Título: Avião da FAB vai resgatar brasileiros
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 30/12/2009, Mundo, p. 17

Itamaraty organiza repatriação, mas não confirma mortes no ataque a garimpeiros

Um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) segue hoje para o Suriname com a missão de repatriar imigrantes brasileiros feridos em um ataque(1) na véspera de Natal, na cidade de Albina, a 150km da capital, Paramaribo. ¿Nesse avião virá quem quiser. A FAB está estudando inclusive enviar apoio médico para atender os feridos¿, anunciou ontem o secretário-geral do Itamaraty, Antonio Patriota. Segundo o diplomata, 17 brasileiros já manifestaram o desejo de regressar ao país. Ao todo, 81 cidadãos foram transferidos para a capital, mas a maioria pensa em voltar para o garimpo de ouro em Albina.

De acordo com nota oficial divulgada pelo Ministério de Relações Exteriores, dos 25 brasileiros feridos, 20 já receberam alta. Cinco continuam hospitalizados em Paramaribo: um deles pode ter o braço amputado e outro tem um ferimento na mandíbula. ¿Mas ninguém está correndo risco de morte¿, ressaltou Patriota.

O secretário-geral, que responde interinamente pela chancelaria, destacou que não há como confirmar os relatos sobre a existência de mortes de brasileiros no confronto, pois ¿nem o governo surinamês identificou, nem nosso embaixador, José Luiz Machado e Costa, constatou na visita a Albina¿. Segundo Patriota, o padre Vergilio, radicado na cidade, teria dito que haveria corpos no hospital de Saint Laurent, na Guiana Francesa, ¿mas nossa consulesa em Caiena foi até lá, esteve com os brasileiros que estiveram hospitalizados (todos já tiveram alta) e não encontrou cadáveres¿.

Mesmo assim, o ministro interino não descarta a hipótese de que brasileiros tenham sido assassinados. ¿Não estou dizendo que não ocorreram mortes. Estamos observando com cautela, com prudência, porque até agora as investigações não nos ofereceram nenhuma pista nessa direção, o que não reduz o fato de que houve uma violência muito grande¿, argumentou Patriota. O Itamaraty comprovou, porém, que houve violência sexual contra um número expressivo de brasileiras, entre 10 e 20.

A chanceler do Suriname, Lygia Kraag, expressou ¿a profunda desolação¿ do governo em relação ao episódio e garantiu que serão tomadas ¿todas as providências necessárias para que isso não venha a se repetir¿. O ministro de Justiça, Chandrikapersad Santhoki, anunciou para janeiro uma grande operação de combate ao crime em Albina. Alguns deputados surinameses pediram reforço militar permanente na área. O congressista Ronny Brunswijck, presidente do Partido Marrom, que representa os mestiços, condenou a violência. Ele é uma figura polêmica no Suriname, como ex-líder da guerrilha Comando da Selva, que organizou a comunidade quilombola do leste do país contra o governo militar dos anos 80. Brunswijck é acusado de tráfico de drogas, assalto a banco e abusos físicos.

O Itamaraty descarta que a violência em Albina seja parte de uma onda de xenofobia contra brasileiros, e trata trata o episódio como um ato isolado. ¿Aquela é uma área delicada, onde vivem os `marrons¿, os quilombolas locais, que têm regras próprias e não admitem a presença de estranhos. Brasileiros, chineses e javaneses se instalaram no local. Portanto, não é nada contra os brasileiros especificamente¿, esclareceu ontem o embaixador brasileiro no Suriname à agência Brasil. Os descendentes de indianos, grupo étnico majoritário no Suriname, também teriam sofrido ataques. ¿Eles são confundidos frequentemente com brasileiros e também foram espancados¿, disse o paraense Maurice Dias Alves ao Diário do Pará. Ele era empregado de uma loja chinesa e conseguiu escapar entregando todo o seu dinheiro aos quilombolas.

Maurice ouviu relatos segundo os quais 20 brasileiros teriam sido mortos e esquartejados. ¿Ouvi o pessoal dizendo que os marrons cortavam pedaços de corpos e jogavam no rio em frente à cidade¿, disse. O paraense descreveu os criminosos do como ¿piores do que bichos ferozes¿: ¿Estupravam as mulheres na frente de todo mundo e roubavam tudo que encontravam pela frente. Uma coisa monstruosa¿. No entanto, ele afirma que continuará no Suriname, porque ¿no Pará não tem emprego¿.

1 - Rastro de sangue Em 24 de dezembro, centenas de quilombolas surinameses empunhando machados e armas de fogo deixaram um rastro de destruição, estupros e assaltos contra brasileiros e chineses na cidade de Albina, na fronteira com a Guiana Francesa. O ato teria sido vingança contra um garimpeiro acusado de esfaquear e matar um quilombola em uma briga de bar. No entanto, brasileiros na região relatam que o ataque já vinha sendo planejado, pois as atividades dos imigrantes brasileiros e chineses em garimpo e comércio são malvistas pela população local, que se sente prejudicada.