Título: Bahia levou mais verba contra desastre
Autor: Mariz, Renata
Fonte: Correio Braziliense, 06/01/2010, Brasil, p. 6

Estado do ministro da Integração Nacional recebeu 48% do dinheiro liberado em 2009 do programa preventivo administrado pela pasta. No fundo destinado a reconstruções, também ganhou uma boa quantia, perdendo apenas para Santa Catarina

Chuvas inundam rua no Rio: apesar de castigado pelos temporais, estado recebeu apenas 1,2% dos recursos do programa de prevenção de desastres

Coincidência ou não, quase metade dos recursos federais que saíram do programa Prevenção e Preparação para Desastres, administrados pelo Ministério da Integração Nacional, foi para o estado do chefe da pasta. A Bahia, base eleitoral de Geddel Vieira Lima, abocanhou nada menos do que 48% do dinheiro liberado em 2009 por meio da rubrica. Em termos absolutos, isso representa R$ 65 milhões do total de R$ 135 milhões executados. No outro fundo relacionado a tragédias naturais, intitulado Resposta aos Desastres e Reconstrução, o estado de Geddel também não pode reclamar. Ficaram em terras baianas R$ 125 milhões, perdendo apenas para Santa Catarina, que no fim de 2008 passou por uma das piores enchentes e deslizamentos de terra de sua história, com mais de 120 mortos.

Esse programa, que chegou a executar R$ 1,2 bilhão, repassou a Santa Catarina o maior montante: R$ 268 milhões. O Rio de Janeiro, porém, não foi tão agraciado com o dinheiro do governo federal. Apesar do histórico de calamidades provocadas por chuvas, o estado recebeu R$ 1,5 milhão do programa Prevenção a Preparação para Desastres, que representa 1,2% do total de recursos liberados. Da outra fonte, Resposta aos Desastres e Reconstrução, foram enviados ao Rio R$ 90,6 milhões, pouco mais de 7% da execução integral. Ivone Valente, secretária de Defesa Civil do Ministério da Integração Nacional, rechaça uma eventual vantagem para a Bahia na partilha do dinheiro. ¿Não tenha dúvida de que outros estados são atendidos por outros programas do Ministério que também têm caráter preventivo¿, diz.

Ivone destaca como exemplo o Programa de Drenagem Sustentável. Segundo ela, tal rubrica investiu R$ 180 milhões em três anos ¿ R$ 45 milhões a mais do que pagou o programa Prevenção e Reparação para Desastres só em 2009 ¿, dos quais ¿praticamente nada¿ foi para a Bahia. ¿Investimos R$ 32 milhões no Centro-Oeste¿, exemplifica. Apesar de receber maior parte da verba do programa voltado para a prevenção, a Bahia, que tem 417 municípios, registrou algum desastre natural no ano passado, ressaltou Ivone. ¿O próprio tamanho do estado compete para que isso ocorra¿, afirma a secretária. O estado é o quarto do país em população, cerca de 14 milhões de pessoas, perdendo para Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Todos eles passam, no momento, por problemas com as chuvas e mortes devido a deslizamento de terra e enchentes.

Em 2008, foi Santa Catarina que protagonizou a maior tragédia nacional. Após quase três meses chuvosos, nos dias 22 e 23 de novembro choveu o equivalente à média mensal. Cidades próximas ao litoral do estado, como Blumenau, Itajaí, Gaspar, Navegantes e Florianópolis, entre outras, foram castigadas por deslizamenros e inundações. Novembro de 2008 entrou para a história como o mês de maior quantidade de chuvas desde que o Instituto Nacional de Meteorologia começou a fazer medições em Florianópolis, em 1961. O desastre causou a morte de 126 pessoas e deixou cerca de 80 mil desalojadas e desabrigadas. Oito municípios ficaram isolados, dez tiveram de decretar estado de calamidade pública e vários foram encobertos pela água.

entrevista - GEDDEL VIEIRA LIMA Longe de ter um dia tranquilo

Denise Rothenburg Auremar de Castro/EM - 16/4/07

Depois de um estressante início de ano por causa dos deslizamentos de terra e das inundações espalhadas pelo país, o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, determinou a sua equipe que prepare um pacote de propostas para levar ao presidente Lula na semana que vem, quando irá discutir a ampliação do programa de macrodrenagem e prevenção. Mas o ministro alerta que todos os investimentos não são capazes de conter acidentes climáticos e o pouco caso dos governantes: ¿É impossível ter tranquilidade. Para cada encosta que você corrige, há uma nova com ocupação irregular¿, alerta ele, numa entrevista ao Correio ontem, por telefone, antes de sair para sete dias de férias.

