionarem¿. O adolescente gostou: ¿Não podemos engolir essas atitudes¿, referindo-se ao suposto esquema de propina envolvendo GDF e parlamentares.

A cor branca nas roupas e faixas ¿ ou o desgaste causado pela violência no dia anterior ¿ parece ter inspirado a paz entre Polícia Militar e manifestantes. Um contingente de 150 militares foi utilizado durante a movimentação. Na maior parte do tempo, os policiais observaram o ato de longe.

Houve apenas princípio de confusão, já no fim do evento, quando os manifestantes voltaram para a Rodoviária. Um arrudista provocou o grupo na plataforma superior do lado sul. A PM levou o homem para uma viatura e estudantes acalmaram os colegas mais exaltados. Os protestos terminaram por volta de 18h25, na escada da rodoviária.

Repercussão A repressão da PM contra os manifestantes que protestavam contra Arruda no Eixo Monumental, na última quarta-feira, causou indignação. Entidades civis e parlamentares recorreram à Justiça para pedir que a conduta da corporação seja investigada. A guerra travada entre 600 policiais e 1,5 mil manifestantes, que durou cerca de três horas, deixou pelo menos oito pessoas feridas. Três ficaram detidas por algumas horas. Os policiais usaram bombas de gás lacrimogêneo, spray de pimenta, balas de borracha, cassetetes, cavalos e cachorros para dispersar quem estava bloqueando as pistas da avenida.

A vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa, Erika Kokay (PT-DF), e o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Luiz Couto (PT-PB), entregaram ontem à procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Gilda Pereira Carvalho, uma representação contra a atuação da Polícia Militar. A procuradora vai analisar o pedido para indicar quais medidas judiciais devem ser tomadas.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em conjunto com a seccional do Distrito Federal, entrará com uma representação no Ministério Público do DF e Territórios ao MPDFT, pedindo que o órgão ajuíze ação criminal contra os PMs que se excederam durante o protesto. Para o presidente nacional da OAB, Cezar Britto, dois direitos constitucionais foram violados: o da manifestação e o da livre expressão. ¿O exagero de alguns não pode ser respondido com o grave erro da intimidação contra os cidadãos. Não podemos deixar a Constituição ser rasgada¿, disse. A OAB-DF ainda apelará à Justiça para reivindicar a cassação dos deputados citados no suposto esquema de corrupção e o impeachment do vice-governador Paulo Octávio.

O Diretório Central dos Estudantes (DCE) da Universidade de Brasília (UnB) também denunciará ao MPDFT a violência empregada pela PM. ¿Levaremos as pessoas agredidas, as testemunhas, os vídeos e as fotos para provar o que aconteceu. Deve ser aberto um processo contra o Estado¿, afirmou o coordenador-geral do DCE, Raul Cardoso.

A Corregedoria da Polícia Militar abriu um processo administrativo para investigar os procedimentos adotados na operação da última quarta-feira.

1- Campanha O protesto de ontem, no coração da cidade, atendeu ao chamado do movimento Brasília Limpa, que pretende livrar da corrupção a capital do país. Criada pela Ordem dos Advogados do Brasil seção Distrito Federal (OAB-DF), pela Associação Brasileira de Imprensa, pelo Sindicato dos Publicitários e pelo Sindicato das Agências de Publicidade do DF, a campanha convocava a população a se vestir de branco durante toda a quinta-feira.

Próximos passos da investigação

Edson Luiz

A Polícia Federal vai sugerir ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), a quebra dos sigilos bancário e fiscal de alguns dos envolvidos no suposto esquema de propina no Governo do Distrito Federal para averiguar as movimentações financeiras dos suspeitos e compará-las com os impostos declarados nos últimos anos. A medida deverá ser uma das sugestões que a PF vai colocar no relatório que será enviado na segunda-feira ao ministro do STJ, Fernando Gonçalves, responsável pelo inquérito judicial que resultou na Operação Caixa de Pandora, de 27 de novembro. Na ação, os policiais cumpriram 29 mandados de busca e apreensão, recolhendo R$ 700 mil. Em dois endereços vistoriados, havia cédulas com número de série sequenciado.

