Título: Corte de gasto no orçamento de 2004 fica 50% acima do anunciado
Autor: Mônica Izaguirre
Fonte: Valor Econômico, 22/02/2005, Brasil, p. A3

O valor final do corte no orçamento federal de 2004 acabou superando os R$ 6 bilhões anunciados em fevereiro daquele ano pelo governo. Terminado o ano, mais de R$ 9 bilhões em dotações autorizadas pela lei orçamentária anual (LOA) não foram utilizados. As dotações previstas na lei para investimentos e custeios não-obrigatórios somaram R$ 73,54 bilhões em 2004, incluindo as modificações aprovadas pelo Congresso ao longo do ano, Porém, os números do Ministério do Planejamento mostram que a parcela empenhada, ou seja, efetivamente reservada e comprometida com pagamentos, ficou em R$ 64,457 bilhões. O momento do efetivo pagamento de despesas previstas na lei orçamentária de determinado ano pode até ocorrer no ano seguinte, na forma de restos a pagar. Já o empenho - etapa anterior e obrigatória ao desembolso do dinheiro para fornecedores e prestadores de serviços do governo - precisa ser feito dentro do mesmo ano. Portanto, o que deixou de ser empenhado representa o real tamanho do corte na versão final do Orçamento de 2004. Em princípio, o corte seria de R$ 6 bilhões. Esse foi o montante contingenciado no primeiro decreto de limitação de empenhos editado pelo governo no ano passado. Anunciado em fevereiro, o decreto reduziu de R$ 66,8 bilhões para R$ 60,8 bilhões o valor máximo que os ministérios poderiam comprometer com custeios não-obrigatórios e investimentos, incluindo aí aqueles na forma de inversões financeiras (quando o recurso fiscal financia um investimento). Posteriormente, esse limite de empenho foi aumentado, chegando a R$ 64,88 bilhões em sua versão final. Ainda assim, o corte no orçamento acabou ficando maior, porque, com ajustes feitos ao longo do ano, o montante das dotações previstas na lei orçamentária também subiu. Mesmo em termos proporcionais, o corte de despesas discricionárias previstas na lei de 2004 acabou se mostrando superior ao que deveria ser pelo contingenciamento anunciado no início do ano, pois subiu de 8,97% para 12,35%. Proporcionalmente, a tesoura do ajuste fiscal pegou mais os investimentos em 2004. Incluindo inversões financeiras, a versão final modificada da lei autorizou R$ 14,87 bilhões em gastos desta natureza. Mas, desse total, só R$ 10,55 bilhões foram empenhados a tempo, o que representou um corte de 29% sobre as dotações. Em relação aos custeios discricionários, deixaram de ser empenhados 8,21%, pois, para um total de R$ 58,669 bilhões, foram executados apenas R$ 53,9 bilhões sob o ponto de vista do empenho. O fato de o governo ter deixado de comprometer parte do que foi autorizado pelo Congresso na lei orçamentária de 2004 ajudou a obter superávit fiscal não só no ano passado - quando a diferença entre receitas e despesas primárias (exclui aquelas relativas à dívida) foi positiva em R$ 52,38 bilhões ou 2,98% do Produto Interno Bruto (PIB). Como sempre ficam restos a pagar (empenhos não pagos) de um ano para outro, o resultado primário também está sendo afetado em 2005. Se os R$ 9 bilhões que faltaram empenhar fossem executados, os pagamentos do governo federal seriam maiores tanto em 2004 quanto em 2005. Só não é possível saber como se distribuiria esse valor em cada um desses anos. Mesmo em relação ao teto que ele próprio impôs aos ministérios, o governo deixou de executar alguma coisa em 2004. Os números do Ministério do Planejamento mostram que o que foi empenhado para gastos discricionários ficou R$ 423 milhões abaixo do autorizado nos decretos de limitação de empenho. Sob o ponto de vista dos pagamentos efetivamente realizados dentro do ano, o valor executado de despesas não-obrigatórias do Orçamento de 2004 foi ainda menor, pois ficou em R$ 54,95 bilhões. Isso significa que cerca de R$ 9,5 bilhões do que foi empenhado com base na lei ficou para ser pago em 2005. Incluindo os restos a pagar do orçamento de 2003, os pagamentos de despesas discricionárias do executivo federal somaram R$ 62,12 bilhões no ano passado. Independente de a base legal ser o orçamento de 2003 ou o de 2004, o limite total, nesse caso, também era de R$ 64,88 bilhões, igual ao de empenhos. Portanto, mesmo em relação ao limite de pagamentos, houve corte em 2004, no caso, de aproximadamente R$ 2,75 bilhões. O real e final tamanho do corte sobre as dotações de 2004 são mais um sinal de que não será pequeno o contingenciamento sobre as despesas discricionárias do orçamento de 2005, a ser anunciado ainda nesta semana. Outro indicador é o fato de que o montante aprovado pelo Congresso ficou significativamente superior ao proposto pelo governo, ao encaminhar o projeto da lei orçamentária deste ano. Só o atendimento de emendas parlamentares pelas relatorias geral e setoriais elevou as dotações para 2005 em R$ 8,47 bilhões.