Título: Mais rico e mais impopular
Autor: Campbell, Ullisses
Fonte: Correio Braziliense, 03/12/2009, Política, p. 6

Ao aumentar em até 45% o valor do IPTU, prefeito de São Paulo quebra promessa de campanha e desagrada a população

Gilberto Kassab: campanha pautada nas críticas à carga tributária e aumento violento nas taxas um ano após ser eleito à Prefeitura paulista

São Paulo ¿ Ao aumentar o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) da maior cidade do país, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) teve de rasgar uma das maiores bandeiras de seu partido, a da luta contra a pesada carga tributária que massacra o cidadão e afeta, principalmente, o orçamento dos mais carentes. Kassab enviou para a Câmara Municipal um projeto que previa reajuste de até 40% no IPTU, sendo que os mais afetados seriam os moradores de bairros periféricos. Sob pressão política, recuou e conseguiu aprovar um aumento de até 30% para os imóveis residenciais e de 45% para os não residenciais.

Kassab alega que os valores estão congelados desde 2001 e que precisa fazer investimentos para cumprir promessas de campanha nas áreas de educação, saúde e transporte. Com a medida, o caixa da prefeitura da cidade mais rica do país receberá, a cada ano, R$ 700 milhões a mais. Até ele deixar o cargo, em 2012, o município vai arrecadar, graças a esse aumento, cerca de R$ 2,1 bilhões.

Em uma das vezes que foi posto contra a parede para justificar o reajuste, considerado abusivo pela oposição, Kassab deu a seguinte justificativa: ¿Agora, infelizmente, temos que mostrar para a cidade de São Paulo que a atualização da planta genérica é uma necessidade. É uma questão de justiça tributária¿.

O curioso é que, nos embates que tinha com a sua oponente à prefeitura, Marta Suplicy (PT), em época de campanha, Kassab batia na questão das taxas criadas pela ex-prefeita, como a do lixo e a da iluminação pública. No vale-tudo, o atual prefeito se referia à candidata como ¿Martaxa¿. O apelido pegou ao ponto de, segundo marqueteiros, puxar a petista para os patamares mais baixos nas pesquisas eleitorais e naufragar na corrida à Prefeitura paulista.

Para o presidente da Comissão de Orçamento da Câmara dos Vereadores de São Paulo, Antônio Donato (PT), com o reajuste ¿abusivo¿ do IPTU, Kassab revelou-se uma ¿fraude política¿. ¿Ele cometeu um estelionato eleitoral ao criticar as taxas criadas pela Marta Suplicy e promover um reajuste no IPTU dessa grandeza. O eleitor está se sentido lesado¿, criticou. Donato acentua que a incoerência do reajuste, muito acima da inflação, é uma ideia de um político do DEM, que sempre se opôs aos aumentos da carga tributária imposta pelo governo federal, como a extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF).

Segundo Donato, Kassab arriscou alto ao promover um reajuste tão salgado no bolso da população. Em sua avaliação, a imagem dele como político ficará manchada, principalmente entre a população mais necessitada, que paga o imposto com sacrifício. ¿Ele planeja concorrer ao governo em 2014 e, para isso, pretende deixar concluídas grandes obras que fará com esse dinheiro do reajuste do IPTU. É uma jogada arriscada, pois um reajuste de até 30% é uma medida impopular¿, avalia.

Para o vereador Alfredo Cavalcante (PT), o DEM violou um dos princípios mais admiráveis do partido, que é o de enfrentar a política de reajustes de tributos. ¿O cúmulo da incoerência foi ele bater na Marta por conta das taxas e ainda prometer em campanha que não faria reajuste de passagens de ônibus e nem de IPTU. Em menos de um ano de governo, aumentou as duas coisas.¿

Antipatia

O vereador Carlos Apolinário, líder do DEM na Câmara Municipal de São Paulo, reitera que o reajuste, seja ele qual for, sempre é uma medida antipática. ¿É natural que a oposição reclame. Mas não havia outra saída, já que a planta genérica de São Paulo não sofre aumento há oito anos¿, ressalta. Apolinário, entretanto, diz que Kassab deveria ter feito esse reajuste anual respeitando o índice de inflação, o que não geraria impacto. Quanto à comparação com as taxas de Marta Suplicy, ele defende o colega de partido: ¿Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A Marta criou taxas novas. O Kassab apenas reajustou um imposto que já existe¿.

