Título: Pregão vitaminado
Autor: Vaz, Lúcio
Fonte: Correio Braziliense, 08/01/2010, Política, p. 4

MEC vai contratar empresa de realização de eventos para gerir contrato de R$ 95 milhões

Ano passado, que não era eleitoral, valor do edital para eventos na pasta de Haddad foi 37% menor

O Ministério da Educação (MEC) realiza hoje um pregão eletrônico para a contratação de uma empresa de realização de eventos pelo valor de R$ 95 milhões. Isso representa um acréscimo de 37% do valor do edital que resultou no contrato em vigor no ano passado (R$ 69 milhões). O valor efetivamente gasto diretamente pelo ministério no ano passado, sem contar as suas fundações, chegou a R$ 50 milhões. O edital deste ano tem um item pouco comum: o fornecimento de placas em aço inox, com a aplicação do Brasão da República em metal, colorido, em alto relevo. Tratam-se de placas para inaugurações, algo muito utilizado em ano eleitoral.

No fim de novembro do ano passado, outros dois ministérios chegaram a lançar pregões milionários para a contratação de eventos, mas desistiram na última hora. O Ministério da Pesca suspendeu o pregão eletrônico que realizaria em 7 de dezembro para contratar empresa de eventos, no valor estimado em R$ 66 milhões. O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) suspendeu o pregão eletrônico marcado para 27 de novembro, após a apresentação de indícios de irregularidades pelo Correio. Seria contratada uma empresa pelo valor estimado de R$ 156 milhões.

Os gastos do MEC com a realização de eventos registrados no Portal de Transparência totalizaram R$ 30,5 milhões no ano passado, considerando também as despesas de suas fundações. Os gastos diretos do ministério chegaram a R$ 26,9 milhões. A assessoria de imprensa do MEC afirmou que houve novas despesas em novembro e dezembro. Os recursos para custear esses eventos teriam sido empenhados (reservados no Orçamento da União), mas não chegaram a ser liquidados. Foram incluídos nos chamados ¿restos a pagar¿ e serão pagos neste ano.

Detalhes A assessoria de imprensa do MEC afirma que o aumento do valor se justifica pelo acréscimo do número de eventos neste ano. Serão 762, enquanto no ano passado foram 637. O edital do MEC não apresenta algumas das irregularidades apontadas pelo Correio nos editais do MDS e do Ministério da Pesca, como preços irrisórios ou, pelo contrário, muito acima dos praticados de mercado. Essas distorções são vetadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) porque permitem o jogo de planilhas, o que possibilita à empresa contratada compensar com itens superfaturados os preços irrisórios que apresentou para vencer a licitação.

Entre os eventos previstos estão comemorações de datas históricas e festivas, inaugurações de espaços físicos, de bustos e estátuas, lançamentos de livros, de pedras fundamentais e de programas, além da outorga de títulos e posses. Os eventos técnico-científicos se realizam por meio de conferências, congressos, convenções, debates, entrevistas coletivas, seminários, painéis e videoconferências. Os eventos de capacitação se dão por meio de palestras, oficinas e workshops.

O contrato se dará pelo sistema de ata de registro de preços. Assim, o MEC não está obrigado a executar todo o valor previsto no contrato. Mas poderá haver a adesão de outros órgãos públicos, das esferas federal, estadual e municipal, à ata de preços do MEC, até o valor total do contrato (R$ 95 milhões), sem a necessidade de realizar nova licitação.

Memória Valores irreais

O pregão suspenso pelo Ministério da Pesca previa a realização de 73 eventos neste ano, no valor médio de R$ 905 mil. Mas o ministério reconheceu que dispõe de apenas R$ 12 milhões no orçamento para a realização de conferências, palestras, seminários, encontros, feiras, exposições e congressos. Oficialmente, disse que a licitação foi suspensa para que fossem feitos ajustes técnicos a partir de observações feitas pelo Tribunal de Contas da União (TCU). Ou seja, o tribunal havia apontado irregularidades no contrato.

O Correio apurou preços unitários muito acima do mercado na planilha de custos apresentada pelo ministério no edital de licitação. Chamou a atenção o preço de alguns itens, como uma garrafa de água mineral de 500 ml, fora de ambiente hoteleiro, a R$ 9,92. O preço de mercado fica em torno de R$ 1,50. O cartão do vale-alimentação estava cotado a R$ 9,48, quando pode ser confeccionado por centavos de real. O aluguel de uma cadeira de plástico estava estimado em R$ 100 por dia. O preço real não passa de R$ 5, já considerado o lucro da empresa.

O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) pretendia realizar, em ano eleitoral, 225 eventos a custo médio de R$ 694 mil. O MDS executa o Bolsa Família, que beneficia cerca de 50 milhões de pessoas de baixa renda, com orçamento anual de R$ 13 bilhões. O Correio apontou, na planilha de preços, uma série de itens muito acima dos valores de mercado.