Título: Mais protestos na parte central
Autor: Veleda, Raphael; Medeiros, Luísa
Fonte: Correio Braziliense, 12/12/2009, Política no DF, p. 40

Manifestações ocorreram de forma pacífica na Rodoviária do Plano Piloto e na W3 Sul. Carreata está marcada para hoje

Com instrumentos musicais, os manifestantes ocuparam a Rodoviária: trânsito ficou complicado Iano Andrade/CB/D.A Press Corredores de faixas brancas foram formados em frente ao Pátio Brasil

As ruas de Brasília voltaram a ser tomadas por manifestantes que pedem a saída do governador José Roberto Arruda e do vice, Paulo Octávio. Na Rodoviária do Plano Piloto ocorreu o maior protesto, reunindo quase mil pessoas que, apesar de terem prejudicado o trânsito em alguns momentos, mostraram suas opiniões de forma pacífica. O ato começou às 18h e durou mais de três horas. Mais cedo, outro grupo protestou no início da W3 Sul, envolvendo quem atravessava a rua em corredores de faixas brancas. A Polícia Militar acompanhou as ações, sempre evitando o confronto com os manifestantes. Hoje, está prevista uma carreata marcada para sair às 9h do estacionamento do estádio Mané Garrincha.

A manifestação na Rodoviária, justamente no horário de maior movimento, começou com menos de 100 pessoas, que usaram tambores e pandeiros para atrair mais gente. Após uma volta pelo terminal, o grupo marchou pela rua que leva ao Conic, tomando duas das três faixas e causando engarrafamento. Muitos dos motoristas que ficaram retidos, porém, fizeram um buzinaço apoiando a causa. Houve, no entanto, quem reclamasse. ¿Tem tanto lugar para fazer manifestação em Brasília sem atrapalhar os outros. Olha o tamanho do gramado do Eixo Monumental! Eu preciso chegar ao trabalho¿, reclamava a dentista Amanda do Conde, 30 anos. ¿E olha que eu apoio a causa deles, mas acho que assim está errado¿, completou.

O grupo, de 500 pessoas de acordo com estimativa da PM, foi ganhando adeptos ao longo do caminho. Gente como a motorista de van escolar Andréa Cavalcante, 29 anos, que fazia compras de Natal. ¿Acho lindo que os jovens saiam para as ruas para pressionar por mudanças. Cada ato tem sua importância¿, disse.

Invasão Após dar duas voltas na Rodoviária, passando ainda pelos dois sentidos do Eixo Monumental, o grupo aumentou de tamanho ao voltar ao terminal. ¿Deve haver, pelo menos, 650 pessoas¿, calculava o major Juarez Madureira, um dos coordenadores da ação da PM. ¿Quando a coisa é feita de maneira organizada, o povo acaba aderindo também¿, observou ele. O momento mais tenso ocorreu quando o grupo, já reduzido, invadiu, pouco depois das 21h, os corredores do Conjunto Nacional fazendo muito barulho e assustando os seguranças, que tentaram, sem sucesso, conter a massa. A ocupação, porém, durou menos de 10 minutos. ¿Hoje podemos comemorar mais uma vitória. O movimento não para de crescer, contrariando a vontade do governo, que achou que nos dispersaria com a repressão policial¿, considerou o antropólogo Paíque Lima, um dos coordenadores da manifestação.

Mais cedo, por volta do meio-dia, um grupo menor de manifestantes envolveu os pedestres em faixas brancas por nove vezes, quando fechava o semáforo em frente ao shopping Pátio Brasil. O número foi uma referência à quantidade de deputados distritais envolvidos, até agora, no suposto pagamento de propina para a base aliada na Câmara Legislativa. Em seguida, os manifestantes entraram no shopping e pediram ao Papai Noel a criação de um novo governo para o Distrito Federal.

Artigo O primeiro punido

Quarta feira, ato contra a corrupção.

Logo de manhã, minha família e eu, indignados e revoltados contra o maior escândalo político de toda a história do Distrito Federal, nos preparamos para pacificamente protestar contra o ¿suposto¿ roubo de dinheiro do povo. Fizemos cartazes e fomos todos à Praça do Buriti. Lá escutávamos dos oradores que organizaram o ato:

¿ O governador, as secretarias de governo, a Câmara Legislativa, o Tribunal de Justiça do DF, o Tribunal de Contas do DF, toda a esfera de poder do DF está dominada e contaminada pela corrupção.

Enquanto os discursos terminavam, todos os jovens, boa parte dos sindicalistas e cidadãos, abandonaram os oradores e decidiram paralisar o trânsito. Distribuíam panfletos e adesivos para os carros quando centenas de policiais, depois de muito empurra-empurra, reabriram o trânsito. Os manifestantes correram para o outro lado da pista e paralisaram novamente o trânsito. Aí foi a hora de a cavalaria intervir. Em posição de ataque, foram para cima dos que faziam o protesto, pisoteando e ferindo muitas pessoas. Em seguida vieram os policiais do Bope, lançando estrondosas bombas de gás lacrimogêneo e partindo para cima dos manifestantes, distribuindo fartamente cacetadas e chutes. A massa ali presente se dispersou pelo canteiro central.