No relatório, a PF vai indicar ao ministro os caminhos que a investigação pode seguir, além de encaminhar a relação do material apreendido no último dia 27, detalhando os documentos que já passaram por exames no Instituto Nacional de Criminalística (INC). Até agora, o que os investigados sabem é que Durval Barbosa, ex-secretário de Relações Institucionais do GDF, foi o único distribuidor do dinheiro entre os citados.

Rastreamento Os R$ 700 mil apreendidos na operação foram encaminhados ao INC para novos exames, já que passaram por uma avaliação preliminar de analistas da área de inteligência da PF, que encontraram cédulas com números de séries em sequência. A PF deverá sugerir ao ministro um rastreamento para saber a origem dos recursos e todo o percurso feito até chegar aos dois locais onde foram encontrados.

A Polícia Federal ainda não conseguiu localizar R$ 480 mil também entregues por Durval a várias pessoas, durante a fase de monitoramento, quando o ex-secretário atuava como colaborador dos investigadores. O dinheiro tinha marcas de tinta invisível, mas não fazia parte do lote apreendido durante a ação policial. A localização dos notas não foi possível, segundo os policiais, por causa da abertura do sigilo do inquérito determinado pelo STJ logo que a Operação Caixa de Pandora foi desencadeada.

Corregedor da Câmara é escolhido

Samanta Sallum Carlos Silva/Esp. CB/D.A Press Raimundo Ribeiro (PSDB) recebeu 14 votos: sete distritais se abstiveram

Os distritais elegeram na sessão de ontem o corregedor que vai conduzir os processos de quebra de decoro parlamentar contra os oito deputados citados no inquérito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), suspeitos de receber dinheiro no suposto esquema de propina do GDF para a base aliada na Câmara Legislativa. Raimundo Ribeiro (PSDB) foi eleito com 14 votos, com sete abstenções ¿ exatamente de deputados que serão alvo dos processos.

Ribeiro é amigo pessoal do governador Arruda e foi secretário de Justiça. ¿Sou amigo de Arruda, mas tenho minha linha de atuação. E pressão sempre existe. Aceita-se ou não. E eu tenho condições para não aceitar¿, comentou. Ribeiro teve apoio dos deputados de oposição e explicou que é preciso calma. ¿Não dá para fazer julgamento por atacado. Cada parlamentar pode ter um situação específica. Vou ter de analisar caso a caso¿, disse. As representações contra os deputados Leonardo Prudente (DEM), Benício Tavares (PMDB), Júnior Brunelli (PSC), Rogério Ulysses (PSB), Rôney Nemer (PMDB), Eurides Brito (PMDB), Aylton Gomes (PR) e Benedito Domingos (PP) terão primeiro de ser lidas em plenário para depois seguirem para as mãos do corregedor.

Sem férias Os distritais costuram um acordo para não interromper os trabalhos na Câmara. Antes, discutia-se a possibilidade de antecipar o recesso parlamentar, o que repercutiu mal na opinião pública. Agora, os deputados falam em autoconvocação. Diante do desgaste da Casa, os deputados já entendem que é preciso colocar para funcionar a CPI, por exemplo. Os deputados pretendem votar a Lei Orçamentária e depois, em vez de entrarem em recesso para as festas de fim de ano, se convocarem. Um sessão extraordinária já foi marcada para a próxima segunda-feira. Serão votados o IPTU, o IPVA, a Taxa de Limpeza Pública e a nova lei do passe livre, pois a primeira foi questionada pelo Mistério Público.

Ficou definido também que um grupo de distritais fará um pente-fino no projeto de lei de orçamento para 2010. A medida foi tomada depois da divulgação de uma conversa do ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa de que haveria um suposto esquema de benefício a empresas que pagariam propina a integrantes do GDF. ¿Já entreguei cópia do projeto aos deputados para que examinem as propostas orçamentárias¿, disse o relator do Orçamento, deputado Cristiano Araújo (PTB), presidente da Comissão de Orçamento Finanças (Ceof). ¿Diante das denúncias de que o projeto pode estar atendendo interesses suspeitos, vou também participar desse pente-fino para depois não dizerem que saí da liderança do governo deixando o orçamento contaminado¿, declarou a deputada Eurides Britto (PMDB). Eurides deve deixar a liderança no próximo dia 15. No inquérito do STJ, há uma vídeo da deputada recebendo dinheiro de Durval Barbosa durante a campanha de 2006.