Título: Brasil pode crescer menos de 3% em 2009
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 30/09/2008, Finanças, p. C9

O cenário para a economia brasileira ficará bem mais nublado se o Congresso americano não aprovar algum tipo de socorro ao sistema financeiro do país. Sem o pacote, o crescimento em 2009 poderá ficar abaixo de 3% - hoje, o mercado projeta alta de 3,55% -, o câmbio pode superar R$ 2 e o Banco Central (BC) pode elevar ainda mais os juros. Os analistas, porém, não apostam todas as fichas nesse quadro pessimista, porque há a possibilidade de que um plano de resgate seja aprovado.

Para o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman, economista-chefe do Santander, um cenário sem pacote implica obviamente num câmbio mais desvalorizado, embora seja difícil estimar qual nível pode atingir a moeda americana. "Os preços das commodities podem cair muito, o que pioraria bastante os nossos termos de troca [diferença entre preços de exportações e importações]", diz ele.

Além disso, os fluxos financeiros devem diminuir. Schwartsman acredita que, a prevalecer esse quadro, o impacto da desvalorização do câmbio sobre os preços tende a ser superior ao efeito deflacionário da queda das commodities, o que pode levar o BC a aumentar os juros além do que já se prevê - ele, por exemplo, avalia que a Selic, hoje em 13,75% ao ano, encerrará o ano em 14,75%. "A demanda doméstica terá que sofrer uma desaceleração, e eu não acredito que essa desaceleração virá apenas pelo canal externo." Nesse cenário, em vez de crescer 3,5% em 2009, o PIB pode ter expansão inferior a 3%, diz Schwartsman, ressaltando que, no momento, é muito difícil fazer qualquer previsão.

O ex-presidente do BC Gustavo Loyola, sócio da Tendências Consultoria Integrada, também considera que, caso o pior cenário predomine, o câmbio pode atingir um nível cujo impacto inflacionário não será compensado pela queda dos produtos primários. Com isso, a Selic poderia atingir até 17%, mais do que os 15% que constam do cenário-base da Tendências. Como resultado, um PIB magro, com crescimento de 2,6% a 2,7% em 2009. "Para este ano, porém, a expansão ainda deve superar 5%."

Dirceu Bezerra Jr., fundador da Rosenberg & Associados, acredita que um crescimento inferior a 3% é cada vez mais provável, mesmo num quadro em o Congresso americano decida por algum tipo de ajuda. Segundo ele, quanto mais demora houver para aprovação do socorro, mais o sistema financeiro vai sofrer, levando a uma brutal contração de crédito e a um crescimento muito fraco da economia. Nesse ambiente, o Brasil vai exportar menos e receber menos recursos financeiros. O câmbio ficará mais desvalorizado, mas Bezerra acha que não é necessário elevar mais os juros. "A desaceleração da economia brasileira já será forte."

"No pior cenário, não tem como o Brasil ficar imune. Vamos ser tragados pelo pânico", avalia o economista e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Fernando Cardim. Ele diz acreditar, no entanto, que o governo americano ainda deve conseguir aprovar o pacote, com modificações, até o fim da semana.

Cardim não arrisca previsões para o Brasil caso a pior perspectiva se confirme. Segundo ele, o contágio viria de várias formas: as empresas ficariam mais receosas para investir com a contração do crédito, uma forte alta do dólar provocaria pressão sobre a inflação, o BC subiria os juros, e o comércio mundial entraria em colapso, prejudicando as exportações. Caso o governo americano consiga convencer o Congresso, Cardim aposta em crescimento entre 3,5% e 4% em 2009. "Se não houver pânico, o Brasil não vai sofrer muito".

O ex-ministro da Economia Marcilio Marques Moreira diz que o Brasil deve estar preparado para "uma retração significativa" da atividade econômica. Para ele, um crescimento de 3% em 2009 é "otimista". "Não acho que vamos cair em uma crise bancária e nem em recessão. Mas temos que estar preparados para uma retração significativa", disse o ex-ministro, complementando que "não fazê-lo seria uma imprevidência".

O ex-diretor do Banco Central, Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), também diz que o Brasil não passará impune por esta crise mundial do crédito. Para ele, os juros à pessoa física já começaram a subir no país e, em geral, o crédito vai ficar mais caro para todo mundo. A seu ver, isso pode levar o BC a dar uma trégua na alta da Selic. "Já existe uma expectativa no mercado de que a economia brasileira vai esfriar". (Colaboraram Raquel Landim, Chico Santos e Vera Saavedra Durão)