Título: Orçamentos estaduais para 2009 ignoram risco de desaceleração
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 02/10/2008, Brasil, p. A3

A instabilidade financeira mundial das últimas semanas gerou uma cautela maior, mas ainda não contaminou as expectativas de elevação de receitas nas propostas estaduais de orçamento para 2009. Dentro de um levantamento que levou em conta dez Estados, pelo menos sete - São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul, Piauí e Bahia - prevêem crescimento de receitas totais maior do que os 13% estimados pela União para o próximo ano. Dentre eles, quatro projetam elevação em torno de 20% (ver quadro ao lado). Entre os governos mais cautelosos, com projeções de crescimento menor que o da União, ficaram Mato Grosso, Espírito Santo e Minas Gerais. Davilym Dourado/valor Francisco Luna, secretário de Planejamento de São Paulo: colchão de 2008 deve compensar resultados de 2009

Estados como São Paulo, Paraná e Rio de Janeiro consideraram prematuro recalcular as premissas de crescimento de PIB e inflação levadas em consideração para as projeções do próximo ano e mantiveram os números com os quais vinham trabalhando nos últimos dois ou três meses. O bom desempenho das contas em 2008 foi crucial para a decisão.

Em 2009, diz o secretário de Economia e Planejamento de São Paulo, Francisco Vidal Luna, a projeção de inflação deve se cumprir. "Talvez o crescimento do PIB fique um pouco abaixo do crescimento esperado, mas o colchão de 2008, com bom desempenho de receitas, deve compensar os resultados de 2009." São Paulo projeta para o ano que vem orçamento 19,92% maior que a proposta original de 2008.

Luna explica que a previsão de elevação de receitas vem acompanhada, inclusive, de um aumento de investimentos de R$ 12,12 bilhões em 2008 para R$ 18,5 bilhões em 2009. O aumento do orçamento e de investimentos, lembra o secretário, é estimado em função de financiamentos já liberados formalmente, mas cujos recursos chegarão apenas para o orçamento do próximo ano. "Parte dos R$ 6,7 bilhões em financiamentos permitidos pela ampliação de limite do Estado em 2008 entrarão efetivamente no próximo ano", explica. O governo ainda conta com R$ 3,3 bilhões adicionais que virão em investimentos relativos a outorgas de concessões. Entre elas, as obras do Rodoanel e de cinco lotes de rodovias.

No Paraná, o secretário do Planejamento, Nestor Bueno, considera prematuro rever os valores em razão da crise econômica. "Fizemos uma proposta baseada em crescimento estável e com expectativa de boa safra agrícola (30 milhões de toneladas de grãos)." A receita total esperada para 2009 é 19,6% maior que o do ano passado.

No Rio de Janeiro, a situação foi semelhante. "Não dava para incorporar essas mudanças em cima da hora. Não podíamos mudar todas as premissas. Mas a nossa atitude agora é de cautela", afirma Sergio Rui, secretário de Planejamento do Rio. Ele lembra que o trâmite da proposta na Assembléia Legislativa deve durar até meados de dezembro, o que permitirá ter um horizonte mais claro da crise antes da aprovação do projeto do governo.

Mesmo assim, o secretário estadual de Fazenda do Rio, Joaquim Levy, mantém "expectativa robusta" quanto ao orçamento do ano que vem, com projeção de crescimento de 17% na comparação com 2008.

O Rio Grande do Sul foi um dos pouco Estados que chegaram a mudar a projeção de crescimento de PIB em função da crise. As primeiras avaliações do governo gaúcho, porém, indicam impacto relativamente modesto. A estimativa preliminar é de que a arrecadação bruta do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sofrerá uma redução de aproximadamente R$ 250 milhões em relação aos R$ 15,8 bilhões projetados no orçamento para o ano que vem.

