Título: Espaço aos jovens não vinga
Autor: Couto, Rodrigo
Fonte: Correio Braziliense, 20/02/2010, Brasil, p. 12

Das 800 mil vagas para aprendizes na faixa etária entre 14 e 24 anos que Lula prometeu criar até o fim do ano, só 155 mil saíram do papel

Lucas (E), Ysac, Evando e Keicy, integrantes do projeto Aprendiz Legal, comemoram o primeiro emprego

A ambiciosa meta do governo Lula de empregar 800 mil jovens aprendizes até o fim do mandato não será cumprida. A constatação pode ser facilmente percebida pelo atual número de trabalhadores inseridos formalmente no mercado formal. Segundo dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), existem hoje 155.864 pessoas na faixa etária dos 14 aos 24 anos prestando serviços em troca de meio salário-mínimo no país (veja quadro). Além de não concretizar a promessa este ano, a gestão petista ainda assumiu outro compromisso em setembro de 2009: contratar 1,2 milhão de aprendizes até 2015. Uma das explicações para a baixa adesão, de acordo com a organização não governamental Atletas pela Cidadania, é a falta de divulgação e fiscalização do projeto.

Na tentativa de acelerar o processo de contratação dos jovens, o presidente da ONG e campeão mundial de futebol Raí de Oliveira entregou uma minuta do projeto de lei ao ministro do Trabalho, Carlos Lupi, e ao presidente Lula em 24 de novembro de 2008, data em que o petista se comprometeu com a meta de 800 mil aprendizes no país. ¿O projeto está há mais um ano na Casa Civil aguardando o encaminhamento para a votação na Câmara. Se for aprovado, serão geradas 400 mil vagas, já que os municípios, os estados e o governo federal serão obrigados a contratar jovens aprendizes¿, explica Raí.

Ousadia

Na avaliação do secretário-executivo do MTE, André Figueiredo, a inserção dos 800 mil jovens no mercado de trabalho depende de todos. ¿Temos uma meta ousada que é inserir 800 mil aprendizes de 14 a 24 anos e pessoas com deficiência de qualquer idade no mercado até 2010. Para isso, precisamos da parceria de todos. A aprendizagem é um bônus, não um ônus. Ela forma uma mão de obra apaixonada por essa primeira oportunidade de trabalho. É um programa grandioso¿, diz.

Composta por 40 esportistas, a ONG Atletas pela Cidadania acompanha e cobra há três anos as ações governo para o cumprimento da Lei da Aprendizagem (nº 10.097/2000), regulamentada pelo Decreto nº 5.598/2005. Pela legislação, todas as empresas de médio e grande porte devem ser obrigadas a contratar adolescentes e jovens entre 14 e 24 anos. As relações são formalizadas por um contrato especial de trabalho por tempo determinado, de no máximo dois anos.

Faz falta divulgar

Para a coordenadora da Atletas pela Cidadania Fabiana Kuriki, mais importante do que a contratação de 644.136 jovens para atingir a meta de 800 mil aprendizes até o fim do ano é o cumprimento da Lei nº 10.097. ¿A obediência da legislação poderia empregar mais de 1 milhão de pessoas¿, estima. Em sua opinião, a legislação não é seguida porque ganhou visibilidade somente nos últimos 2 anos. ¿Falta divulgação da lei, em massa, para que os jovens conheçam a possibilidade de crescimento. As empresas, por sua vez, precisam entender que é uma lei a ser cumprida. Além disso, há algumas dificuldades não resolvidas em relação à fiscalização¿, destaca.

Segundo Fabiana Kuriki, a posição do governo é controversa. ¿O projeto que entregamos não se trata somente de aumento de contratações, mas também de permitir que a administração pública contrate. Se estamos cobrando das empresas que cumpram uma lei que vai beneficiar os jovens e o desenvolvimento do país em médio e longo prazo, o governo deve fazer o seu papel¿, afirma.

Alheios à polêmica dos cumprimentos da meta e da lei, alguns jovens participantes do projeto Aprendiz Legal, do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), um dos maiores do país, comemoram o primeiro emprego e revelam que não tiveram dificuldade de conquistar o tão sonhado espaço. Morador de Santa Maria, região administrativa próxima a Brasília, Lucas Costa, 15 anos, não vê a hora de começar a trabalhar.

¿Ainda estou fazendo o curso de capacitação, que é bom, pois aprendi que tenho de ter mais responsabilidade. Quando começar o serviço, quero ajudar em casa¿, informa o futuro advogado. Estudante do 2º ano do ensino médio, Keicy Pereira, 17, já colhe frutos. ¿Começo a trabalhar em março numa lanchonete, mas já sei que devo ser paciente e respeitar os outros¿, acrescenta a moradora de Samambaia Norte.

Ysac Matheus, 18 anos, morador do Gama, que vai trabalhar no Hospital das Forças Armadas (HFA), salienta que o governo precisa acreditar nos jovens. ¿Faltam políticas para a gente¿, opina. Já para Evando Silva, 15, o importante da experiência é fazer novas amizades e aprender como funciona o mercado de trabalho. (RC)