Título: Disputa pelas mesas do Congresso ameaça base governista
Autor: Lyra, Paulo de Tarso; Costa, Raymundo
Fonte: Valor Econômico, 30/09/2008, Política, p. A10

A disputa pelo comando do Congresso na sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em fevereiro de 2009, começa a criar problemas para o governo. Na Câmara, existe um acordo firmado entre o PT e o PMDB para a eleição de um pemedebista - provavelmente Michel Temer - em substituição ao petista Arlindo Chinaglia. No Senado, contudo, o PMDB avisou o governo que, na condição de bancada majoritária, não abrirá mão de indicar o futuro presidente. Leo Pinheiro/Valor - 26/2/2007

Michel Temer (PMDB-SP): deputado pemedebista tem apoio do PT para voltar a presidir Câmara dos Deputados

Se prevalecer a opinião dos senadores do PMDB, o partido comandará a Câmara e o Senado. O Planalto, no entanto, não aceita a hegemonia pemedebista. O melhor, para o governo, seria o PMDB presidir a Câmara e o PT suceder Garibaldi Alves (PMDB-RN) no Senado. Principal aliado do Planalto, o PMDB preocupa o governo por se tratar da maior bancada do Senado e ter forte poder de articulação, inclusive com a oposição.

É da tradição do Congresso a maior bancada presidir a respectiva Casa. Mas, em 2007, num acordo com o PT, o PMDB da Câmara apoiou o nome de Chinaglia em troca de compensações no governo e da contrapartida petista em 2009. À época, o PT do Senado tentou firmar um acordo parecido com o então presidente Renan Calheiros, mas foi rechaçado com o argumento de que as realidades das duas Casas eram inteiramente diferentes. Enquanto a bancada do PMDB era ligeiramente superior à do PT na Câmara, no Senado os petistas são em número bem menor. Algo como pouco mais que a metade do PMDB.

Como de outras vezes, a bancada apresenta o nome de José Sarney. O ex-presidente da República insiste que, nessa fase da vida, não existem razões para entrar em disputa. Na realidade, o PMDB se fixa no nome de Sarney para demarcar território e sinalizar para os outros partidos que a cadeira é sua. Enquanto isso, os nomes mais viáveis costuram apoios nas bancadas - exatamente como fez Garibaldi Alves quando Renan teve de renunciar ao cargo para se defender de processos por quebra de decoro.

Na ocasião, a candidatura Sarney foi contestada pelo líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM). Hoje, provavelmente, essa pressão seria menor. Oposicionistas que à época se calaram afirmam que o veto de Virgílio é pessoal e, no atual momento, não teria mais força. Reclamam que, ao aquiescer com a pressão do tucano, abriram caminho para a vitória de Garibaldi, nome que desagrada tanto a oposição quanto a base.

Um dos nomes cogitados é o do atual ministro das Comunicações, Hélio Costa (PMDB-MG), senador licenciado, que teria de reassumir a cadeira. Sondado por uma ala do PMDB, Costa demonstrou interesse. Costa tem problemas de aceitação na própria bancada e entre os demais colegas. "Isso aqui é um clube e o Costa passa uma imagem de arrogância, não tem bom trânsito entre os senadores", diz um parlamentar.

Mesmo assim, o ministro já teve mais problemas com as bancadas do Senado. O seu problema maior hoje é o governo, que considera fundamental um equilíbrio entre os poderes. Nesse caso, isso significa o PMDB na Presidência da Câmara e o PT na do Senado e no Planalto. Era assim também no governo Fernando Henrique Cardoso, até que Aécio Neves - um tucano - se elegeu presidente da Câmara, um lugar que deveria ser do então PFL pela regra da proporcionalidade. Foi o início do fim da aliança que elegeu e reelegeu FHC.

O nome considerado natural no PT é o do senador Tião Viana (AC). Ele está em plena campanha: liga para senadores, faz a ponte de colegas com o Palácio do Planalto, está sempre disponível. Mas setores da oposição consideram Tião "subserviente" em demasia do Planalto. Senadores do DEM e do PSDB ainda não têm posição formada e devem se reunir após as eleições de outubro para discutir o assunto. Não descartam, nem mesmo, a possibilidade de lançar um nome avulso, como forma de marcar posição. Mas reconhecem que, historicamente, a maior bancada - no caso, o PMDB - tem direito a indicar um nome.

A indefinição no Senado começa a provocar ecos na Câmara. Embora Chinaglia - o fiador do acordo de 2006 - asseguro que o compromisso está valendo, o PT efetivamente passou a condicionar o apoio a Michel Temer à eleição de um dos seus no Senado. A posição petista rachou o PMDB. Os deputados da legenda concordam em entregar o Senado ao PT, se esse for o preço pelo comando da Câmara. Só que ainda não combinaram com os senadores pemedebistas. Mas pelo menos um senador disse ao Valor que a bancada pode abrir mão do cargo se for bem recompensada na Esplanada dos Ministérios.

Um ministro próximo do presidente lembra que nenhum partido do Congresso, no cenário atual, tem força para vencer uma disputa isoladamente. "Se PMDB e PT acham que, sozinhos, têm capacidade para elegerem o presidente da Casa, esqueçam. A matemática não é tão simples assim". Outro auxiliar do presidente coloca mais um agravante no quadro: toda essa negociação acontecerá com um Congresso fragmentado após as eleições municipais.

Tão logo se encerre a disputa de outubro, o Congresso retomará seus trabalhos com uma legião de ressentidos dispostos a cobrar pela fatura de terem sido rejeitados pelas urnas. Isso sempre acontece após as eleições, mas desta vez terá o agravante de a base aliada ser composta por um singular espectro de 14 partidos políticos. "Nesse quadro, o que há de mais comum é o voto por vingança, que poderá trazer ainda mais problemas para nós", avalia um governista.

Um último elemento explosivo deve permear as negociações: a mesa será a mesma na sucessão de Lula e seus integrantes terão papel importante nas articulações para a eleição de 2010. São as mesas da Câmara e do Senado que pautarão os projetos dos dois últimos anos do mandato de Lula e as regras da eleição.

Ao contrário de 2006, alguns dos protagonistas da disputa presidencial estarão no Congresso. Na eleição da atual direção da Câmara, presidenciáveis tiveram papel de destaque nas articulações, caso do governador de São Paulo, José Serra, e do deputado e ex-ministro Ciro Gomes (PSB-CE). Os tucanos avalizaram o nome do PT. Enquanto Ciro comandou o apoio ao comunista Aldo Rebelo (PCdoB-SP), movimento que precipitou a formação do bloquinho (PSB, PCdoB e PDT) em rompimento com o PT. (Colaborou Raquel Ulhôa)