No fim de 2008, foi a tragédia em Santa Catarina. Agora, em Angra dos Reis e São Paulo. O brasileiro está construindo de forma desordenada ou é apenas um problema climático? Os dois. Tem conotações nitidamente climáticas, fruto do aquecimento que muda o clima do mundo inteiro. E, evidentemente, tem uma dose de pouco caso dos nossos governantes, sobretudo daqueles que têm a responsabilidade de fiscalizar as leis de uso do solo urbano que permitem, para evitar desgastes políticos, as constantes ocupações irregulares de áreas de risco, sobretudo, nos centros urbanos do nosso país.

A fiscalização é responsabilidade de quem? Da União, dos estados ou dos municípios? Basicamente dos municípios, a quem cabe regulamentar o artigo da Constituição que trata de uso do solo urbano. As Câmaras de Vereadores têm que fazer legislações cada vez mais rigorosas, planos diretores urbanos e a fiscalização tem que ser sobretudo do município, mas é evidente que os estados e a União têm que ter um papel nesse debate. O problema é que, para cada encosta que você corrige, há, pelo menos, uma encosta nova com ocupações irregulares. É impossível ter tranquilidade. Por mais que se faça investimentos em prevenção, não se evitará 100% os problemas advindos das questões climáticas.

Existe a intenção de fazer um programa nacional, chamar os prefeitos para conscientizá-los sobre o perigo de construções irregulares ou em locais de risco? Esse é um tema que vou levar como sugestão ao presidente Lula na reunião em que vamos tratar de outros assuntos, no dia 15. É chegado o momento de ele colocar a sua autoridade política em favor dessa causa.

Vem aí um programa de emergência, um pacote de projetos? As obras estão sendo feitas. Não vamos tomar esse caso para tentar imaginar que vai se resolver tudo emergencialmente. Há de ter planejamento, e de tornar mais abrangente os programas e mostrar como é importante não fazer suas moradias em áreas de risco.

Mas, no caso de Angra, houve um decreto liberando a construção¿ Sempre em momentos de comoção há tentativas de buscar responsáveis e culpados. No caso de Angra, foi um acidente da natureza, correu uma encosta onde havia uma proteção natural de Mata Atlântica. Acidentes vão continuar ocorrendo e, por mais que o homem deseje, não conseguirá evitar. As construções que ali estavam não são advindas desse decreto que tentam imputar a responsabilidade ao governador Sérgio Cabral.

E em relação a outras áreas urbanas que sofrem constantemente com alagamentos? O governo não tem um projeto? Há várias ações. A primeira, continuar insistindo em obras de macrodrenagem em áreas urbanas do país, um programa que está em andamento. E tem que se fazer um programa amplo de educação, sobretudo para as camadas mais pobres. As pessoas têm que entender que permanecer em área de risco é ruim para elas próprias. Hoje, as pessoas se recusam a atender o chamado da Defesa Civil para sair daquelas áreas que consideram o refúgio seguro para suas vidas. Por último, é fazer cumprir com rigor.

Estamos num ano eleitoral. Isso não dificulta? Em qualquer ano. Não há que se ter essa ideia de ano eleitoral.

Por falar em ano eleitoral, há duas apostas na sua pasta para este ano, a Transnordestina e a transposição do Rio São Francisco. Vão sair antes de julho? Estamos nos matando dia e noite para fazer com que os cronogramas sejam cumpridos. O São Francisco, o eixo leste será entregue em 2010 e o eixo norte, mais longo, em 2012. E ainda em janeiro, vou submeter à Casa Civil o modelo de gestão, a operação do sistema. A Transnordestina, o presidente tem cobrado o cronograma para que seja cumprido. Não estou preocupado com ano eleitoral. Temos que agilizar porque é bom para a sociedade.