O cúmulo da incoerência foi ele bater na Marta por conta das taxas e ainda prometer em campanha que não faria reajuste de passagens de ônibus e nem de IPTU. Em menos de um ano de governo, aumentou as duas coisas¿

Alfredo Cavalcante (PT), vereador de São Paulo

Vai doer no bolso Valéria Gonzales/AE - 14/6/09 Avenida Paulista: reajuste muito menor do que o da Cracolândia

A maior reclamação dos vereadores que fazem oposição à administração de Gilberto Kassab (DEM) na Câmara Municipal é que o reajuste do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) na capital paulista é marcado pela incoerência. Um estudo nos cálculos usados para fazer a correção revela que os imóveis da periferia sofrerão aumento muito maior do que as propriedades localizadas em área nobres, como os bairros dos Jardins, um dos mais caros da cidade, e a Vila Nova Conceição, também reduto de gente rica. Outra incoerência apontada pelos vereadores é que casas simples na Cracolândia, região conhecida por refugiar viciados em drogas, receberão reajuste maior do que o dos prédios localizados na Avenida Paulista, uma das mais conhecidas de São Paulo.

Segundo a revisão da planta genérica de valores aprovada pela Câmara Municipal, o valor venal dos imóveis de algumas ruas localizados na Cracolândia será aumentando em até 160%. Na região da Paulista, a valorização proposta pelo projeto aprovado pelos vereadores gira em torno de 4%. Há imóveis em ruas que cortam a Paulista, como a Haddock Lobo e a Bela Cintra, em que casas terão o imposto reajustado em 3%.

A prefeitura justificou a distorção dos valores nos bairros de periferia e de classe média alta alegando que as regiões menos nobres serão revitalizadas, enquanto as avenidas nobres já estão estruturadas e não receberão obras nos próximos anos. No caso da Cracolândia, que a prefeitura chama agora de Nova Luz, há projetos previstos para a construção de calçadas e retirada dos usuários de drogas que perambulam pelo local. Um projeto garante ainda a revitalização da Praça Princesa Isabel com recursos do IPTU.

Kassab deve sancionar o reajuste antes do Natal, para que os paulistanos recebam o carnê em janeiro. Pelo projeto, os imóveis comerciais com valor acima de R$ 760 mil terão de pagar alíquota adicional de 0,5%. A isenção do imposto, antes restrita a imóveis comerciais com valor até R$ 37 mil, agora passa a atingir também propriedades de até R$ 70 mil.

A nova lei determina que, a partir de agora, a Planta Genérica de Valores seja revisada a cada dois anos. A próxima revisão fica marcada para 2013 e as alterações serão válidas nos carnês de 2014. A planta atualizada agora estava sem reajuste desde 2001.

O PT prometeu recorrer à Justiça para suspender os efeitos da nova lei com base no argumento de que o projeto tinha que ser submetido ao Conselho Municipal de Valores Imobiliários (CMVI), órgão consultivo da Secretaria de Finanças, bem antes da análise dos vereadores.(UC)

Personagem da notícia Expoente do Democratas

Gilberto Kassab, 49, iniciou sua vida política aos 24 anos participando do Fórum de Jovens Empreendedores da Associação Comercial de São Paulo. Desde aquela época, já se dizia contra os impostos e as taxas que dificultam a vida do jovem empresariado. Atraído pela ideologia, filiou-se ao então PFL e tornou-se um dos expoentes nacionais do Democratas ao derrotar, no ano passado, a petista Marta Suplicy na corrida pela Prefeitura de São Paulo.

Da campanha, Kassab guarda uma mágoa da concorrente Marta Suplicy que dificilmente será esquecida. Quando a campanha partiu para um vale-tudo, o programa da petista passou a questionar a sexualidade do democrata, alegando que ele não é casado e não tem filhos.

Atualmente com prestígio político em alta, é cogitado para o cargo de presidente nacional do DEM e para concorrer ao governo de São Paulo em 2010. Por enquanto, ele nega os dois planos. Hoje, é presidente do partido na capital paulista.

Há páginas da biografia de Kassab que, se pudesse, ele rasgaria. Uma delas é a passagem pela administração do ex-prefeito Celso Pitta, na qual foi homem de confiança e responsável pela elaboração do Plano Diretor da cidade.

Kassab foi o primeiro político indicado pelo DEM a comentar a crise em que o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, mergulhou depois de ser flagrado supostamente recebendo propina. ¿As graves denúncias feitas contra o governador do DF ainda carecem de esclarecimentos convincentes¿, ressaltou. (UC)