Título: Só exportador vende, e dólar volta a R$ 2
Autor: Lucchesi, Cristiane Perini
Fonte: Valor Econômico, 03/10/2008, Finanças, p. C1

A falta de linhas de crédito à exportação desde o dia 17 tem impedido os exportadores de aproveitar a puxada de taxas e antecipar o fechamento de câmbio como gostariam. Com isso, as empresas ajudam menos do que poderiam a irrigar o mercado de dólares. A moeda fica mais escasso e acaba pressionada em meio à forte crise externa. Ontem, voltou a subir 5,09%, para R$ 2,023, o maior valor desde 21 de agosto de 2007. Desde o início de setembro, a alta acumulada é de 23,7%.

Os dados do Banco Central mostram que o exportador continua a ser o responsável pela venda de dólar no mercado à vista. Os fluxos financeiros estão cada vez mais negativos, com as matrizes dos bancos e empresas estrangeiras precisando de caixa no exterior e ampliando as remessas de lucros e dividendos atraentes obtidos no Brasil. Fundos também têm mandado recursos para fora.

Se for excluída uma entrada financeira forte e pontual no dia 4 último, de US$ 3,661 bilhões, o fluxo cambial de setembro seria ligeiramente negativo até o dia 26, em US$ 320 milhões. O mercado especula que esse dinheiro seja o pagamento do grupo Anglo American pela a compra da participação de 63,3% do empresário Eike Batista e outros acionistas na IronX, empresa que reunia dois projetos que pertenciam à MMX.

Mesmo com a entrada no dia 4 dos US$ 3,661 bilhões, no total de setembro saíram US$ 3,5 bilhões em termos líquidos pelo câmbio financeiro até o dia 26. As remessas líquidas no dia 15, quando a Lehman Brothers pediu concordata e a crise externa se agravou mais, foram de US$ 1,299 bilhão. Neste dia, as saídas foram de US$ 2,1 bilhões.

Os dados do BC confirmam o que dizem bancos e exportadores: a contratação do câmbio financiado (Adiantamento de Contrato de Câmbio) despencou desde o dia 17, dia no qual o Valor noticiou que começaram a faltar linhas de crédito à exportação. Isso apesar da demanda crescente do exportador pelas linhas, que não vinha se verificando em meses anteriores.

No dia 17, o volume de ACCs contratados foi de US$ 163 milhões, uma queda de 41% na comparação com os US$ 278 milhões no dia 18. Depois do dia 17, os volumes diários passaram a oscilar de US$ 140 milhões a US$ 120 milhões. Em agosto, a média diária de ACCs foi de US$ 206 milhões.

Os exportadores aproveitaram o câmbio mais alto e continuaram a contratar câmbio não-financiado em grandes volumes, como mostram os números do BC. Essa contratação de câmbio cresce nos momentos de estresse, quando as cotações do dólar sobem.

No dia 15, data da concordata da Lehman, a contratação de câmbio não-financiado do exportador foi de US$ 738 milhões. Nesse dia, o dólar fechou a R$ 1,868, alta de 2,41%. No dia 26, a contratação de câmbio foi a US$ 711 milhões, quando o dólar foi a R$ 1,8510, alta de 1,59%. Na média diária, a contratação de câmbio não-financiado do exportador foi ao total de US$ 444,45 milhões em setembro até o dia 26, na comparação com os US$ 399,8 milhões de agosto.

Com crédito escasso e caro, os exportadores não têm mais inundado o mercado de dólares de forma a ultrapassar as saídas financeiras. Desde o dia 5, fora raras exceções, o fluxo cambial diário tem se mantido ligeiramente negativo.

Os exportadores costumam vender dólar no mercado futuro quando a cotação sobe. Mas somente as empresas maiores atuam diretamente na BM&F. Geralmente a venda de dólar das companhias envolve crédito por parte dos bancos. Como o aperto de crédito vem crescendo, acaba dificultando essas transações de derivativos.

O desmonte de posições vendidas da Sadia, da Aracruz (que ainda não anunciou suas perdas) e de outras empresas que perderam com a alta das cotações do dólar acaba colocando mais lenha na fogueira das especulações de todos os tipos e justifica que os estrangeiros montem posições compradas em dólar de US$ 6,67 bilhões na BM&F (posição de 1º de outubro), quase recorde - eram de US$ 6,869 bilhões do dia 18.