Título: Saldo preocupante
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 17/12/2009, Economia, p. 20

Superávit da balança comercial cairá em 2010 ¿ há quem aposte em números negativos ¿ e afetará as contas externas brasileiras

A forte retomada do crescimento econômico em 2010 ¿ há bancos prevendo expansão de até 6,5% para o Produto Interno Bruto (PIB) ¿ provocará uma forte deterioração nas contas externas do país. A piora será liderada pela balança comercial, devido ao aumento expressivo das importações. Um grupo mais pessimista de economistas não descarta a possibilidade de haver deficit anual na balança, o que não se vê desde 2001. O grosso do mercado aposta, porém, em superávit comercial entre US$ 9 bilhões e US$ 11 bilhões ¿ patamar que, se confirmado, será o menor registrado no governo Lula. Em 2009, as apostas são de saldo próximo de US$ 25 bilhões.

¿Acabou-se o tempo de megassuperávits comerciais, como os registrados nos últimos anos¿, disse o presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine. ¿No ano que vem, teremos um saldo positivo pequeno ou próximo de zero. O importante, contudo, será o incremento do comércio exterior como um todo.¿ No entender de Bendine, não se pode esquecer que, em 2010, o Brasil crescerá acima da média mundial. Portanto, segundo ele, é natural que o aumento das importações seja maior. Esse quadro, inclusive, está sendo evidenciado neste fim de ano. Em novembro, o saldo somou US$ 615 milhões ¿ um recuo de 53% ante o mês anterior.

Na visão do professor João Paulo de Almeida Magalhães, presidente do Centro de Estudos para o Desenvolvimento, não é apenas a recuperação econômica mais rápida o motivo para o tombo da balança comercial. ¿Esse movimento também deve ser atribuído à expressiva valorização do real frente ao dólar, que está tirando a competitividade dos produtos de maior valor agregado¿, ressaltou. Para ele, com o dólar na faixa de R$ 1,70, o Brasil está perdendo mercados e se transformando em mero exportador de produtos básicos (commodities minerais e agrícolas).

Rombo histórico

Com o superávit da balança comercial desabando e as transferências de lucros e dividendos por multinacionais instaladas no país voltando a crescer, o Bradesco estima que o deficit em transações correntes ¿ conta que agrega as operações comerciais, os gastos com serviços e as transferências de renda ¿ fechará 2010 em US$ 64 bilhões, o equivalente a 3% do Produto Interno Bruto (PIB) e o maior da série histórica do Banco Central iniciada em 1947. Essa projeção representa mais do que o dobro do rombo projetado pelo BC, de US$ 29 bilhões, número que será revisto hoje, certamente para cima.

Para o economista Felipe França, do Banco ABC Brasil, que projeta deficit em transações correntes de US$ 54 bilhões em 2010, apesar do salto espetacular, o rombo não será preocupante, pois deverá ser financiado por investimentos estrangeiros diretos (voltados para a produção) e por aplicações no mercado acionário e em títulos do governo. ¿Como o país tem se apresentado como excelente oportunidade de investimentos, não haverá problemas¿, assinalou. Apenas em investimentos diretos, ele crê em entrada de US$ 40 bilhões.

No entender do economista Rodrigo Ventura, da consultoria Macroplan, mesmo com o deficit em transações correntes sendo totalmente financiado, é importante que não se perca esse indicador de vista. Qualquer sinal de descontrole levará ao aumento dos preços do dólar, um problema para a inflação, que pode desaguar na elevação da taxa básica de juros (Selic). ¿Esse quadro mais pessimista, porém, não está no nosso radar, por enquanto¿, frisou. O mais provável, acredita ele, é que o fluxo de recursos estrangeiros para o Brasil seja muito forte, em função da robustez da economia, mantendo os preços do dólar sob controle e permitindo que o BC continue comprando as sobras de divisas e ampliando as reservas internacionais do país.

UMA PISTA NO FLUXO Dados preliminares do fluxo cambial de dezembro indicam que as importações estão bombando, puxadas pelas festas de fim de ano. Até o dia 11, os contratos de compras no exterior (antes do embarque das mercadorias) superaram as exportações em US$ 292 milhões, deixando os especialistas em alerta. Nas contas financeiras, houve, no entanto, superávit de US$ 1,176 bilhão. Ou seja, no encontro de contas, o movimento cambial fechou as duas primeiras semanas do mês com saldo positivo de apenas US$ 884 milhões, um quarto do resultado registrado em todo o mês de novembro (US$ 3,890 bilhões). Na avaliação dos especialistas, o que está mantendo o fluxo positivo é a entrada de investimentos estrangeiros diretos, voltados para o aumento da produção. Também o saldo das aplicações em bolsa de valores está superavitário. (VN)

Esse movimento também deve ser atribuído à expressiva valorização do real frente ao dólar, que está tirando a competitividade dos produtos de maior valor agregado

João Paulo de Almeida Magalhães, presidente do Centro de Estudos para o