Título: Equador ameaça calote, mas Brasil minimiza risco
Autor: Leo, Sergio; Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 25/09/2008, Internacional, p. A9

Apesar da decisão do Equador de expulsar a Construtora Norberto Odebrecht e da ameaça feita ontem de não pagar um empréstimo do BNDES, o governo brasileiro quer evitar polemizar com o presidente equatoriano, Rafael Correa, antes do referendo constitucional de domingo no país. Haverá apenas negociações nos bastidores. Até lá, qualquer manifestação pública mais forte será evitada, afirmaram ao Valor integrantes do governo que acompanham o caso.

Ontem, o presidente Correa ameaçou não pagar o financiamento de US$ 242,9 milhões feito pelo BNDES para a construção da hidrelétrica de San Fernando, obra realizada pela Odebrecht e que apresentou problemas. Divergências em relação a essa obra motivaram anteontem a expulsão da Odebrecht, que teve seus ativos no país confiscados.

"Eu gosto muito do Brasil, mas o que essa companhia fez no Equador foi horrível", disse ontem Correa. Sobre o empréstimo do BNDES, ele afirmou: "Na verdade, é dinheiro que foi para a empresa, mas aparece como um empréstimo do Brasil ao Equador".

Ontem, porém, a embaixada brasileira em Quito ouviu promessas de autoridades do país de que não há haverá calote ao BNDES por parte do Equador.

A ameaça de calote, assim como a ação contra a Odebrecht, é considerada pelo governo brasileiro como reflexo da acirrada disputa eleitoral travada por Correa para estabelecer constitucionalmente seu projeto de ampliação dos poderes do Estado e dos direitos sociais no Equador. Uma manifestação mais dura do Brasil agora agitaria o clima eleitoral e poderá dificultar a defesa dos interesses da Odebrecht, argumenta um graduado diplomata.

Em Nova York, onde participou da Assembléia Geral da ONU, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse não temer abalos na relação bilateral e comparou a relação entre Brasil e Equador com a de um irmão mais velho com seus irmãos mais novos, que reclamam mesmo quando estão errados. "Se aconteceu um problema entre uma empresa brasileira e um país vizinho, nós vamos encontrar uma solução", disse. "Tenho certeza de que o presidente Rafael Correa vai me telefonar e vai discutir comigo, como dois dirigentes civilizados fazem." "Não tenho dúvida que vamos encontrar um acordo."

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, informou que manifestou à chanceler do Equador, Maria Isabel Salvador, preocupação de que a ameaça à Odebrecht possa "afetar o clima das empresa brasileiras no Equador, o que não é bom". O Itamaraty teve a informação de que a empresa recebeu o projeto pronto do governo e apenas executou a construção da hidrelétrica de San Francisco.

Diplomatas brasileiros refutam a acusações de Correa de que os contratos com a Odebrecht são responsabilidade do governo anterior - todos teriam sido revistos, renegociados e assinados novamente já na atual gestão.

O Itamaraty apóia a argumentação da Odebrecht, que teria se disposto a assinar um acordo responsabilizando-se por indenizações ao governo equatoriano. O acordo foi inviabilizado pela negativa dos sócios da Odebrecht no consórcio. O governo do Equador havia sido informado pela Odebrecht que o acordo seria assinado, e a negativa dos sócios, comunicada no fim de semana, irritou Correa.

A forma como Rafael Garcia reagiu ao impasse na negociação com a Odebrecht surpreendeu e incomodou o governo brasileiro que, porém, ainda não decidiu a atitude a tomar. O embaixador do Brasil em Quito, Antonino Marques Porto e Santos, tenta com as autoridades equatorianas evitar novas declarações agressivas enquanto negocia uma saída para preservar os investimentos da Odebrecht.