Título: Terremoto arrasa Haiti
Autor: Craveiro, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 13/01/2010, Mundo, p. 14

Tremor de 7 graus devasta Porto Príncipe, derruba palácio e prédios e pode ter matado centenas. Lula se diz preocupado com brasileiros

O país mais pobre das Américas e com uma das maiores densidades demográficas do planeta viveu na noite de ontem (hora de Brasília) uma catástrofe sem precedentes. Um terremoto de magnitude 7 graus na escala Richter (a escala é aberta, mas raramente ultrapassa 9) sacudiu o Haiti às 16h53 de ontem (19h53 em Brasília). Seu epicentro foi localizado a apenas 15km a sudoeste da capital, Porto Príncipe. Menos de sete minutos depois, outro abalo de magnitude 5,9 levou ainda mais caos e desespero à população de 8,5 milhões de habitantes.

O terror continuou às 17h12 (20h12 em Brasília), com uma forte réplica de 5,5. A quase total ausência de comunicação com o país praticamente isolou o Haiti o mundo. O tremor foi tão forte que se fez sentir em Cuba e na República Dominicana. Um alerta de tsunami foi lançado e suspenso três horas depois.

Os relatos iniciais davam conta de uma tragédia sem precedentes no país. A agência de notícias France-Presse, citando testemunhas, mencionou ¿centenas de mortos¿. O terremoto derrubou o Palácio Nacional e vários prédios e casas, em Porto Príncipe. O presidente do Haiti, René Preval, e a primeira-dama, Elisabeth Debrosse Delatour, não sofreram ferimentos. Segundo um jornalista da TV Haitipal, os prédios dos ministérios das Finanças, do Trabalho, das Comunicação e da Cultura, do Palácio de Justiça, da Escola Normal Superior, do Parlamento e da Catedral de Porto Príncipe também já não existem. A sede da Organização das Nações Unidas (ONU) está destruída. As agências de notícias confirmaram que o centro de Porto Príncipe foi devastado.

Durante horas, o Comando do Exército brasileiro tentou, sem sucesso, obter contato com a Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (Minustah), liderada pelo Brasil ¿ 1.266 soldados brasileiros integram a força de paz. Informado sobre o terremoto, o chanceler Celso Amorim entrou em contato com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para informá-lo sobre a situação dos brasileiros. Lula se mostrou ¿preocupado¿, mas não passou orientações a Amorim. O encarregado de negócios em Porto Príncipe disse ao ministro que a embaixada sofreu sérios danos. Até o início da madrugada, não havia notícia de vítimas brasileiras. O Itamaraty montou uma sala de crise para acompanhar a situação e prestar informações, pelos telefones (61) 3411-8803/8805/8808/9718 e 8197-2284.

Horror De acordo com a rede de TV CNN, uma autoridade do governo norte-americano viu várias casas despencando em uma ravina. Um correspondente da agência de notícias France-Presse contou que, em Pétionville (subúrbio de Porto Príncipe), um prédio de três andares que abrigava um hospital desabou sobre várias vítimas, enquanto centenas de pessoas corriam pelas ruas, aos gritos. O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, declarou acompanhar a situação e se disse pronto a ajudar o povo haitiano. ¿Meus pensamentos e orações estão com os que foram afetados por este terremoto¿, afirmou. A República Dominicana convocou ¿todo o mundo¿ a auxiliar o Haiti. A comunidade internacional já começa a se mobilizar.

Em entrevista ao Correio, por telefone, o sismólogo norte-americano Daniel McNamara ¿ da US Geological Survey (USGS) ¿ disse esperar um número bastante elevado de mortes e destacou o ineditismo do fenômeno. ¿Não tem havido um terremoto dessa magnitude na região por pelo menos 200 anos¿, afirmou. ¿Acredito que tenha havido muita destruição e mortes, em razão das construções serem vulneráveis. Foi um terremoto bem raso, capaz de ser bastante destrutivo em Porto Príncipe. A infraestrutura dos prédios é precária, com muito concreto e sem reforço¿, afirmou o especialista, que esteve uma vez na capital haitiana.

Por telefone, de Washington, Kate Conradt, porta-voz da organização não governamental Save The Children, contou à reportagem que sua equipe em Porto Príncipe relatou ter testemunhado muitas casas destruídas e que as pessoas estavam desesperadas. ¿Nosso escritório foi danificado, mas nosso pessoal está a salvo.¿

Meus pensamentos e orações estão com os que foram afetados por este terremoto¿

Barack Obama, presidente dos Estados Unidos

Tudo começou a tremer e as pessoas começaram a gritar, casas e prédios caíram¿ Está tudo um caos¿

Joseph Guyler Delia, morador de Porto Príncipe

Não tem havido um terremoto dessa magnitude na região por pelo menos 200 anos¿

Daniel McNamara, sismólogo do US Geological Survey (USGS)

Colaborou Edson Luiz

Brasileiros na área atingida

Edson Luiz

A região de Carrefour, onde ocorreram os principais tremores, fica a uma distância de 17km em linha reta da sede do quartel brasileiro da Missão de Estabilização das Nações Unidas no Haiti (Minustah), onde estão cerca de 1.260 homens do Comando Militar do Leste ¿ o 11º contingente a chegar ao país, que começaria a retornar a Brasília nesta semana. Segundo oficiais que estiveram trabalhando ainda na primeira fase das operações de pacificação, a localização da base brasileira e da Minustah fica em uma região plana e com construções sólidas, ao contrário de onde ocorreram os epicentros. Em nota, o Ministério da Defesa afirmou que após a catástrofe, o governo brasileiro dará mais apoio à população.

Pelas características das construções da base brasileira, a expectativa é de que haja apenas danos materiais. ¿Nossas edificações estão em áreas planas e são contêineres. Existem poucos prédios de alvenaria¿, explica um oficial da missão do Brasil que esteve em Porto Princípe. A Base General Barcellar, também conhecida como Base Charlie, foi construída há quase dois anos. Ao contrário, a região onde o terremoto foi mais intenso é de favelas, sem nenhum tipo de urbanização e muito habitada. O local fica a 10km da Embaixada dos Estados Unidos e é considerada região metropolitana da capital haitiana.

Até por volta das 22h, o Comando do Exército não tinha notícias sobre os brasileiros. O sistema telefônico entrou em pane e a comunicação estava impossível. Em Porto Princípe estão os 1,3 mil militares brasileiros, que deveriam retornar a suas bases nesta semana, mas o governo mantém a posição de que a presença dos efetivos da MInustah será necessária para ajudar nas operações de resgate, como aconteceu em furacões e enchentes, nos últimos anos.

A falta de informações colocou uma equipe do Comando do Exército de plantão em Brasília, assim como o Ministério da Defesa, que às 23h divulgou nota oficial. ¿O ministro da Defesa, Nelson Jobim, expressou sua solidariedade ao povo do Haiti, atingido por um forte terremoto na noite desta terça-feira, e exortou os militares brasileiros presentes naquele país a fazerem todo o esforço possível para minorar o sofrimento da população local¿, diz o texto.

O ministro, segundo sua assessoria, foi comunicado sobre o terremoto pelo comandante do Exército, general Enzo Peri, que falou sobre a ocorrência de danos materiais em algumas instalações usadas por brasileiros. ¿Somente nesta quarta-feira (hoje) haverá condições de se fazer um balanço desses danos¿, informa a nota. De acordo com a assessoria, o ministro reconheceu que o espírito de colaboração já faz parte do cotidiano das tropas brasileiras que integram a Minustah.