Título: Alta do dólar facilita liquidação de empréstimos obtidos com a matriz
Autor: Watanabe, Marta
Fonte: Valor Econômico, 01/10/2008, Brasil, p. A2

Os consultores estão recomendando às subsidiárias brasileiras de grupos internacionais aproveitar a alta do dólar para liquidar os empréstimos estrangeiros intercompanhias. Os recursos podem ser repatriados ao país de origem ou capitalizados na empresa brasileira, conforme o contrato. A idéia principal de aproveitar a valorização da moeda americana para efetivar essas operações é evitar ou reduzir a tributação de 34% de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre o ganho cambial na liquidação de empréstimos tomados em períodos em que o dólar estava mais valorizado.

Não há registro sobre o estoque de recursos originados de empréstimos estrangeiros intercompanhias ao Brasil, mas desde 2006 o fluxo líquido dessas operações aumentou significativamente. Em 2006, a diferença entre as entradas e saídas desses recursos totalizou US$ 3,45 bilhões. No ano passado, o saldo líquido saltou para US$ 8,51 bilhões. Em 2008 a tendência foi mantida até agosto, quando o valor chegou US$ 6,9 bilhões. O movimento dos recursos reverteu a tendência anterior, quando os ingressos de recursos por empréstimos intercompanhias praticamente empatavam com a saída de valores para amortização dessas dívidas. Em 2005, o saldo líquido foi de apenas US$ 20 milhões enquanto que em 2004 esse resultado foi negativo em US$ 430 milhões.

"Muitas companhias estão agora com recursos que chegaram em 2005 e 2006. Esses contratos venceram, mas as companhias postergaram a liquidação das operações em razão da baixa cotação do dólar desde o ano passado", explica o tributarista Paulo Vaz, do escritório Levy & Salomão. A repatriação com dólar em valor menor que o da época em que os recursos chegaram dá dois efeitos indesejáveis: prejuízo na operação para a empresa estrangeira que emprestou e pagamento de 34% de IR e CSLL sobre o ganho cambial para a empresa brasileira.

"O prejuízo não é desejável para a empresa estrangeira e não pode ser compensado pela empresa brasileira para fins tributários. Enquanto isso o imposto pago aqui não serve de crédito para a companhia lá fora", explica Vaz. "Essa é uma ótima oportunidade para liquidar essas operações para eliminar ou amenizar o ganho cambial", diz ele. "Para quem recebeu esses recursos com dólar a R$ 2,00 e tivesse liquidado a operação com a moeda a R$ 1,50, por exemplo, o ganho cambial corresponderia a 25% do valor envolvido", contabiliza ele. Com um dólar se aproximando de R$ 2,00 novamente, diz, a diferença cai para praticamente zero.

O advogado Waine Domingos Perón, do Braga & Marafon, conta que algumas empresas planejam antecipar a liquidação dos empréstimos para aproveitar o momento com câmbio mais favorável para a operação. Ele alerta para a necessidade de verificar se há a possibilidade de antecipar a liquidação de acordo com o contrato do empréstimo. "Mas como se trata de mútuo entre companhias do mesmo grupo, essas cláusulas costumam ser mais flexíveis", diz Perón. É exatamente essa flexibilidade nesse tipo de contrato, diz Vaz, que permitiu às empresas brasileiras postergar a liquidação num período em que a operação era desfavorável para as duas pontas.

O advogado Phillipe Schneider, do escritório Souza, Schneider e Pugliese, lembra que a decisão também depende do interesse da companhia estrangeira que emprestou os recursos. "É bem possível que neste momento ela prefira a repatriação dos valores", acredita ele. Mas o advogado lembra que uma outra forma de liquidar o empréstimo é fazendo a capitalização dos valores. Para fins de pagamento de IR e CSLL a conversão dos valores em capital é uma das formas de liquidar a operação. Da mesma forma que o pagamento do empréstimo, a capitalização com eventual ganho cambial dá origem a um valor sujeito aos dois tributos.

Nos últimos anos tornou-se comum o envio de recursos às empresas brasileiras como empréstimo intercompanhia para posterior conversão em participação no capital. Essa opção tem se tornado mais atraente do que o investimento direto da estrangeira em participação na brasileira. Com o empréstimo, explicam os tributaristas, a estrangeira tem um retorno mais garantido em função dos juros pagos, o que não é tão simples no caso de capital . Além disso, o empréstimo oferece uma flexibilidade maior na movimentação dos recursos. A repatriação com a manutenção dos valores investidos em moeda estrangeira é mais garantido. No caso do investimento em capital, esse retorno nem sempre acontece no caso de uma valorização do dólar.

Paulo Vaz lembra que a recomendação para liquidação dos empréstimos é direcionada para as empresas que pagam IR pelo lucro real, com aplicação de regime de caixa para essas operações. Há algum tempo seria necessário verificar também os efeitos da operação para o PIS e a Cofins, mas as empresas do lucro real pagam essas duas contribuições pela fórmula não-cumulativa, com alíquota zero dois dois tributos para as receitas cambiais. "As repercussões atualmente, portanto, estão concentradas no IR e na CSLL."