Título: Crise vai conter investimentos
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 24/09/2008, Finanças, p. C1

A crise externa vai reduzir o ritmo de crescimento do investimento direto privado na economia brasileira. Essa é a conclusão de economistas com base nos números do setor externo divulgados ontem pelo Banco Central. O Bradesco aposta em aumento de 8,5% em 2009, na comparação com os 14% deste ano ano, diz o diretor Octavio de Barros.

Os dados de ontem mostram de qual magnitude e duração será o aperto do crédito externo na visão da autoridade monetária. Segundo o BC, o crédito externo comercial de curto, médio e longo prazos vai somar US$ 20,7 bilhões neste ano, em termos líquidos (captações menos vencimentos) e apenas US$ 5,2 bilhões em 2009. Ou seja, o pior está por vir. Em 2007, o número foi de US$ 35,8 bilhões.

A redução nesse crédito - aliada a um aumento no déficit de transações correntes e a uma retração nos investimentos externos de portfólio - fará com que o país tenha, pela primeira vez desde 2002, falta de dólares no mercado de câmbio à vista. Na visão do BC, vão faltar US$ 7,4 bilhões, na comparação com a sobra de US$ 15,3 bilhões neste ano. Isso significa o fim das compras do BC no mercado de câmbio. As reservas internacionais do país, hoje em US$ 206,3 bilhões, vão parar de crescer e podem começar a cair. O câmbio tende a se desvalorizar.

"Os números do BC são coerentes: os bancos dos países ricos tiveram perdas de capital e até agora somente 70% delas foram repostas", afirma Octavio de Barros. "É de se esperar que sua capacidade de crédito continue reduzida por um longo período, o que vai reduzir as fontes de financiamento do nosso déficit em conta corrente", diz. No seu cenário, a situação de anomalia nos mercados interbancários internacionais deverá acabar com o pacote de US$ 700 bilhões do Tesouro americano. "O crédito externo deverá voltar a girar, embora mais lentamente", afirma.

A disponibilidade de recursos será menor. "O principal impacto para o Brasil será nos investimentos diretos do setor privado", afirma Octavio de Barros. Nos últimos anos, os recursos externos vinham sendo fonte importante de financiamento de longo prazo para os investimentos no Brasil. Agora, essa fonte secou e, quando voltar, voltará ainda mais curta, escassa e cara. "Por enquanto, os empresários continuam mostrando a mesma disposição para investir, mas os ânimos devem se arrefecer um pouco em 2009", acredita.

Os movimentos de fusões e aquisições também deverão ter o ritmo reduzido, inclusive por causa da dificuldade de captar por meio da emissão de ações. "Mas, mesmo em meio à crise, o Brasil continua sendo um dos países que mais tem atraído investimento externo direto", diz. "As empresas devem buscar ainda mais nos bancos brasileiros e no mercado interno fontes alternativas de captação", diz Bruno Rocha, economista da Tendências. Ele lembra que o movimento começou, embora em pequena proporção, nos sete primeiros meses deste ano.

Segundo ele, as novas concessões de crédito dos bancos brasileiros às pessoas jurídicas subiram 61,6% em termos reais de janeiro a julho na comparação com o mesmo período de 2007, para R$ 690,9 bilhões. A concessão de crédito para a pessoa física subiu 27,8%, para R$ 361,5 bilhões. Enquanto isso, os desembolsos de recursos de dívida externa do setor privado de médio e longo prazo brasileiro caíram de R$ 29 bilhões para R$ 14,7 bilhões. O total de Adiantamentos de Contrato de Câmbio (crédito à exportação de curto prazo) caiu 20%, de R$ 56,2 bilhões para R$ 45,1 bilhões.