Título: Dinheiro pela metade
Autor: Foreque, Flávia; Santos, Danielle
Fonte: Correio Braziliense, 12/12/2009, Política, p. 2

Enquanto Lula quer ¿tirar o povo da merda¿, desembolso com saneamento previsto no Orçamento chega a apenas 41,3% em sete anos

Área sem saneamento no Entorno do DF: especialistas criticam que recursos são insuficientes

Em sete anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva, apenas 41,3% dos recursos previstos no orçamento para saneamento foram de fato desembolsados pelo governo federal. Neste ano, dos R$ 3,1 bilhões previstos para a área, foi pago até esta semana R$ 1,35 bilhão. A quantia leva em consideração os restos a pagar, dinheiro prometido em anos anteriores, mas ainda não liberado efetivamente. O levantamento foi feito pelo site Contas Abertas e pela Comissão de Orçamento da Câmara dos Deputados.

Os gastos levantados pelo Correio não consideram, entretanto, os investimentos por meio de empréstimos bancários a estados e municípios, importante fonte de recurso para a área. Apesar dos avanços nos últimos anos, especialistas afirmam que ainda é pouco diante do cenário nacional. Isso porque 47,5% dos brasileiros não têm acesso ao serviço. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), a região Nordeste possui a maior quantidade de domicílios sem acesso a saneamento (45%).

A pesquisa, realizada em 2008, aponta que 6,7 milhões de domicílios na região não têm ligação com rede de esgoto ou fossa séptica ¿ unidade de tratamento primário de esgoto. E foi no Nordeste, no estado do Maranhão, que o presidente Lula destacou os investimentos de seu governo na área. ¿Eu quero saber se o povo está na merda e eu quero tirar o povo da merda em que ele se encontra. Esse é o dado concreto¿, disse, na quinta-feira, em cerimônia de anúncio de contratos do programa Minha Casa, Minha Vida em São Luís. Ontem, o vice-presidente José Alencar defendeu o petista e disse que a fala demonstra a preocupação do presidente com a população carente.

Para o presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, houve uma melhora significativa entre o cenário atual e o de 2003, primeiro ano do governo Lula. Mas, ainda assim, os recursos são limitados. ¿O setor de saneamento básico é, de longe, o mais carente de investimento entre todos os setores de infraestrutura¿, afirmou Godoy, por meio de assessoria. O presidente aponta ainda o impacto de investimentos na área sobre a saúde da população. ¿Bastou elevar os investimentos, principalmente nas regiões mais carentes, para percebermos melhora nas condições de saúde pública¿, conclui.

Qualidade

O avanço do acesso ao saneamento no Brasil, apontam especialistas ouvidos pelo Correio, se deve em parte à criação do próprio Ministério das Cidades, em 2003, e da Lei do Saneamento Básico, em vigor há dois anos. O documento determina a universalização dos serviços de abastecimento de água, coleta de lixo, rede de esgoto e drenagem de águas pluviais. ¿A qualidade do serviço de saneamento no Brasil é historicamente pior do que o acesso à coleta de lixo e abastecimento de água. E acaba avançando mais lentamente¿, afirma Marcelo Néri, chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV).

A FGV fez um estudo recente, em parceria com o instituto Trata Brasil, sobre a evolução do saneamento no Brasil e constatou que os avanços nos últimos dois anos foram fundamentais para o resultado positivo. Néri explica que, entre 2007 e 2008, o deficit do saneamento básico no país sofreu uma redução de 4,2% ¿ entre 1992 e 2006, o percentual foi de 1,38%. ¿Foram dois anos atípicos, mas acho que é cedo dizer que (o motivo) é o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Não é o PAC, pelo próprio cronograma das obras, embora ele tenha sido anunciado em janeiro de 2007¿, afirma o economista. O PAC Saneamento prevê investimentos de R$40 bilhões entre 2007 e 2010.