Segundo o secretário da Fazenda, Aod Cunha de Moraes Júnior, a revisão leva em conta uma expectativa de queda na taxa de crescimento do PIB estadual em 2009 dos 5,1% projetados inicialmente para a média de 3,5%. "A crise é séria, pode haver maior retração das exportações e do crédito, mas não é o fim do mundo", avalia. Mesmo com a redução para o PIB, a proposta orçamentária do governo gaúcho para 2009 prevê receitas totais de R$ 24,6 bilhões. Para 2008 foram orçados R$ 20,4 bilhões, o que significa 20% de elevação do orçamento inicial. As receitas deste ano, porém, devem alcançar R$ 23,4 bilhões graças ao bom desempenho da arrecadação.

Mesmo levando em conta a crise, o governo da Bahia pretende aprovar um orçamento para 2009 de R$ 22,3 bilhões, o que significará incremento nominal de 17,8% em relação ao deste ano. Segundo o secretário de Planejamento, Ronald Lobato, essa previsão já embute um cenário bastante conservador em termos de crescimento da economia brasileira e baiana. Segundo ele, o grande crescimento do orçamento será possível por conta do aumento da captação de recursos, especialmente os que chegam através de convênios com o governo federal. "Estamos tocando muitos projetos com investimentos do PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) e isso não vai ser interrompido", garante.

No Piauí, o poder público trabalha com mais otimismo. Baseados numa projeção de crescimento do PIB de 6% e inflação de 4,5%, o Estado apresentou proposta de orçamento de R$ 5,37 bilhões para 2009, o que representa um crescimento de 16,6% em relação a este ano. Em 2008, o incremento foi maior, de 22,39%. "O cenário mudou um pouco recentemente. Pode haver alterações no processo de votação na Assembléia Legislativa, mas acredito que o orçamento não vai variar muito", afirma Manoel Lopes, diretor de Planejamento Estratégico da Secretaria de Planejamento do Piauí.

Minas Gerais fez uma projeção de crescimento mais modesta de orçamento, de 9,5%. O governo não pretende rever o orçamento para 2009 em função da crise financeira internacional. "Fizemos uma projeção bastante conservadora para as receitas", disse Bernardo Tavares de Almeida, secretário-adjunto estadual do Planejamento e Gestão. Na proposta orçamentária, os técnicos do governo levaram em conta os mesmos parâmetros macroeconômicos usados pela União. O governo mineiro espera que o total das receitas fiscais alcancem R$ 38,9 bilhões no próximo ano. Como o PIB de Minas Gerais vem crescendo acima da média do país desde 2004, muito em decorrência do ciclo expansivo dos bens primários, nossas previsões foram conservadoras, explicou Bernardo Tavares. Além disso, segundo ele, os ganhos de receita deste ano considerados circunstanciais foram expurgados nas estimativas orçamentárias.

Mato Grosso também optou por uma proposta mais conservadora, conforme o superintendente de Políticas Públicas da Secretaria de Planejamento e Coordenação Geral, Nilson Antonio Batista. O orçamento proposto pelo Mato Grosso é de R$ 7,747 bilhões, com crescimento nominal de 12,4% em relação a 2008, quando o incremento havia sido bem maior, de 32,67%. Do total, R$ 6,621 bilhões são provenientes de recursos do Tesouro Estadual e R$ 1,125 bilhão, de recursos de outras fontes.

Entre os mais pessimistas, com projeção de elevação de apenas 3,7% no orçamento, o governo do Espírito Santo anunciou ontem um plano de contingência para se precaver contra os reflexos da crise econômica externa sobre as finanças públicas do Estado.

O governo criou um comitê para acompanhar a crise e publica hoje decreto estabelecendo que todas as licitações de obras e de aquisição de equipamentos com valor superior a R$ 5 milhões serão avaliadas por esse comitê. Serviços e aquisições de materiais no valor acima de R$ 1,5 milhão também serão submetidos à análise, bem como concursos públicos. "Optamos por fazer uma reconstrução do orçamento de 2009 e também estamos reavaliando algumas licitações, para ter uma folga e garantir a manutenção do equilíbrio fiscal", afirma o secretário de Estado de Economia e Planejamento, José Eduardo Azevedo. (Colaboraram Marta Watanabe, Cibelle Bouças, Danilo Jorge, Marli Lima, Sérgio Bueno, Raquel Salgado e Rafael Rosas, do Valor Online)