Título: Governos aplicam US$ 600 bi em bancos
Autor: Silva Júnior, Altamiro; Travaglini, Fernando
Fonte: Valor Econômico, 01/10/2008, Finanças, p. C5

O agravamento da crise de crédito vem provocando uma onda de falências de instituições financeiras pelo mundo como há décadas não se via. Com pacotes de ajuda bilionários dos governos e estatizações, várias delas foram salvas. Desde o início da crise em agosto do ano passado até ontem, 34 instituições tiveram que ser socorridas às pressas, seja pelo Estado (a maioria), seja por meio de aquisições de outros bancos privados. Marisa Cauduro / Valor

Rafael Rivas, da consultoria Everis: "É curioso que um governo ultra-liberal como o de Bush acabe estatizando"

Estimativas preliminares indicam que governos de países como Estados Unidos, Inglaterra, Alemanha e Bélgica, colocaram em torno de US$ 600 bilhões para capitalizar bancos, seguradoras e empresas especializadas em hipotecas. O caso mais recente foi ontem, quando o banco franco-belga Dexia recebeu socorro de US$ 9 bilhões de três países (Bélgica, França e Luxemburgo).

Na avaliação do espanhol Rafael Garrido Rivas, da consultoria Everis, com sede em Madrid, não havia outra solução para os bancos que não a intervenção do governo. "É curioso que um governo ultra-liberal como o de Bush acabe estatizando (bancos e seguradoras). Mas grandes problemas exigem grandes soluções."

O executivo avalia que por conta da globalização, outras partes do mundo vão ser contaminadas. Ou seja, pode-se esperar mais problemas em instituições financeiras pelo mundo. Ontem, por exemplo, houve uma corrida bancária na Índia, com os correntistas tentando sacar os recursos do Icici. "A globalização está aí para o bem ou para o mal. Neste caso, para o mal". No caso do Brasil, ele avalia que o país apresenta bons fundamentos, mas por conta de uma eventual recessão no ano que vem nos países desenvolvidos, pode crescer menos.

Para Marcio Cypriano, presidente do Bradesco, a crise ainda demandará certo tempo para se encerrar. Segundo ele, o país está mais sólido para suportar as crises e as condições brasileiras são fortalecidas, mas ninguém vai passar incólume por esse processo. "A crise ainda parece estar longe de se encerrar e aparentemente atingiu o ápice ontem (segunda-feira), mas estamos otimistas com relação as perspectivas para o Brasil."

Octavio de Barros, diretor de pesquisas e estudos econômicos do Bradesco, avalia que esta é uma crise bancária essencialmente americana e de poucos bancos não-americanos, mas o aperto de crédito é totalmente global e uma inédita intervenção coordenada e massiva dos Bancos Centrais tornou-se crucial na solução dos problemas. A expectativa agora é que, com a aprovação do pacote de socorro aos bancos, esperada para esta quarta-feira, o mercado comece a apresentar uma melhora. "A roda deve voltar a girar, uma vez aprovado o plano do Tesouro dos EUA, e quando a roda voltar a girar, os ativos voltarão a ter preços, inclusive imóveis."

Segundo ele, até agora as perdas registradas pelos bancos mundiais com a crise de crédito atingiu US$ 557,3 bilhões, com a maior parte, US$ 298 bilhões, nas instituições americanas, US$ 234,5 bilhões na Europa e outros US$ 24,1 bilhões na Ásia. O volume de recursos de recomposição de capital, no entanto, ainda é inferior, US$ 389,5 bilhões, sendo US$ 204 bilhões nas instituições americanas, indicando que ainda falta um ajuste. No fim da crise, o valor total poderia chegar a US$ 1,3 trilhão.

Passada a crise, o importante é destacar, disse Barros, as lições que já são tiradas da turbulência dos mercados. Entre elas está uma nova regulação que poderá favorecer "uma reestruturação societária bancária nos Estados Unidos e eventualmente em outros países maduros", além de que bancos de investimento passarão a ser regulados em todo mundo, a exemplo do Brasil, com tendência de se associarem a bancos de depósitos.