Título: Venezuela recebe o aval do Senado
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 16/12/2009, Mundo, p. 19

Entrada do país no bloco é aprovada por 35 votos a 27. Adesão depende apenas do Paraguai

Senadores debatem entrada da Venezuela no Mercosul: oposição teme obstáculo à integração regional

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, poderá começar 2010 aliviado. Após adiar a votação por quase um mês, o Senado brasileiro finalmente se decidiu pela entrada do novo sócio do Mercosul em uma disputa apertada de 35 votos a favor e 27 contra. Com isso, falta apenas o Congresso do Paraguai bater o martelo para que a Venezuela seja membro pleno do bloco criado em 1991. Os parlamentos do Uruguai e da Argentina foram os primeiros a aceitar, no bloco, o país governado por Chávez.

A discussão no plenário começou às 17h50 e se estendeu até as 20h20. Os argumentos causaram déjà vu a quem assistiu às discussões que se arrastaram por meses na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) do Senado. De um lado, os governistas destacaram a importância da adesão do ponto de vista político, cultural e econômico ¿ a Venezuela é, hoje, o sétimo parceiro comercial do Brasil. Os senadores recordaram que até a oposição venezuelana prefere a adesão ao bloco, evitando o isolamento da Venezuela nas mãos de Chávez, conforme declarou o prefeito de Caracas, Antonio Ledezma, em audiência pública na CRE. ¿A Europa superou as diferenças e construiu um grande projeto de futuro. Somos uma região mais pobre, precisamos nos integrar¿, defendeu o senador Aloisio Mercadante (PT-SP). Outros senadores rebateram críticas da oposição contra a personalidade ¿ditatorial¿ de Chávez afirmando que o protocolo admite o Estado venezuelano, e não o governo ¿ dotado de caráter temporário. ¿Chávez é morrível¿, chegou a afirmar o senador Wellington Salgado (PMDB-MG). O senador Pedro Simon (PMDB-RS) lembrou que o Mercosul começou com divergências entre Brasil e Argentina, superadas graças ao bloco.

Por outro lado, os senadores da oposição denunciaram o comportamento de Chávez como antidemocrático, o que seria um obstáculo à integração, dada a cláusula democrática do Mercosul (Protocolo de Ushuaya). E recordaram, com rancor, as inúmeras vezes que foram chamados de ¿papagaios do império americano¿ pelo presidente venezuelano. Para Eduardo Azeredo (PSDB-MG), o país vizinho ¿não vai promover a integração, mas a desintegração¿ do bloco sul-americano. ¿A Venezuela não preencheu até o momento todos os requisitos técnicos para participar do Mercosul¿, disse. Azeredo destacou que ¿não bastam eleições, senão Cuba seria exemplo de democracia¿. Ele rebateu ainda o argumento de quem considerava um bom negócio fechar acordos com Chávez. ¿O dinheiro fica preso e não é transferido (¿) Há inadimplência¿, destacou.

Riscos Os oposicionistas também temem que as atitudes belicistas de Chávez perturbem as relações comerciais do Mercosul com parceiros do bloco, como Israel, ou que atrapalhem acordos ¿ entre eles o que deverá ser firmado com a União Europeia, previsto para o próximo ano, como afirmou a senadora Marisa Serrano (PSDB-MS). Ela contrariou a tese de que os estados interiores do Brasil teriam mais a ganhar com a Venezuela no Mercosul. ¿Eu sei o que é viver na fronteira¿, disse, completando que o projeto da Aliança Bolivariana das Américas (Alba) tem ¿vocação para dividir e aversão para o diálogo¿. Artur Virgílio (PSDB-AM) queixou-se de que o painel de votação já estava aberto antes de os discursos terminarem ¿ os senadores estariam votando antes de ouvir o que os colegas teriam a dizer.

Análise da notícia Horizonte em 2010

Silvio Queiroz

Para o governo Lula, a ratificação do protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul é antes de tudo um alívio. Desde 2003, o Planalto e o Itamaraty elevaram a integração sul-americana e latino-americana à posição de prioridade da política externa, como peça-chave de uma estratégia de aproximação com os países do hemisfério sul. Foi em nome dessa orientação que o Brasil ¿ ao lado da Venezuela de Hugo Chávez ¿ jogou papel decisivo para enterrar o projeto da Área de Livre Comércio das Américas (Alba), então a menina-dos-olhos da diplomacia norte-americana para o hemisfério.

Os destemperos verbais e os rompantes ¿bolivarianos¿ de Chávez, destacadamente a emenda constitucional que lhe permitiu disputar reeleições sucessivas e sem limites, apenas transformaram a ampliação do bloco regional em uma espécie de refém da disputa política interna entre governo e oposição no Brasil. Para os adversários, menos do que o futuro do Mercosul, interessava a sucessão de Lula: associar o governo a um personagem transformado em arquétipo do ¿caudilho populista¿, do ¿ditador em potencial¿, faz parte da pré-campanha para 2010.