Título: Brasil deve ser pouco afetado pela crise, diz professor
Autor: Lamucci, Sergio
Fonte: Valor Econômico, 03/10/2008, Brasil, p. A3

Com um sistema bancário que não entrou na febre dos empréstimos de alto risco e exportações destinadas a diversos mercados, o Brasil não deverá ser muito atingido pela crise financeira internacional, avalia o economista Alex Cukierman, professor da Universidade de Tel Aviv. Para ele, não está claro que os Estados Unidos e a Europa passarão por recessões muito graves. Cukierman acredita que o pacote de socorro financeiro será aprovado também pela Câmara dos Representantes nos EUA, devendo evitar um colapso do sistema financeiro global. Cidadão israelense nascido na França, PhD pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), Cukierman participou ontem do Seminário Internacional de Política Monetária, promovido pelo Ibmec São Paulo. Carol Carquejeiro/Valor Alex Cukierman: pacote americano terá eficácia e os EUA não enfrentarão uma recessão longa, nem profunda

Para o economista, o fato de o sistema bancário do Brasil não ter problemas com hipotecas de alto risco (subprime) é bastante importante. Isso ajuda a evitar que a economia brasileira seja atingida com mais força pela crise internacional.

Outro ponto crucial é que o Brasil tem exportações que vão para diversos mercados, não havendo uma concentração excessiva em determinado país ou bloco econômico, diz Cukierman. "Com isso, o Brasil não deve sofrer muito com recessões nos EUA e na Europa." De janeiro a setembro, 23,6% das exportações brasileiras foram para os EUA e 14,3% para a União Européia. Argentina e China ficaram com 9,1% das vendas externas do país no período.

Com base nesse cenário, Cukierman considera que o Banco Central (BC) brasileiro não deve mudar a orientação da política monetária por causa da crise externa. Para ele, o nível dos juros tem que ser calibrado tendo em vista se o ritmo de crescimento da economia é inflacionário ou não. "A principal coisa que o BC pode fazer é manter a estabilidade de preços."

Cukierman diz que não está claro que os EUA e a Europa passarão por recessões severas nos próximos meses. Ele acredita que o pacote será aprovado e, ainda que seja o ideal, deve evitar o pior. "É um volume muito grande de dinheiro", afirma Cukierman, para quem as medidas tendem a acalmar os mercados por um tempo e devem dar conta de problemas em bancos e outras instituições que passarem por graves dificuldades.

O economista destaca as diferenças entre a crise atual e a grande depressão que se seguiu à crise de 1929. Para ele, o atual problema é extremamente concentrado no mercado imobiliário dos EUA. O restante da economia não estaria muito comprometido. Cukierman nota ainda que, na grande depressão, a taxa de desemprego ficou elevada por vários anos, chegando a superar a casa de 20%. "A crise atual começou há cerca de um ano, e a taxa de desemprego nos EUA está em 6,1%", compara ele.

Cukierman também rechaça a idéia de que os EUA podem passar por uma recessão prolongada, como a vivida pelo Japão nos anos 90. O país asiático enfrentou uma estagnação que durou uma década. "Eles [o Tesouro e o Federal Reserve, o banco central americano] reagiram muito mais rapidamente que os japoneses", ressalta ele.

Com uma visão menos negativa da crise, Cukierman diz acreditar que Nouriel Roubini, professor da Universidade de Nova York, "exagera" em suas previsões pessimistas. Roubini fez fama por ter previsto em 2006 que o estouro da bolha imobiliária teria implicações muito mais graves do que imaginava a maior parte dos economistas. Em artigo publicado na segunda-feira em seu site, o RGE Monitor, Roubini diz que nunca foi tão alto o risco de derretimento total do sistema financeiro. "Ele tem crédito pelas previsões feitas nos últimos anos, mas eu acredito que o pacote de resgate terá um impacto importante", afirma Cukierman.

Para ele, ainda não está claro que os bancos centrais dos EUA ou da Europa devem cortar juros - como Roubini, por exemplo, defende no mesmo artigo. As autoridades monetárias americanas e européias, avalia ele, acompanham de perto a questão, definindo o nível dos juros de acordo com a trajetória esperada para a inflação e para o crescimento. Cukierman ressalta a atuação dos BCs para combater problemas de falta de liquidez, injetando bilhões de dólares e de euros no mercado.

Hoje professor da Universidade de Tel Aviv, Cukierman já atuou como professor visitante em importantes universidades americanas, como Princeton, New York e Carnegie Mellon.