Título: Governo deve renovar concessões do setor elétrico que vencem em 2015
Autor: Rittner, Daniel
Fonte: Valor Econômico, 30/09/2008, Brasil, p. A2

Ainda não há definição sobre o futuro das concessões do setor elétrico que expiram em 2015, mas o grupo encarregado de discutir o assunto já fez um diagnóstico inicial e levantou alternativas para o problema. Algumas idéias são consensuais, outras ainda requerem discussões do grupo, que se reuniu pelo menos cinco vezes. Mas, nos últimos dois a três meses, o governo amadureceu algumas propostas de solução para o vencimento das concessões de 17 usinas hidrelétricas, 37 distribuidoras de energia e 73 mil quilômetros de linhas de transmissão. A tendência é renovar as concessões, aplicando soluções diferentes para cada segmento, de acordo com suas características de investimento.

O assunto é de especial interesse para o governo de São Paulo, que fracassou nas tentativas de privatizar a Cesp e espera prorrogar as concessões das usinas de Ilha Solteira e Jupiá. As soluções devem vir por meio de uma revisão da atual legislação, embora ainda não se tenha decidido se isso ocorrerá por medida provisória ou projeto de lei - trabalha-se com a certeza de que não basta um decreto ou portaria. Juridicamente, a maior preocupação é não contrariar o artigo 175 da Constituição Federal, que determina ao poder público prestar serviços públicos, "diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação". Mas já existe a interpretação de que é pequeno o risco de ações de inconstitucionalidade, porque a lei 9.074/1995, que tratava do mesmo assunto, estendeu por 20 anos as concessões do setor elétrico de empresas que não haviam sido privatizadas e jamais enfrentou contestação judicial.

No segmento de geração hidrelétrica, caminha-se para uma renovação "onerosa" das concessões. Ou seja, como o empreendedor usa um bem público (o potencial elétrico de um rio), o governo considera justa a adoção de uma contrapartida pelo concessionário. Há pelo menos duas alternativas, mas não se bateu o martelo por nenhuma delas e nada impede que surjam outras opções. Na primeira, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) faria uma espécie de auditoria nas hidrelétricas para checar se todos os investimentos foram amortizados e qual é o valor das despesas de operação e manutenção das usinas.

A partir da identificação desse valor, o governo pode fixar a nova tarifa de energia a ser praticada pela hidrelétrica, capaz de gerar lucro ao concessionário, mas beneficiando principalmente o consumidor, pois os investimentos na construção das usinas já teriam sido praticamente amortizados.

Na segunda alternativa, que tem a simpatia de autoridades do setor elétrico, pode-se definir uma "solução-padrão" para todas as hidrelétricas que terão concessões prorrogadas. Estabelece-se uma tarifa única para a energia produzida (menor do que a atual) e os concessionários transferem parte da receita gerada para um fundo que ajudaria a bancar as despesas da rede básica de transmissão, que custa cerca de R$ 8 bilhões ao ano e hoje é mantida por meio de um encargo setorial cobrado de todos os consumidores de energia, a Tust.

O ponto básico para o grupo que discute o assunto é que os empreendedores devem pagar algum tipo de "pedágio" para a renovação das concessões. Afinal, se não tivessem que fazer nenhum pagamento ou baixar as tarifas, assegurariam enorme lucro pelas próximas duas décadas sem oferecer compensação, pois acredita-se que as usinas estão hoje completamente amortizadas.

No caso da geração térmica, a questão muda. As termelétricas são como fábricas, não exploram nenhum bem natural, de patrimônio da União, e por isso há autoridades que acreditam não haver nenhum "pedágio" a pagar. Diferentemente das hidrelétricas, com vida útil em torno de 100 anos, a maioria das usinas térmicas dura em torno de 30 anos.

Para as distribuidoras, o pano de fundo é diferente. Os investimentos são contínuos e ocorrem ao longo de toda a concessão, não apenas no início dela, com as obras civis e instalação de turbinas, como no caso das usinas. Há 41 empresas de distribuição que, pela legislação vigente, precisam devolver à União a concessão entre 2014 e 2016.

O governo cogita aproveitar a oportunidade para reorganizar o segmento, que hoje possui 64 empresas espalhadas pelo país. Na região Sul e em algumas localidades do Sudeste, como no interior de São Paulo, houve proliferação de pequenas distribuidoras com pouquíssima escala e baixa eficiência econômica, avaliam as autoridades. A concessão de quase todas vence em 2015. Dependendo de como forem definidas as regras de renovação, pode-se estimular um movimento de forte consolidação.

No caso de prorrogação das concessões, pode-se determinar redução tarifária às empresas ou metas mais rígidas envolvendo o número e a duração das quedas de eletricidade. No caso de levar as distribuidoras a leilão, surge um problema: os investimentos não estão amortizados e o RGR, fundo criado pelo governo para indenizar os bens não-depreciados dos concessionários, não dispõe dos recursos necessários para isso. A preferência dos técnicos, no entanto, é manter as principais distribuidoras com os concessionários atuais. As conclusões do grupo serão encaminhadas, com várias alternativas de decisão, ao ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.