Título: Operadoras mantêm investimentos, mas adotam cautela
Autor: Magalhães, Heloisa, Moreira, Talita
Fonte: Valor Econômico, 02/10/2008, Tecnologia & Telecomunicações, p. B3

Apesar do recrudescimento da crise financeira e da escalada do dólar, algumas das principais operadoras de telefonia do país descartam a possibilidade de segurar investimentos. A turbulência encontrou as teles em boa situação financeira. Mesmo assim, elas estão atentas à alta de custos que poderá decorrer desse processo, tanto nas captações de recursos quanto no preço dos equipamentos. Marisa Cauduro / Valor Gilmar Camurra, vice-presidente de finanças da Telefónica: "Não precisamos de dinheiro, nem temos exposição cambial"

Em um ano de orçamentos elevados no setor - com a expansão das redes de banda larga e a chegada da terceira geração da telefonia móvel (3G) -, as operadoras já estavam com suas estruturas de financiamento equacionadas. Praticamente todas elas também já haviam garantido recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

A TIM anunciou, ontem, que obteve R$ 1,5 bilhão da instituição estatal. São duas linhas separadas. A principal delas terá custo não superior a 9%, afirma um executivo da empresa. O pedido de empréstimo, feito pela companhia no fim do ano passado, foi aprovado há poucos dias. O contrato ainda não foi assinado.

Segundo esse interlocutor, a TIM está atenta aos desdobramentos da crise, mas avalia que a turbulência não deverá ter grande impacto em sua estrutura financeira. "Não muda nada nos nossos investimentos", ressalta. Somente no segundo trimestre, a operadora investiu R$ 1,7 bilhão.

O mesmo vale para os R$ 2 bilhões reservados pelo grupo Telefónica para projetos na Telesp, a unidade de telefonia fixa do grupo. Os recursos estão garantidos e não há captações ou tomadas de empréstimo em banco programados para este ano, diz o vice-presidente de finanças da Telefónica, Gilmar Camurra. "Não estamos precisando de dinheiro nem temos exposição cambial. Como trabalhamos com operações estruturadas, todas foram concluídas no início do ano, fase de maravilhas", afirma.

De acordo com ele, a concessionária tem sobra de recursos. Além da geração de caixa, vieram recursos de um financiamento de R$ 2,1 bilhões concedido pelo BNDES, com liberações realizadas no decorrer do ano.

Já para a Vivo - cujo controle é dividido entre os espanhóis e a Portugal Telecom-, o BNDES concedeu R$ 1,5 bilhão. A operadora programou investimento recorde, de R$ 6,5 bilhões, para 2008. Mas precisou ajustar-se à nova realidade do mercado ao anunciar, anteontem, que optou por um instrumento de curto prazo, com a emissão de R$ 550 milhões em notas promissórias. "As empresas do grupo Telefónica no Brasil estão atingindo um grau de maturidade suficiente para pagar os próprios investimentos ", afirma Camurra.

Isso não significa que o cenário é tranqüilo. Se a cotação do dólar permanecer acima de R$ 1,90, o grupo espanhol terá de renegociar com os fornecedores de equipamentos de rede.

O vice-presidente da Telefónica explica que os contratos com fabricantes costumam ter cláusula que determina a reabertura de negociações quando há variação cambial significativa. A alta acumulada neste ano já é considerada muito grande, mas Camurra observa que é cedo para qualquer mudança. "É preciso que o quadro fique mais estável. Aí sentamos com nossos economistas e consultores para avaliar o cenário. Depois, sentamos para conversar com os fornecedores", diz.

Mesmo assim, o executivo considera favorável o cenário para o grupo, pois a exposição à moeda americana diminuiu nos últimos anos. O orçamento de investimentos atrelado ao dólar costumava representar cerca de 30% do total. Hoje, essa parcela caiu para algo entre 10% e 15%, diz.

O presidente da Oi, Luiz Eduardo Falco, também reconhece que uma alta prolongada nas cotações do dólar pode ter impacto no montante projetado para bancar investimentos. "As teles devem sofrer um impacto mínimo. Mas, de qualquer forma, ao subir o dólar o orçamento é pressionado", afirma.

A Oi, por enquanto, foi a operadora que sentiu mais diretamente o impacto da crise. Algumas semanas atrás, a companhia congelou os planos de emitir bônus no exterior - que ajudariam a levantar os recursos necessários para financiar a compra da Brasil Telecom (BrT). Diante das incertezas, a empresa passou a estudar a possibilidade de pedir empréstimos bancários no Brasil e no exterior.

A operadora montou um cronograma de captações e empréstimos para bancar a aquisição do controle da Brasil Telecom e fazer ofertas aos acionistas minoritários. Precisou rever os planos quando a maior parte do dinheiro havia sido levantada. "Sumiu a liquidez na fase final de captação. A última operação voltou para trás e buscamos alternativas mais de curto prazo. Estamos estudando várias linhas. Havíamos montado uma estratégia de longo prazo, mas (a captação) vai ter de ser de prazo mais curto, de cinco ou seis anos", explica Falco. Mesmo assim, ele reitera que a Oi não tem dificuldades para obter os recursos.

A Oi pretende captar R$ 11 bilhões. O valor é equivalente a 85% dos cerca de R$ 13 bilhões que a empresa estima desembolsar na aquisição, incluindo as ofertas públicas de compra de ações obrigatória e voluntária.

O programa de financiamento foi iniciado no fim do segundo trimestre com a emissão de Cédulas de Crédito Bancário (CCB) no valor de R$ 4,3 bilhões junto ao Banco do Brasil. Em 15 de agosto, a Oi divulgou a conclusão da emissão de R$ 3,6 bilhões em notas promissórias. Para fechar o processo de financiamento, tal qual estimado, a empresa necessitaria ainda de aproximadamente R$ 3 bilhões, que seriam obtidos com os bônus internacionais.

Apesar de ressaltar que não deverá ter problemas para conseguir os recursos, Falco admite que a turbulência pode ter impacto negativo até mesmo para as atividades do setor. "Crise não é boa para ninguém, traz menos liquidez, menos crédito e menos consumo", diz.

Por enquanto, o tom nas operadoras é de cautela, com a percepção de que é necessário esperar a poeira baixar para que se possa fazer uma análise mais acurada do cenário.

Segundo Camurra, da Telefónica, o crescimento vigoroso da economia neste ano garantiu à operadora maior demanda em todas as áreas de serviços. "Sempre tínhamos que criar produtos desenhados por renda e neste ano percebemos que a situação estava mais tranqüila. Conseguimos aumentar o número de clientes de celulares pós-pagos. Sentimos efetivamente aumento da renda da classe mais baixa. Dependendo do que vier a acontecer com o PIB, vamos sentir o impacto. Vamos ter que lutar mais para manter o crescimento projetado", diz.

A expectativa do grupo espanhol é de que a economia brasileira cresça 5,2% neste ano. Entretanto, ainda não há projeções para o próximo ano. "Estamos no olho do furacão e algum impacto haverá nos percentuais inicialmente previstos, e não será para cima", afirma Camurra. "A Telefónica tem a proteção como filosofia e também não estamos vendo uma grande crise iminente. Não há pânico, embora estejamos preocupados."