Título: Um misterioso amigo de Chávez
Autor: Prates, Maria Clara
Fonte: Correio Braziliense, 13/12/2009, Brasil, p. 10

Personagem próximo do presidente da Venezuela e suspeito de ligações com o fornecimento ilegal de recursos venezuelanos para a campanha de Cristina Kirchner circula com desenvoltura por meios empresariais brasileiros

O venezuelano Jhonny Yanez Rangel discursa em ato público

A caça por uma conta bancária no Brasil que possa receber a quantia de US$ 1 milhão é o atual desafio de Jhonny de Jesus Yanez Rangel ¿ empresário bem-sucedido, militar, presidente de uma organização não governamental internacional (ONG), ex-governador de Cojedes, província da República Bolivariana da Venezuela, além de braço direito do presidente Hugo Chávez, com chances de ser seu substituto natural.

Em sua última viagem ao Brasil, dia 2, Jhonny Rangel aproveitou uma festa promovida pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), em Brasília, para sondar empresários brasileiros ligados ao setor. Polivalente e com apenas 48 anos, Jhonny Rangel também preside a Confederación Bolivariana del Transporte de Venezuela, entidade similar à CNT, o que facilitou seu acesso aos dirigentes do setor no país.

Rangel tem um currículo de dar inveja e trajetória política marcada por polêmicas, entre elas um suposto envolvimento no escândalo internacional conhecido como Valijagate (o Escândalo da Valise), descoberto a partir da interceptação de um avião em Buenos Aires, transportando US$ 800 mil que seriam usados para o financiamento da campanha de Cristina Kirchner à Casa Rosada, em agosto de 2007.

De acordo com investigações do governo americano, o dinheiro era transportado pelo empresário venezuelano e dono de empresas com sede em Miami Guido Alejandro Antonini Wilson. A dinheirama tinha como origem os cofres da poderosa Petróleos de Venezuela S.A (PDVSA), menina dos olhos de Chávez.

Segundo as apurações, Jhonny Rangel tinha ligação com Antonini, e viajou pelo país na mesma aeronave e na companhia dele. Uma foto tirada em 6 de agosto de 2008, pouco mais de um ano depois do escândalo, acabou por revelar a relação com Antonini, que o chavista insistia em negar.

Apesar das negativas, Jhonny Rangel ¿ que governou a província de Cojedes entre 2000 e 2008, depois de comandar a Guarda Nacional local ¿, não se conteve e afirmou que Antonini, assim como seus sócios vezenuelanos, Carlos Kauffman e Franklin Durán, este conhecido negociador de armamentos, teriam sido vítimas ¿do terrorismo dos Estados Unidos, que os prendeu e os acusou de conspiração¿.

Condecoração Registros de entrada e saída de estrangeiros do país mostram que Jhonny Rangel tem afinidades ou interesses comerciais no Brasil desde 2005, quando foi registrada sua primeira entrada em território nacional. Mas somente nos últimos 24 meses foram contabilizados quase 10 acessos. Em alguns deles, a presença do chavista mereceu ampla divulgação pela imprensa, como quando condecorou o então governador do Maranhão, Jackson Lago (PDT), em agosto de 2008, com a Ordem Sol de Taguares, comanda máxima da República Bolivariana da Venezuela e uma referência às batalhas travadas pelo libertador Simon Bolívar.

Em troca, recebeu de Lago a maior honraria do estado, a do Mérito Timbiras. Mas Jhonny Rangel terminou por perder o poder do aliado brasileiro em abril de 2009. Jackson Lago foi obrigado a deixar o governo do Maranhão pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em abril, por abuso de poder econômico.

Antes disso, o chavista já tinha anunciado sua intenção de lançar o então governador para a Vice-Presidência da Organização Latino Americana de Governos Intermediários (Olagi), organização não governamental (ONG) criada durante a I Conferência Latino-Americana de Governadores, Prefeitos e Presidentes Regionais, no Equador, em 2004.

Jackson participou de várias reuniões da entidade e chegou a realizar, em São Luís, em agosto de 2008, o I Encontro Internacional de Governos da Bacia Amazônica, promovido pela ONG do chavista. Jhonny Rangel também mereceu espaço na reunião da Associação Brasileira dos Transportadores de Carga, no Rio, em agosto, quando fez apresentação sobre o tema. A assessoria de imprensa da CNT confirmou a presença de Jhonny Rangel na festa em Brasília, mas negou que o chavista mantivesse qualquer relação de parceria com a confederação venezuelana.

A CNT explicou que o ex-governador tornou-se próximo de alguns empresários do setor de transporte da Região Norte do país em razão dos interesses comuns e da proximidade geográfica. Assim, por se tratar de uma relação institucional, Jhonny foi convidado a participar também da festa.

Ainda segundo a assessoria, a Venezuela vem tentando angariar apoios para buscar um assento na prestigiada Câmara Interamericana de Transporte (CIT), já que é o único país excluído.

A reportagem não conseguiu falar com Jhonny em seu escritório para detalhar seus investimentos no país, e a secretária do ex-governador não retornou a ligação telefônica.

O número R$ 1 milhão É a quantia que Jhonny Rangel tem para depositar numa conta bancária brasileira

Valijagate

» Em 4 de agosto de 2004, o empresário venezuelano Guido Alejandro Antonini Wilson é interceptado pela alfândega em Buenos Aires com uma mala, em que estavam sendo transportados US$ 800 mil. O empresário havia voado de Caracas a Buenos Aires em um avião fretado pela estatal argentina Enarsa, no qual também estavam três funcionários do governo argentino e quatro executivos da Petróleos de Venezuela S.A (PDVSA). Dois dias antes, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, esteve na Casa Rosada, na mesma reunião que Antonini Wilson. As investigações demonstraram que o dinheiro era da PDVSA e tinha como destino o financiamento da campanha de Cristina Kirshner à Presidência da Argentina A Justiça americana passou a investigar o caso depois que Antonini Wilson, que vive naquele país, passou a ser ameaçado por empresários para não revelar a origem do dinheiro. Foram denunciados por conspiração sócios do venezuelano, Carlos Kaufman, Franklin Durán, Moises Maionica e Rodolfo Wanseele Panciello, presos pelo FBI.