Reuni minha família e disse: ¿ A corrupção ganhou a guerra contra os desarmados. Vamos embora.

Estávamos voltando para pegar o carro quando o meu filho mais velho, José Ricardo, se aproximou de um aglomerado de umas 10 pessoas, que questionavam os comandantes da operação. Perguntavam o porquê de tanta violência e, em específico, estavam revoltadas com o pisoteio de uma mulher pela cavalaria. José Ricardo se manifestou:

¿ Ato covarde. Um policial militar ensandecido voou para cima de José rasgando-lhe a camisa e esmurrando-o. Detalhe: o PM ensandecido é o coronel Silva Filho, comandante responsável pela tranquilidade durante o ato. Imobilizaram, algemaram e entregaram José a uma dúzia de policiais do Bope. A partir daí os atos de brutalidade, selvageria e humilhação se sucederam: socos, tapas, chutes, cacetadas, até ser jogado violentamente no camburão. Enquanto cidadãos e jornalistas filmavam a cena, policiais do Bope atiraram nos pés dos cinegrafistas para impedir o registro do covarde espancamento (vejam vídeo: http://vimeo.com/8087713). Já no camburão José escutou pelo rádio do carro da PM que o motorista era o sargento Cássio. José perguntou:

¿ Por que estou preso? Não agredi ninguém, não sou bandido, não sou corrupto.

Cássio: ¿ Cala a boca, moleque! Se eu te encontrar algum dia por aí, eu te assassino.

Com este episódio ficou bastante claro para mim que, no exercício de 24 anos de democracia, não conseguimos minimamente mudar a cultura da arbitrariedade, da brutalidade e da violência da nossa polícia. Uma cultura consolidada nos 21 anos de ditadura militar. É um sentimento altamente frustrante e desanimador.

Fomos informados que José tinha sido levado para a 2ªDP (Asa Norte) e fomos para lá. Como ali não estava, fomos para a 5ªDP (Setor Central), onde um policial civil consultou todas as delegacias e nada do meu filho. Entramos em pânico e acionamos senadores, deputados, instituições dos direitos humanos. José foi detido em torno das 13h e só apareceu na 5ª DP às 16h15. Ficou esse tempo todo algemado dentro de um camburão que fazia pequenos deslocamentos, sem água e sem alimento.

Encontrei meu filho dentro da delegacia, sem camisa e com dores. Com escoriações no pescoço, nas costas, nos braços e com dores na costela e na boca do estômago, devido aos socos sofridos. Mas ele estava de cabeça erguida e altivo. Relatou todos estes fatos em seu depoimento e olhou de frente e nos olhos de seus algozes, que estavam também na delegacia. Ao anoitecer saímos da 5ªDP e fomos para o IML e depois ao tribunal que julgaria as representações que José fez contra a violência que sofreu por parte da PM do Distrito Federal. Na representação foram anexados vídeos, fotos e depoimentos de várias testemunhas que presenciaram a brutalidade contra ele. Em torno da meia-noite o juiz entendeu que havia necessidade de ouvir melhor os policiais, pois seus depoimentos estavam muito sucintos, e determinou o retorno do processo à 5ª DP.

José Ricardo foi punido. Foi agredido violentamente e só depois foi dada a ordem de prisão. Aplicaram uma pena (ou tortura?) a ele: prisão em um camburão, abafado e quente, por mais de três horas. Ameaçaram-no de morte.

De todo o megaescândalo da corrupção no DF, só comparável ao ¿Fora Collor¿, já temos o primeiro punido. Vamos aguardar com muita ansiedade o próximo a ser punido.

Rubem Fonseca Filho, pai de José Ricardo Fonseca

Tribunal de Contas afasta Lamoglia

ANA MARIA CAMPOS

Um dia depois do fim da licença médica do conselheiro Domingos Lamoglia, o Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) voltou a se reunir para deliberar sobre o destino do ex-braço direito do governador José Roberto Arruda. Por unanimidade, os conselheiros decidiram afastá-lo até a conclusão do inquérito da Operação Caixa de Pandora em curso no Superior Tribunal de Justiça (STJ) em que ele é investigado como integrante de um suposto esquema de corrupção no atual governo. Lamoglia aparece em vídeo recebendo dinheiro do ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa.

O plenário do TCDF já havia decidido recolher todos os processos no gabinete de Lamoglia e impedir que ele assuma novas relatorias. O conselheiro só não foi afastado na semana passada porque estava de licença médica. Agora não poderá mais trabalhar, nem participar das sessões enquanto não houver suspeita sobre a sua participação nos supostos desvios de recursos. Ele, no entanto, continuará recebendo salário de R$ 22,5 mil porque os conselheiros têm as mesmas prerrogativas de juízes, ou seja, só podem perder o cargo com decisão judicial transitada em julgado na qual não cabem mais recursos. Por causa disso, o plenário do TCDF ficará desfalcado. Lamoglia não será substituído.