Título: Minc suspende licenciamento da BR-319
Autor: Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2008, Brasil, p. A4

O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, anunciou ontem a suspensão, por 60 dias, do processo de licenciamento ambiental para asfaltamento da BR-319, que liga Manaus a Porto Velho. Esse prazo servirá para que um grupo de trabalho, composto pelo seu ministério e os de Transportes e Integração Nacional, pelo Ibama, Instituto Chico Mendes, governos de Rondônia e Amazonas conclua um relatório detalhando o projeto, os prazos de implementação e os custos de manutenção da obra por um prazo de dez anos. "Sem isso não haverá licença para o asfalto. Não somos nem seremos carimbadores da irresponsabilidade", disse Minc.

A BR-319 tem pequenos trechos asfaltados nos pontos que partem das duas capitais. Mas a maior parte da rodovia - cerca de 800 quilômetros, embora o Ibama não defina com precisão esse tamanho - ainda está por ser feita. "Ela corta o filé mignon da preservação ambiental, o coração da Amazônia de ponta a ponta", afirmou o ministro. Por isso, ele teme que as obras na região aumentem o desmatamento. "Só o anúncio do asfaltamento da BR-163 provocou um aumento de 500% no desmatamento ao longo da rodovia", disse.

O ministro de Meio Ambiente não se mostrou convencido, ainda, se o melhor para a região seria de fato uma estrada. Durante pausa na reunião com os governadores da Amazônia, há duas semanas, Minc conversou com Ivo Cassol (PPS-RO) e Eduardo Braga (PMDB-AM), que teriam apresentado como alternativa a construção de uma ferrovia ligando as duas capitais. "Eles me garantiram, inclusive, que os caminhões poderiam transitar pelos trilhos, algo que eu nunca tinha ouvido falar", disse Minc.

Como sabe das dificuldades que enfrenta para impor suas posições diante dos demais ministros - a BR 319 está incluída nas obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - Minc ressalta que a decisão sobre a construção de uma ferrovia ou de uma rodovia será de governo. Resignado, lembra que acabou tendo de assinar a licença ambiental de Angra 3, "para meu desgosto, diante de um país com um enorme potencial hídrico".

Mas não esconde que vem sendo pressionado por diversas idéias sedutoras. "Outro dia, veio aqui o Jorge Viana, ex-governador do Acre, que me disse que o transporte de pessoas e cargas entre Manaus e Porto Velho poderia ser feito pelo próprio Rio Madeira, que, nesse trecho é completamente navegável e corre em paralelo com o traçado da rodovia".

Por tudo isso, Minc quer se cercar de todas as garantias possíveis para conceder a licença ambiental. E um das críticas mais ácidas dele envolve o próprio governo federal, mas também o governo da Amazônia. De acordo com o ministro, sete parques federais - três deles criados durante a sua gestão - e outros três estaduais, não foram implementados, totalizando 8,2 milhões de hectares teoricamente protegidos. "Parque de papel não protege ninguém, só a má-consciência. Por ser de papel, ele pega fogo mais fácil", disse ele.

O ministro também classificou esse período pré-eleitoral como delicado para o combate ao desmatamento, pois "nenhum governador ou prefeito quer ser antipático". Ele diz que sobrevoou diversas regiões nas últimas semanas, incluindo áreas onde foram apreendidos bois piratas, e as queimadas voltaram aos mesmo nível de antes. "Temos visto nos últimos meses a Amazônia pegando fogo, governos estaduais e municipais fazendo corpo mole, devastadores respondendo inquérito sem a certeza de condenação e pressões para que aprovemos projetos a toque de caixa", reclamou.

Na próxima segunda, Minc promete anunciar uma lista com os cem maiores devastadores da Amazônia - pessoas físicas e jurídicas - para mostrar quem são "os grandes inimigos da floresta". No mesmo dia também anunciará a ampliação, provavelmente para um número entre seis e oito (atualmente são apenas dois), dos pontos de bloqueio colocados nas rodovias BR-364 e 163, que servem para apreensão de madeira irregular extraída da floresta.